
A saudade � grande e aumenta a cada dia e, embora possamos nos falar vencendo a dist�ncia e facilitados pelo contato virtual, mesmo assim, a consist�ncia da presen�a de um corpo nos faz falta. Muita falta. E n�o sem motivos, muitos artistas est�o se expressando atrav�s de lives que nos tocam e emocionam fazendo com que nos sintamos menos s�s. Agradecemos.
Tamb�m somos gratos a poetas, que n�o se esqueceram de escrever lindos versos. Os psicanalistas trabalhando bastante e chegando at� n�s com contribui��es inestim�veis de seu esfor�o, n�o apenas cl�nico on-line para aqueles que desejam continuar suas an�lises, principalmente neste momento sens�vel da humanidade.
Tamb�m tem nos oferecido sua preciosa contribui��o pol�tica e nos agraciam com reflex�es generosas sobre o isolamento, o capitalismo, o esgotamento do planeta e toda uma posi��o �tica de nunca deixar de lado as subjetividades que atravessam juntos este momento.
E nos perguntamos todo dia o que, como psicanalistas, podemos fazer nesses momentos para contribuir com este tempo em que – sozinhos e sem distra��es – a reflex�o pode evocar antigas e recentes ang�stias, ansiedades, depress�o e coloca em risco a sanidade, a sa�de ps�quica e, especialmente, nos iguala a todos sob o mesmo risco.
Ela nos ajuda a lembrar que embora juntos com todo o mundo num mesmo intento de vencer um inimigo invis�vel e silencioso, quando os mortos se tornam estat�stica, n�meros que crescem ou decrescem a cada dia, ainda existe em cada indiv�duo um sujeito.
Sujeito �nico e singular que n�o pode ser esquecido. Um sujeito que se escutando pode encontrar em si motiva��o para produzir, criar, inventar um modo de se superar, apesar de tudo.
Vivemos um momento raro, embora n�o �nico. Outros momentos de sofrimento foram tamb�m vivenciados quando surgiu a Sida, ou Aids, quando n�o havia rem�dio nem explica��o para aquele v�rus que consumia as pessoas e que mais parecia um castigo divino tomado pelo vi�s da moralidade religiosa para acusar aqueles que ousaram assumir sua homossexualidade.
A peste bub�nica, chamada peste negra, transmitida por ratos infectados e pulgas, assolou a antiga Eur�sia, levando � morte mais de 100 milh�es de pessoas. A var�ola, chamada bexiga, durou 3 mil anos e s� foi erradicada em 1980. A c�lera atingiu escala global em 1817, dizimando centenas de milh�es de pessoas. A gripe espanhola, em 1918, contaminou um quarto da popula��o global. A gripe su�na, H1N1, j� no s�culo 21, matou 16 mil no mundo.
Sobreviventes, estamos aqui e ainda para refazer trilhos, cursar outros caminhos, atravessar nuvens negras, olhar o c�u azul e o outro como semelhante. Por�m, embora muitos desejem uma mudan�a no mundo depois desta experi�ncia dura e esperem mais solidariedade e respeito, menos desigualdade, mais fraternidade, nem todos acreditam que o mundo mudar� depois desta pandemia, pois o capitalismo selvagem n�o escuta, n�o sente, n�o se cond�i sen�o de suas pr�prias perdas. Seus valores s�o cont�beis, estat�sticos, monet�rios e a m�o invis�vel do mercado s� se estende em dire��o a investimentos, insens�vel ao sofrimento humano.
Portanto, s� podemos agora aguardar que o tempo cure nossos ares deste v�rus, e devemos colaborar com o movimento mundial de isolamento, que � at� agora o �nico meio de controle ao nosso alcance. Mas, como bem sabemos, os homens nem sempre escolhem o melhor. Embora saibam o que seria o melhor, fazem o que querem e n�o o que lhes conv�m. Como disse Cazuza, vitimado por uma das grandes pestes que abateram muitos homens e mulheres: “Vamos pedir piedade, senhor, piedade pra esta gente careta e covarde”.