
A onda conservadora que levou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ao Pal�cio do Planalto e diversos governadores aos seus cargos em 2018 n�o reaparecer� nas elei��es municipais. Se � improv�vel a maior parte da popula��o brasileira ter mudado de espectro ideol�gico, o que justifica o fracasso dos candidatos mais alinhados �s ideias do atual presidente? Evidentemente, � imposs�vel dizer o que determina o voto do eleitor, mas algumas reflex�es relevantes para entender vir�o a�.
Em primeiro lugar, todos se lembram do per�odo recente – entre 2014 e 2018 – que fez surgir o fen�meno da Lava Jato, levou o ex-presidente Lula para a cadeia e fez surgir na popula��o um sentimento antipol�tica, que fortaleceu os chamados outsiders. Paradoxalmente, o principal beneficiado foi um deputado de terceiro escal�o e bem conhecido nos c�rculos pol�ticos de Bras�lia. O fato � que Bolsonaro estava no lugar certo e na hora certa. Isso permitiu que se elegesse quase sem recurso algum, nem tempo na propaganda eleitoral gratuita. muito menos palanques estaduais. Ainda por cima, levou consigo 12 dos 27 governadores, dentre os quais destacam-se o ex-aliado Jo�o Doria (PSDB-SP) e o tamb�m o ex-aliado e governador deposto Wilson Witzel (PSC-RJ).
� fato que o presidente n�o apresenta mais a mesma forma de transfer�ncia de votos, j� que nenhum de seus candidatos com apoio declarado obteve maior inten��o de votos por isso. O caso mais emblem�tico � de Celso Russomano (Republicanos), em S�o Paulo, que chegou a ter 28% das inten��es de voto e ficou de fora da disputa contra o atual prefeito Bruno Covas, que por sua vez enfrentar� um fortalecido Boulos no segundo turno.
Existem tamb�m evid�ncias do cansa�o da popula��o com o discurso extremista dos aliados de Bolsonaro. Esses sinais v�o desde o aumento das inten��es de voto de candidatos centristas, como Eduardo Paes (37% de votos na disputa do primeiro turno no Rio de Janeiro), at� o movimento perpetrado por Luciano Huck e alguns apoiadores de formar uma frente ampla de centro, envolvendo nomes como o ex-ministro da Justi�a S�rgio Moro, o atual presidente da C�mara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e algumas outras figuras que antes buscavam se associar ao presidente da Rep�blica, mas agora preferem uma posi��o mais equilibrada.
Essa volta ao centro est� longe de ser novidade. Era regra que levou um Partido dos Trabalhadores nada radical � Presid�ncia e sempre foi a receita do PSDB para chegar ao poder. Mas se o centro pode ter voltado � moda, a forma de fazer campanha parece ter sido alterada definitivamente depois da campanha de 2018.
Ningu�m sabia ao certo (e at� hoje n�o sabe) o poder das redes sociais para eleger algu�m. De qualquer forma, ningu�m mais menospreza a influ�ncia do on-line. No caso brasileiro, mais do que em qualquer outro lugar do mundo, a dissemina��o maci�a de informa��es – muitas delas falsas – pelo WhatsApp � at� hoje um fen�meno de estudo e at� de um inqu�rito no Supremo Tribunal Federal. Por tudo isso, todos os principais candidatos t�m estrat�gias robustas para suas campanhas digitais nessas elei��es. Da mesma forma, o Tribunal Superior Eleitoral e todas as demais autoridades est�o bem mais preparadas e atentas � dissemina��o de fake news ou outras formas de manipula��o que antes. Seja pela restri��o das empresas de internet, seja pela melhora dos entes p�blicos fiscalizadores, a maior restri��o de informa��es inver�dicas acaba por reduzir um diferencial competitivo de grupos beneficiados no passado.
Outro aspecto que provavelmente pesou na escolha dos eleitores � a atua��o dos candidatos � reelei��o durante a pandemia. Em um extremo est� o prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (Republicanos), desaprovado por 55% dos cariocas por sua atua��o no combate � COVID-19 e rejeitado por 65% da popula��o. Mesmo com o apoio de parte dos evang�licos, Crivella ficou apenas com 21,9% das inten��es de votos. No outro extremo estava o candidato � reelei��o em Belo Horizonte, Alexandre Kalil, aprovado por 77% pela sua atua��o no combate � pandemia, rejei��o de apenas 14% e reeleito no primeiro turno com mais de 63% dos votos.
Por fim, vale citar as elei��es recentes no M�xico, na Argentina, na Bol�via e outros que elegeram pol�ticos mais alinhados � direita e, recentemente, voltaram ao centro ou mais � esquerda. O mais relevante �, sem d�vida, os Estados Unidos. Caberia um outro artigo apenas para tratar dessa hip�tese, mas parece claro que a elei��o de Joe Biden e Kamala Harris foi um forte baque no movimento nacional-populista-conservador.
� digno de nota que Bolsonaro tinha recursos para tornar perene a sustenta��o pol�tica de seu grupo pol�tico: tinha um partido com muito recurso, exposi��o gratuita di�ria na m�dia, a m�quina p�blica federal e uma milit�ncia que era bem maior do que o que tem hoje. Durante seus dois anos de mandato, o presidente foi rapidamente dilapidando suas for�as e chega nanico nessas elei��es municipais.
Ainda � cedo para falar que a onda conservadora virou uma marolinha. O mais prov�vel � que n�o, pois, conforme j� demonstrado em diversas pesquisas, o brasileiro � bem mais conservador do que parece. Al�m disso, ainda existe tempo para que o presidente busque uma rota que o leve a ser competitivo para uma elei��o em 2022.