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Estado de Minas ENTRE LINHAS

O legado de Mitterand e o dilema de Lula para o seu terceiro mandato

Rea��o do mercado ao discurso e � indefini��o sobre o ministro da Fazenda n�o deve ser vista apenas como chantagem ou especula��o


13/11/2022 04:00 - atualizado 13/11/2022 07:50

François Mitterand
Fran�ois Mitterand, ex-presidente da Fran�a (foto: AFP)

Fran�ois-Maurice-Marie Mitterrand (1916-1996) nasceu em Jarnac e estudou direito e letras na Universidade de Paris. Durante a Segunda Guerra Mundial, foi integrante da Resist�ncia Francesa, movimento de oposi��o ao nazismo. Deputado de 1946 a 1958, no ano seguinte elegeu-se senador. Em 1965, como candidato �nico dos partidos de esquerda, obteve 44,8% dos votos no segundo turno das elei��es presidenciais, vencida por Charles de Gaulle. Secret�rio do Partido Socialista desde 1971, disputou novamente a Presid�ncia em 1974 e foi derrotado por Val�ry Giscard d'Estaing. Entretanto, o derrotou nas elei��es de 1981 e se tornou primeiro socialista a chegar � Presid�ncia da Fran�a.

Mitterrand entusiasmou os eleitores oferecendo a possibilidade de rompimento com o capitalismo. Destacou-se por tomar medidas estatizantes e fazer reformas sociais, mas, em consequ�ncia da crise econ�mica mundial, n�o conseguiu reduzir o desemprego e controlar a alta dos pre�os. O mercado reagiu fortemente � sua pol�tica e descobriu-se, ent�o, que o poderoso Estado nacional franc�s j� n�o controlava a economia. Para evitar a fuga de capitais, Mitterand foi obrigado a recuar, combater a infla��o e priorizar a integra��o com a Comunidade Econ�mica Europeia, que daria origem � Uni�o Europeia, sua grande bandeira na pol�tica externa.

Mesmo assim, dois anos depois de sua elei��o, os conservadores venceram as elei��es legislativas, o que obrigou Mitterrand a governar com o gaullista Jacques Chirac como primeiro-ministro. N�o obstante, em 1988, foi eleito para um segundo mandato, marcado pela mudan�a de tr�s primeiros-ministros e pelo crescimento da extrema-direita. Ao fim de dois mandatos � frente do pa�s, crises econ�micas sucessivas, medidas de austeridade, o fracasso dos programas de nacionaliza��o e o alinhamento da Fran�a a uma Europa liberal e de moeda �nica, o eleitorado popular absorveu esses acontecimentos como uma ren�ncia e at� mesmo uma trai��o � popula��o mais necessitada.

Mitterrand fora for�ado a abandonar o programa socialista e se render ao projeto liberal de Helmut Kohl, eleito primeiro-ministro alem�o em 1982. No processo de moderniza��o que promoveu entre 1980 e 1995, os capitalistas, principalmente quem aplicou seu dinheiro em a��es, se deram muito bem, obrigado. O valor m�dio das a��es francesas atingiu em 1995 um n�vel sete vezes mais alto do que em 1980. Enquanto isso, o sal�rio anual do oper�rio franc�s subiu pouco mais de 5% nesse mesmo per�odo. Houve uma quase estagna��o salarial no meio oper�rio nos 15 anos de presid�ncia de Mitterrand.

Acerto de contas


Em contrapartida, o sistema de prote��o social, a educa��o nacional e os transportes geridos pelo setor p�blico franc�s se mantiveram e se modernizaram. Mitterrand conseguiu abolir a pena de morte, nacionalizar cinco grupos industriais e 39 bancos, estabelecer a aposentadoria aos 60 anos, descriminalizar a homossexualidade, promover o fim do monop�lio estatal da radiodifus�o, inaugurar o Mus�e d’Orsay, o Instituto do Mundo �rabe, a pir�mide do Louvre e a pedra fundamental da Biblioteca Nacional da Fran�a, refor�ar a rela��o franco-alem�, consolidar a Comunidade Europeia e criar a Uni�o Europeia com a assinatura do Tratado de Maastricht, em 1992.

V�rias medidas sociais foram ratificadas, tais como a descriminaliza��o oficial da homossexualidade, que p�s fim ao registo de homossexuais e retirou a homossexualidade da lista de perturba��es mentais. O governo tamb�m introduziu a passagem da maioria sexual para 15 anos para todos, abolindo a distin��o, introduzida em 1942 e confirmada em 1945, na idade do consentimento entre rela��es homossexuais e heterossexuais. O estilo de vida homossexual deixou de ser uma cl�usula de cancelamento de um arrendamento residencial.

O legado de Mitterrand � pol�mico. Motiva um acerto de contas entre a esquerda herdeira de Maio de 68, que aposta na sociedade civil, no multiculturalismo e nos mecanismos de mercado ("gauche soci�tale"), e a esquerda estatista ("gauche �tatique"), baseada nas doutrinas da Frente Popular (1936-1937), na interven��o estatal, no jacobinismo centralista e na alian�a entre comunistas e socialistas, defendida e praticada por Mitterrand. Enquanto se digladiava, o mundo mudou e a esquerda se tornou culturalmente minorit�ria. Ao deslocar o debate da quest�o social para a quest�o identit�ria, os intelectuais de esquerda j� n�o conseguem mais mobilizar a sociedade, enquanto os trabalhadores abandonam os sindicatos e buscam ref�gio no populismo de extrema-direita.

A pol�tica norte-americana e nossos vizinhos sul-americanos – Argentina, Chile, Venezuela e Col�mbia – s�o pontos de refer�ncia para as an�lises comparativas com a pol�tica brasileira, mas vale a pena um olhar em dire��o � experi�ncia francesa. O primeiro mandato de Mitterrand serve de par�metro para compreender o tamanho do dilema do presidente Luiz In�cio Lula da Silva nesse terceiro mandato. A rea��o do mercado ao seu discurso de quarta-feira e � indefini��o sobre o futuro ministro da Fazenda n�o pode ser vista apenas como uma chantagem barata dos grandes grupos econ�micos ou mera especula��o de espertalh�es que operam na Bovespa. H� muito mais coisas envolvidas. Uma delas � encontrar um meio-termo entre a agenda econ�mica liberal e o nacional desenvolvimentismo da esquerda, para que o novo governo enfrente o problema das desigualdades, mas n�o jogue a crian�a fora com a �gua da bacia.

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