
Estamos em tempos dif�ceis, e mesmo que alguns o neguem, outros haver�o de concordar. Os de bom senso admitir�o que a nega��o incentiva a continuidade do cont�gio, agrava os problemas n�o resolvidos, perpetuando um sofrimento que poderia ser mais breve.
� o que desejamos. Sendo modestos, sofrer menos j� � ser um pouco menos infeliz, e com esta matem�tica seria de bom-tom para si mesmo pensar em economizar tempo de contrariedades resolvendo prontamente aquilo que l� na frente vai complicar.
Nem todos fazem esta conta preferindo empurrar tudo que tem que resolver para debaixo do tapete, deixando a m� vontade e a recusa dominarem todos os assuntos pr�ticos da vida e assim embolando a cada dia tudo que se pode deixar para depois.
Ali�s, tudo que se quer crer que pode ser deixado para depois, porque de fato n�o pode. Mesmo assim, evita-se o que contraria, corre-se atr�s do bem-estar e do conforto e, no fim, o resultado pode ser terr�vel. Dizia Guimar�es Rosa: viver � perigoso. Se assim �, todo cuidado e zelo s�o inevit�veis. N�o d� pra adiar e � preciso perder um tempinho todo dia pra resolver aquilo que necessitamos que ande bem.
Saber disso sabemos, dif�cil � a pr�tica. Entre o racional e o afetivo, h� um mundo. Muitas vezes, um furo de todo tamanho que n�o sabemos administrar. Dias atr�s vi um caso assim de grande ambiguidade. Escutando a r�dio “CBN” enquanto dirigia, os comentaristas discutiam sobre a pol�mica Karol Conk�, exclu�da do programa “Big brother Brasil” com �ndice elevad�ssimo de reprova��o popular. Os comentaristas diziam que havia coisas mais importantes para comentar e o outro respondeu: “Deixa o povo ser feliz...”
A quest�o � que o ocorrido tem certa import�ncia, pois tornou-se um fen�meno social com direito a panela�o e torcida. O conte�do explosivo, preconceituoso e colonialista das declara��es da cantora de visual t�o moderno assustou as pessoas trazendo forte como��o e recusa � cantora que humilhou, diminuiu, excluiu da mesa um dos participantes. Chocou com a agressividade e soberba demonstradas.
Ao sair da casa, ela disse que surtou...pediu perd�o. Caiu em si. A raiva faz a pessoa mostrar a verdadeira face, que de outro modo ningu�m veria, nem ela pr�pria, segundo afirmou. Disse tamb�m que buscar� se tratar. Este foi o discurso de reabilita��o, pelo menos o �nico caminho que provavelmente sua assessoria lhe prop�s. De qualquer modo, nem todo pau que nasce torto morre torto, isso a psican�lise pode confirmar. Mas haver� cura para toda perversidade?
Esta declara��o me levou a Althusser, fil�sofo e tamb�m professor de matem�tica da Sorbonne. Este, sim, surtou, e escreveu o livro “O futuro dura muito tempo”, no qual relata o despertar do surto diante da esposa que amava estrangulada.
Concluiu horrorizado ser ele pr�prio o autor de tal crime hediondo e entregou-se. Foi declarado inimput�vel pela Justi�a, condenado a dois anos de deten��o em casa de tratamento psiqui�trico. N�o aceitou pena t�o leve, exigiu castigo maior e, n�o sendo atendido, escreve o livro na tentativa de explicar o inexplic�vel.