A m�e pesca o fragmento de di�logo entre os filhos. Os dois est�o desenhando juntos, no quarto do mais velho. Sem interromper a atividade, o ca�ula diz n�o entender o motivo dessa cisma. “Por que algu�m teria umbigofobia?”, questiona.
“O nome certo � onfalofobia”, corrige o outro. Na opini�o dele, o pavor aos umbigos era relativamente f�cil de administrar. Bastava evitar lugares em que as pessoas ficam sem camisa, como no clube ou em praias. “Tem fobia que parece surreal. J� ouviu falar das pessoas que t�m horror a pal�ndromos?”, diz.

– O que � isso? – quer saber o pequeno, curioso.
Com cuidado para n�o desmerecer o mais novo, o adolescente explica ter aprendido sobre pal�ndromos na aula de portugu�s. “Pelo que entendi, s�o palavras que podem ser lidas de tr�s para frente, sem alterar o sentido”, define. Alguns dos exemplos seriam osso, arara, anilina. O mais absurdo � que esse tipo de fobia leva o nome de aibofobia, que por sinal � um pal�ndromo.
“Tem tamb�m a fobia de inseto”, comenta a m�e, tentando ser inclu�da no bate-papo.
Os dois se entreolham, c�mplices. Nem escondem o t�dio em rela��o ao coment�rio antiquado, coisa de gente nascida no s�culo passado, �poca em que nem existia internet. Agora � dife- rente. Com um clique no mouse, brotam milhares de informa��es na tela, �teis e in�teis. Entre as insetofobias mais conhecidas est�o as que envolvem aranhas e baratas.
“A bab� de voc�s tinha verdadeiro pavor a bicho-pau que, segundo ela, dava azar”, observa ela, enquanto dobra um cobertor. Aproveita a chance para citar O dilema do bicho-pau, do saudoso escritor de livros infantis Angelo Machado. O livro conta a hist�ria de um inseto que se disfar�a de graveto para escapar dos predadores. Talvez ela esteja enganada, mas a obra do bi�logo n�o faz refer�ncias ao mau agouro trazido pelo inseto.
– Ser� que existe formigofobia? – brinca o pequeno, divertido. Segundo ele, deve ser dif�cil a vida da pessoa que sofre desse mal, levando em considera��o o fato de que as formigas est�o por toda parte. Todos riem. Quando o tema das fobias amea�a esfriar, o adolescente resgata um tal medo de palavras grandes, denominado hipopoto- monstrosesquipedaliofobia. “Quem tem essa fobia n�o consegue nem dizer o nome dela”, comenta o irm�o mais velho.
– S�rio isso?! Voc� n�o est� inventando isso, est�?, duvida a m�e. Chega a pensar em tirar a prova no Google, mas controla o impulso. O ato colocaria em risco aquele raro momento de distra��o entre irm�os, sem a interfer�ncia dos eletr�nicos.
O adolescente nem reage ao questionamento. Continua concentrado, desenhando a figura de um personagem de anime. O sil�ncio abre espa�o para o surgimento da m�e moralista, repressora. Era dever dela alertar os filhos de que fobia n�o � brincadeira. As v�timas sofrem muito, a ponto de ficar paralisadas pelo medo, incapazes de andar de avi�o ou dirigir autom�veis. Para casos como esses, h� simuladores de voos e de pilotagem de carros no pr�prio computador, que ajudam o paciente a ir se familiarizando com o uso desses meios de transporte.
Na verdade, n�o h� necessidade de se ter uma moral das hist�rias. Basta o lembrete de que, para ganhar uma dose extra de energia, converse com uma crian�a. Se ela se interessar por voc�, � garantia de receber uma tirada in�dita, uma adivinha��o ou piada. Leveza pura.