A ex-presidente Dilma Rousseff foi afastadada n�o pelas pedaladas fiscais, mas por levar a economia ao colapso (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press - 23/9/22)
Logo ap�s a aprova��o do impeachment da presidente Dilma Rousseff pelo Senado, por 61 votos a 20, perguntei ao ent�o senador Lindberg Faria (PT-RJ), hoje deputado federal, aquela pergunta b�sica de rep�rter sobre o “day after” da derrocada petista: “E agora?”. Ele respondeu: “Vamos fazer desse lim�o uma limonada, est�vamos na defensiva, agora j� temos um discurso para as elei��es: ‘foi um golpe’”. A limonada demorou seis anos; nesse �nterim, o presidente Michel Temer p�s a casa em ordem e o presidente Jair Bolsonaro, depois, fez uma bagun�a muito maior, mesmo.
Agora, o presidente Luiz In�cio Lula da Silva toma a limonada. Como narrativa eleitoral, a tese do golpe contra Dilma serviu para a unifica��o da esquerda no primeiro turno; no segundo turno, quando venceu com menos de 1% dos votos, exatamente 0,9%, passou a ser um estorvo para os novos aliados. Depois de eleito, por isso mesmo, chamar o impeachment de Dilma Rousseff de “golpe de Estado” � uma tolice pol�tica, al�m de um desrespeito �s regras do jogo do nosso Estado democr�tico de direito.
Impeachment existe para que o Congresso e o Supremo possam destituir um presidente da Rep�blica por “crime de responsabilidade” e evitar uma trag�dia nacional, como a que se desenhava entre 2015 e 2016, ou um “golpe de Estado” daqueles que a gente j� conhece. � um processo pol�tico, ao qual qualquer o presidente da Rep�blica est� sujeito, segundo a Constitui��o de 1988, pelos mais variados motivos, um deles o crime or�ament�rio, ou seja, as “pedaladas fiscais”. Quem faz a den�ncia � a C�mara; quem julga � o Senado, sob a presid�ncia do Supremo Tribunal federal (STF).
De fato, n�o foi por causa das “pedaladas fiscais” que Dilma Rousseff caiu. Outros presidentes fizeram coisas piores e foram at� o fim do mandato. O impeachment ocorreu porque Dilma levou a economia ao colapso e enfrentava uma oposi��o de massas que “nunca antes” a esquerda conhecera, nem mesmo �s v�speras do golpe militar que destituiu Jo�o Goulart, em 1964. Ela tamb�m deu todos os motivos pol�ticos que seus algozes precisavam.
Entender esse processo � importante para evitar que a crise se repita. Houve irresponsabilidade fiscal, sim; e constitucionalidade no julgamento, tamb�m. Presidido pelo ministro Ricardo Lewandowski, � �poca presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o impeachment poderia ter sido evitado se a presidente Dilma tivesse abandonado a arrog�ncia como fez pol�tica, tivesse um m�nimo de sensibilidade para ouvir as opini�es cr�ticas, corrigisse os rumos equivocados e buscasse restabelecer a coes�o nacional, dilacerada com os desdobramentos das manifesta��es de junho de 2013. Chance teve com a reelei��o, em 2014, por�m imaginou que a sua vit�ria era um endosso ao rumo que tomara.
A narrativa do “golpe de Estado” tamb�m permite a dedu��o de que o governo Dilma continuaria a usar as pedaladas como forma de encobrir as irresponsabilidades fiscais; que os gastos p�blicos seguiriam sem respeito aos limites da aritm�tica; que o eleitoralismo se manteria como l�gica fundamental do governo; e que o aparelhamento da m�quina p�blica conduziria � decad�ncia de grandes empresas estatais. Por isso, gera expectativas negativas sobre o terceiro mandato de Lula.
Chumbo trocado
A prop�sito, entre os petistas, nem a cadelinha Resist�ncia tem d�vida de que Lula deveria ter sido candidato em 2014, em vez de Dilma Rousseff. Mas ela se fez de desentendida e usou a prerrogativa da candidatura � reelei��o como fato consumado na conven��o do PT. Todos os dirigentes petistas sabem disso. Qualquer rep�rter de pol�tica j� ouviu de algum parlamentar petista que Lula se arrependeu de ter escolhido Dilma como sucessora. Outros petistas seriam mais capazes, como Jaques Wagner e Fernando Haddad, por exemplo.
O maior problema de Lula n�o � o chumbo trocado com o ex-presidente Michel Temer, s�o os aliados do ex-presidente que destitu�ram Dilma, sem os quais n�o teria sido eleito. Por exemplo, a ent�o senadora Simone Tebet (MDB-MT), que foi candidata no primeiro turno, apoiou-o no segundo e, agora, � ministra do Planejamento. Ou os senadores Davi Alcolumbre (Uni�o-AP), Eduardo Braga (MDB-AM), Osmar Azis (PSD-AM), Jader Barbalho (MDB-PA) e Renan Calheiros (MDB-AL), que votaram a favor do impeachment. S�o aliados fundamentais para que Lula possa ter uma retaguarda no Senado.
Temer estava quieto no seu canto. Chamado de golpista, reagiu no Twitter com meia d�zia de verdades: “Mesmo tendo vencido as elei��es para cuidar do futuro do Brasil, o presidente Lu�s Inacio Lula da Silva parece insistir em manter os p�s no palanque e os olhos no retrovisor, agora tentando reescrever a hist�ria por meio de narrativas ideol�gicas. Ao contr�rio do que ele disse hoje em evento internacional, o pa�s n�o foi v�tima de golpe algum. Foi na verdade aplicada a pena prevista para quem infringe a Constitui��o. E sobre ele ter dito que destru� as iniciativas petistas em apenas dois anos e meio de governo, � verdade: destru� um PIB negativo de 5% para positivo de 1,8%; infla��o de dois d�gitos para 2,75%; juros de 14,25% para 6,5%; queda do desemprego ao longo do tempo de 13% para 8% gra�as � reforma trabalhista; recupera��o da Petrobras e demais estatais gra�as � Lei das Estatais; destru� a bolsa de valores, que cresceu de 45 mil pontos para 85 mil pontos”.