
As democracias evolu�ram atrav�s do tempo para que a qualidade dos governantes eleitos n�o afetasse de modo irrevers�vel a vida das na��es. Para este fim, desenvolveu institui��es de controle e de compartilhamento dos poderes, para impedir que um governo absoluto ficasse livre para cometer erros absolutos.
Todos reconhecemos que o sistema democr�tico privilegia a liberdade diante da efici�ncia, na medida em que n�o pode impor a concilia��o dos dois objetivos. Elei��es livres, em que toda a popula��o participa sem restri��es, nem sempre conduzem � escolha dos melhores, porque a capacidade cognitiva das pessoas � afetada pelo n�vel de informa��o e pelos efeitos das paix�es humanas.
Para enfrentar esta quest�o, os sistemas democr�ticos garantem a cont�nua rotatividade do poder, al�m de submeter os governos ao controle do Legislativo e do Judici�rio. Pode perfeitamente ocorrer, e ocorre com alguma frequ�ncia, que a qualidade pol�tica e moral do Poder Executivo seja em algum momento superior aos dos outros poderes, mas esta divis�o e este equil�brio dos poderes � o que assegura a maior estabilidade e o maior bem-estar no longo prazo. O grande pensador ingl�s Edmund Burke, no final do s�culo 18, j� dizia que todo poder corrompe, mas o poder absoluto corrompe absolutamente.
Em tempos normais, � assim que as coisas se passam. Nos momentos de crise. contudo, quando os pa�ses escolhem um governante errado, o pre�o pode ser demasiado. Quase todas as na��es passam por momentos decisivos ao longo de sua hist�ria. Algumas saem deste teste mais fortalecidas e seguem um destino de prosperidade e de paz. Outras, infelizmente, por falta da lideran�a necess�ria, sucumbem diante dos problemas e s�o condenadas a uma exist�ncia med�ocre e empobrecida.
Dois exemplos tornam mais claras estas ideias. Diante dos primeiros movimentos de Hitler, um governo desfibrado na Inglaterra, em busca do apaziguamento a qualquer custo, deixou abertas as portas para a invas�o alem� da Europa. Depois do fato consumado, para salvar o pa�s, os pol�ticos ingleses em p�nico recorreram, relutantemente, a Churchill, um esp�rito superior � aristocracia e � pol�tica decadentes que dominavam o pa�s. Sua lideran�a salvou seu pa�s. Vencida a guerra, a Inglaterra voltou ao normal e derrotou nas elei��es o her�i que j� n�o era necess�rio. Assim � a pol�tica.
O outro exemplo � menos dram�tico, mas � uma hist�ria tamb�m cheia de li��es. A Argentina at� a Segunda Guerra era um dos pa�ses mais ricos do mundo. De repente, foram enfeiti�ados por um l�der demagogo e caudilhesco, que elegeu-se duas vezes presidente, foi deposto, voltou e elegeu-se novamente, foi sucedido por sua vi�va e, como um fantasma imortal, continuou assombrando a vida pol�tica do pa�s, elegendo sob sua marca a maioria dos presidentes at� hoje. O resultado � que o pa�s jogou fora seu destino e tornou-se, talvez para sempre, um pa�s irrelevante, cheio de pobreza e sem futuro � vista. A democracia que, no limite, salvou a Inglaterra, n�o foi suficiente para salvar a Argentina. A paix�o pol�tica do povo argentino foi maior do que as institui��es da democracia.
A hist�ria do Brasil � cheia de percal�os. Desde que cheguei ao mundo, passamos por duas ditaduras. Tivemos alguns governos verdadeiramente med�ocres, pelo menos duas aventuras inconsequentes e apenas tr�s governos de qualidade – Juscelino, Fernando Henrique e Michel Temer. O saldo � que ainda sobrevivemos, mas nosso destino continua incerto. Deixamos de nos aproximar dos pa�ses mais ricos e estamos ficando para tr�s.
Estamos mais uma vez diante de nosso destino. Estamos sendo devastados pela pandemia e a nossa economia passa por uma circunst�ncia cr�tica. N�o sabemos o que vai ser de nosso povo, amea�ado pela doen�a e pela pobreza. Como vivemos numa sociedade livre, nenhuma ordem de comando pode nos salvar. S� a reuni�o dos melhores, sob o manto de uma lideran�a iluminada, pode evitar nossa ru�na. Quais brasileiros ter�o a aud�cia de um gesto? Se depender s� do governo, estamos perdidos.