(none) || (none)
Publicidade

Estado de Minas DIVERSIDADE

Uma sociedade diversa n�o � necessariamente uma sociedade inclusiva

A diversidade, por si, n�o garante melhores condi��es de trabalho, tratamento respeitoso e equ�nime, circula��o segura e afetiva. � preciso criar garantias


29/06/2021 08:00 - atualizado 29/06/2021 13:41

Parada do Orgulho LGBTQIA em Belo Horizonte(foto: Angelo Pettinati/Esp. EM - 29/09/13)
Parada do Orgulho LGBTQIA em Belo Horizonte (foto: Angelo Pettinati/Esp. EM - 29/09/13)

 
Diversidade � uma palavra que ressoa cada vez mais ativamente nos nossos espa�os cotidianos. Das grandes marcas aos clubes de futebol; dos espa�os escolares � programa��o das tev�s. Mas ser� que sabemos de fato do que se trata o termo? E as palavras inclus�o e representatividade, o que ser� que significam?


Inauguro esse espa�o com a tarefa de falar sobre diversidade, em toda sua amplitude. Tarefa prazerosa, sim, mas tamb�m dif�cil, pois esse � um termo que guarda em si todos os caminhos. E pensando por onde iniciar esse trajeto, recorro ao meu lugar mais confort�vel - o de professora - para buscar algumas defini��es e levantar algumas reflex�es que nos ajudar�o a entender um pouquinho mais do que estamos falando. 

Vivemos um tempo em que a diversidade � uma moeda forte no mercado. Marcas, empresas, pessoas p�blicas buscam alinhar seus discursos a uma ideia de representatividade, de acolhimento �s diversas vozes e grupos. Construir uma imagem positiva na comunica��o com seus p�blicos tem sido o objetivo perseguido com afinco por um conjunto cada vez maior de marcas e organiza��es.

E podemos constatar isso pelo n�mero crescente de campanhas que celebram datas como o dia da visibilidade trans, o dia da consci�ncia negra, as hashtags #somostodos, os apoios �s paradas LGBTQIA+ locais, o uso das cores do arco-�ris nas logomarcas. O que � um pouco mais dif�cil de observar, � se tais a��es veem acompanhadas de transforma��es efetivas nos ambientes de trabalho, de escuta real das demandas dos grupos supostamente abra�ados, de abertura de espa�os para constru��o de outras falas a partir de outros olhares. 
 

"A inclus�o representa um passo al�m; ela acontece quando se instaura um sentimento real e seguro de pertencimento. Quando h� uma mudan�a cultural e comportamental significativa, que se reflete na maneira como as pessoas s�o tratadas nos ambientes nos quais circulam e dos quais fazem parte."

 

� preciso que nos perguntemos se esse alinhamento entre discurso e pr�tica acontece, de fato. Ou se estamos usando a diversidade de maneira esvaziada, como forma de inser��o de mercado e aumento de p�blico e lucro. O capitalismo abocanha tudo o que v� pela frente, aqui n�o seria diferente. A diversidade � uma tend�ncia de mercado e, como todo tend�ncia, ela pode passar. � preciso cuidado para analisar as estrat�gias de comunica��o que vemos, hoje, na veicula��o de mensagens ligadas ao tema. E � preciso ser vigilante, n�o como forma de diminuir tais a��es – que t�m import�ncia na circula��o e visibiliza��o de pautas fundamentais – mas como forma de cobrar posturas leg�timas, que provoquem mudan�as reais. 


Discurso � a linguagem em movimento. Por isso mesmo, ele � percurso, trajeto, estrada que leva ao outro. Discurso � a��o sobre a pr�pria vida e a��o sobre o mundo em que vivemos. Muito se diz, mas pouco ainda efetivamente se transforma.
 
Os espa�os de constru��o de sentido pressup�em a presen�a do outro, a escuta efetiva e afetiva, a dissolu��o das hierarquias que estruturam a nossa no��o primeira de comunica��o. Tem sempre algu�m que fala e sempre algu�m que escuta, mas esses algu�ns pouco trocaram de lugar ao longo dos tempos.
 

"� preciso que nos perguntemos se esse alinhamento entre discurso e pr�tica acontece, de fato. Ou se estamos usando a diversidade de maneira esvaziada, como forma de inser��o de mercado e aumento de p�blico e lucro."

 
 
Recorrendo novamente a uma estrat�gia professoral, por for�a do h�bito, parto do conceito de diversidade e de outros dois car�ssimos termos que a acompanham – inclus�o e representatividade - para tentarmos entender onde estamos errando e acertando tamb�m.

Diversidade pode ser definida como a pluralidade de pessoas, com suas diferen�as e semelhan�as de identidades, de culturas, de experi�ncias de vida. Conceito fundamental e fundante das nossas rela��es, a diversidade � o elemento que nos estrutura e orienta enquanto sociedade, enquanto corpo coletivo. 

Mas uma sociedade diversa n�o � necessariamente uma sociedade inclusiva. Uma empresa diversa n�o � necessariamente uma empresa inclusiva. Uma escola diversa n�o � necessariamente uma escola inclusiva. A inclus�o representa um passo al�m; ela acontece quando se instaura um sentimento real e seguro de pertencimento. Quando h� uma mudan�a cultural e comportamental significativa, que se reflete na maneira como as pessoas s�o tratadas nos ambientes nos quais circulam e dos quais fazem parte.  

A diversidade, por si, n�o garante melhores condi��es de trabalho, tratamento respeitoso e equ�nime, circula��o segura e afetiva. � preciso criar os meios que possibilitar�o a constru��o dessas novas realidades, mais af�veis e mais justas. Tem uma frase da Verna Myers (vice-presidente de estrat�gia de inclus�o da Netflix) que traduz de um jeito bonito isso tudo que acabei de dizer: “diversidade � convidar para a festa, inclus�o � chamar para dan�ar”. 

N�o menos importante, temos a representatividade, os espelhamentos t�o necess�rios de reconhecimento de si e dos seus. Quando tenho professoras negras nos espa�os de sala de aula do ensino superior; quando leio mulheres nas bibliografias referenciais dos cursos; quando vejo pessoas trans ocuparem cargos em empresas; quando vejo pessoas gordas livres com seus corpos nos editoriais de revistas; quando vejo pessoas com defici�ncia ocuparem espa�os de atua��o p�blica; quando vejo uma m�e amamentar seu beb� em cima de um p�lpito parlamentar; tudo isso nos aponta exist�ncias diversas, poss�veis, completas. 
 

"� preciso que nos perguntemos se esse alinhamento entre discurso e pr�tica acontece, de fato. Ou se estamos usando a diversidade de maneira esvaziada, como forma de inser��o de mercado e aumento de p�blico e lucro."

 

E por que � importante trazer tais conceitos aqui? Porque eles nos ajudam a entender do que estamos falando quando pronunciamos tais palavras. Eles d�o corpo e forma �s pautas com as quais nos identificamos. E, principalmente, eles nos apontam o caminho que ainda temos pela frente: n�o existe diversidade sem inclus�o; n�o existe mudan�a que n�o passe pela ocupa��o de espa�os hist�rica e socialmente negados, pela representatividade publicit�ria, cultural, acad�mica, pol�tica e tantas outras que nos constituem.  


*Silvia Michelle A. Bastos Barbosa (professora universit�ria nos cursos de Comunica��o, Artes e Educa��o) 

*Para comentar, fa�a seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)