Apesar de ser o pol�tico mais longevo do pa�s, de ser o l�der isolado e incontrast�vel de um partido que j� venceu cinco elei��es desde a redemocratiza��o e de ainda ter ocupado por duas vezes a Presid�ncia da Rep�blica, o atual presidente Lula tem-se se mostrado um personagem enigm�tico e imprevis�vel. Ele pr�prio jocosamente uma vez se autointitulou uma metamorfose ambulante. A disposi��o de rever ideias e de se reinventar � sem d�vida uma boa qualidade humana, mas ser um personagem err�tico e imprevis�vel n�o � algo que sirva a um governante ou a um estadista.
J� fomos governados algumas vezes com certa leviandade e pagamos um pe�o alto por isto. Do presidente Lula, com sua experi�ncia e sua idade, s� poder�amos esperar um governo s�brio, construtivo e capaz de superar as tenta��es do populismo e do oportunismo pol�tico. At� este momento n�o podemos estar seguros disto.
Os governos n�o podem tudo, as divis�es sociais que se multiplicam hoje em todas as sociedades causam grandes restri��es � a��o do Estado, mas h� momentos hist�ricos em que governos realizaram grandes feitos. Entre n�s h� o caso recente do Plano Real que terminou com uma infla��o de d�cadas e que havia resistido a todas as tentativas de controle. Voltar a crescer e criar prosperidade para uma popula��o que na sua maior parte vive em relativa pobreza � a principal tarefa que temos hoje. � algo muito dif�cil, mas n�o imposs�vel. Para isto, no entanto, � preciso um grande governo.
Grandes governos s�o os que mudam o futuro, n�o os que tentam mudar o passado, reescrevendo a hist�ria a seu gosto para apagar erros ou reabilitar personagens cujo julgamento haver� de ser feito apenas com a passagem do tempo. O governo do PT em 2014 e 2015 mergulhou, por conta de erros exclusivamente seus, nosso pa�s na mais profunda recess�o de nossa hist�ria, trouxe de volta a infla��o, os juros altos e o endividamento p�blico excessivo. Estes s�o fatos passados, estat�sticas j� estabelecidas. Como dizia o poeta Ferreira Goulart “o que passou, passou. Nada � capaz de mudar isto.” O presidente Lula parece julgar que sua tarefa priorit�ria � mudar esta hist�ria em vez de reunir os brasileiros de todos os lados para mudar o presente e assim mudar tamb�m o futuro.
Se alguma coisa um homem com a viv�ncia do presidente Lula j� deveria ter compreendido � que o crescimento econ�mico de um pa�s n�o � apenas uma quest�o de vontade. Se ele ainda se permite esta lembran�a, em 2003 quando assumiu pela primeira vez e realizou um governo em que houve crescimento e equil�brio, apesar do discurso conveniente da heran�a maldita tratou de seguir sem altera��o as pol�ticas e o comportamento do governo anterior. Chegou a escolher, e manter no cargo por oito anos, um deputado do PSDB e ex-presidente de um banco americano para a presid�ncia do Banco Central. Se dele divergiu em algum momento, ele o fez de modo reservado, nunca em ruidosas entrevistas.
Durante o primeiro mandato de Lula eu exerci meu �ltimo mandato de deputado federal, na oposi��o ao governo. Malgrado esta posi��o, quando o governo decidiu fazer uma forte reforma da Previd�ncia com foco no servi�o p�blico, decidi que era meu dever ajudar e cheguei a presidir a Comiss�o Especial na C�mara e depois encaminhar vota��es no plen�rio para atrair para a reforma do governo alguns votos da oposi��o. A reforma foi aprovada por poucos votos al�m do m�nimo necess�rio. Naquele momento o governo pregava a paz entre os brasileiros, praticava uma pol�tica econ�mica realista e blindada contra a demagogia e o pa�s conseguiu crescer por alguns anos.
Hoje vejo tudo acontecendo de modo muito diferente. O novo presidente Lula, apesar de todas as li��es da vida, vive mobilizando suas legi�es para a luta e o conflito, tem olhos fixos no passado e fechados para o futuro e tenta, tal como um militante irrespons�vel, quebrar a blindagem institucional da nossa prec�ria estabilidade econ�mica.
Tudo isto passa longe da minha compreens�o. Ao contr�rio do que disse Pol�nio a respeito do pr�ncipe Hamlet: n�o h� l�gica nesta loucura.