
Em tempos de haters (on-line ou n�o), a comunica��o n�o violenta nunca foi t�o fundamental. Aprimorar os relacionamentos interpessoais e diminuir a viol�ncia no mundo � o desejo de todos (ou quase todos). Usando a experi�ncia como psic�logo cl�nico, o norte-americano Marshall Rosenberg desenvolveu um conjunto de t�cnicas que aprimoram os relacionamentos pessoais e profissionais. O m�todo transforma padr�es de pensamento que conduzem a discuss�es em a��es pac�ficas.
O brasileiro, sempre apontado como um povo pac�fico, compreensivo e acolhedor, de uns anos para c� tem mostrado outra cara, bem mais irasc�vel. Ou seja, as pessoas se irritam com facilidade, demonstram raiva com frequ�ncia e quase sempre est�o exaltadas. A postura pol�tica, a polariza��o de pensamentos e o partidarismo, automaticamente, s�o apontados como os causadores e influenciadores desse “novo” comportamento. Quando, na verdade, muitos defendem que aquela ideia do brasileiro sempre gente boa, coerente, acess�vel e descomplicado � que est� errada. No m�nimo supervalorizada. Na real, as ra�zes se apresentam muito mais como seres agressivos, geniosos, col�ricos, esquentados, irrit�veis e zangados.
Seja qual for a origem desse comportamento, certo � que a busca tem de ser sempre por uma conviv�ncia pac�fica, com todos aprendendo a respeitar, escutar e se comunicar com o outro. A psic�loga Jana�na Fidelis, especialista em psicologia positiva, bem-estar e autorrealiza��o, destaca que a comunica��o n�o violenta se trata de uma ferramenta eficiente para capacitar aqueles que querem se desenvolver para estabelecer a confian�a m�tua entre pessoas e institui��es. “Ela nos ajuda a reformular a maneira pela qual nos expressamos e ouvimos os outros, uma vez que se baseia em habilidades de linguagem e comunica��o que fortalecem a capacidade de continuarmos humanos em nossas intera��es com o outro, mesmo em condi��es adversas.”
Por ser um conjunto de t�cnicas, Jana�na Fidelis enfatiza que a comunica��o n�o violenta (CNV) pode ser ensinada. Existem livros, cursos presenciais e on-line, v�deos na internet, artigos e muitos outros conte�dos que ensinam o uso dessa ferramenta. Contudo, o grande desafio � se manter vigilante para conseguir pratic�-la. “Assim como qualquer outra mudan�a de comportamento, exercitar uma CNV requer dedica��o, desenvolvimento e persist�ncia. A CNV � como um m�sculo e precisa de exerc�cio”, destaca.

Jana�na Fidelis diz que a comunica��o n�o violenta � uma abordagem para se relacionar de uma maneira mais aut�ntica e “desarmada”. Ela pode ser usada em todas as conversas, discuss�es, reuni�es, conflitos e nas mais diversas situa��es, pessoais e profissionais. A empatia � base da CNV. Uma comunica��o clara e emp�tica proporciona conex�o genu�na entre as pessoas, abrindo espa�o para o di�logo e a negocia��o sobre caminhos mais sustent�veis de se relacionar.
A psic�loga explica que Marshall desenvolveu quatro passos que s�o considerados guias essenciais para garantir uma comunica��o n�o violenta capaz de se conectar �s necessidades e demandas de cada uma das partes envolvidas na intera��o. “Para praticar a CNV a pessoa deve separar fatos de julgamentos; reconhecer as emo��es desconfort�veis; revelar necessidades que n�o est�o sendo atendidas e firmar um acordo que viabilize a conviv�ncia futura.”
COMPAIX�O
Em tempos estranhos, de embates em v�rias c�lulas da sociedade, a comunica��o est� mais violenta tanto no n�cleo particular quanto no social: “Hoje, as pessoas est�o muito conectadas �s suas quest�es individuais e, quando isso ocorre, � dif�cil praticar a empatia. � poss�vel ver movimentos voltados para a coopera��o e comunica��o n�o violenta, mas ainda h� um longo caminho a ser percorrido no que diz respeito ao 'olhar para o outro'. Somos acostumados a julgar e precisamos desenvolver mais nossa habilidade de fazer perguntas, entender melhor o contexto e quem est� de frente para n�s. � comum vermos pessoas expressando o que 'pensam' sem ao menos perguntar “o que aconteceu”, refor�ando a percep��o de pouco cuidado na comunica��o”, lembra a psic�loga.
A falta de escuta agrava as interpreta��es. Ent�o, � preciso encontrar uma maneira de lidar com quem tem uma comunica��o violenta: “Imagine que voc� est� em uma estrada movimentada, � noite e com chuva. O carro que vem na dire��o contr�ria est� com o farol alto. O que ocorreria se voc� tamb�m aumentasse seu farol? Duas pessoas sem enxergar � pior do que uma. Ent�o, o melhor neste caso � manter seu farol baixo, sinalizando dessa forma que o outro est� errado. O mesmo vale para a CNV. A melhor forma de lidar com uma pessoa que tem uma comunica��o violenta � sendo emp�tico, dando o exemplo de como as rela��es devem ocorrer. Marshall j� dizia: 'por tr�s de todo comportamento existe uma necessidade'. Em vez de julgarmos uma pessoa do porqu� ela fez isso ou falou aquilo, devemos identificar quais s�o as necessidades dela que n�o est�o sendo atendidas e comunicar isso”, chama a aten��o Jana�na Fidelis.
Convidamos o leitor a baixar a guarda e praticar a comunica��o n�o violenta, se j� n�o a exerce. Ali�s, ela � uma meta inspiradora para cada um se comprometer a seguir como um dos objetivos em 2020. Que tal?
Fortalecer v�nculos e amenizar conflitos
Para praticar a comunica��o n�o violenta � preciso que cada um resgate a capacidade inata do ser humano de se expressar sem carregar na fala suas dores, frustra��es e ang�stia
Responder na mesma moeda. Dar o troco. Falar no mesmo tom. Atitudes que, dependendo do contexto, s� v�o tornar a comunica��o falha ao dar lugar para a viol�ncia em determinadas verbaliza��es. A psic�loga Jana�na Fidelis, especialista em psicologia positiva, bem-estar e autorrealiza��o, refor�a que o objetivo da comunica��o n�o violenta (CNV) � fortalecer v�nculos, e n�o romp�-los. Portanto, � uma ferramenta poderosa na solu��o de conflitos. “Ela tem como premissa fazer com que as partes em conflito olhem para si e para o outro de modo a enxergar a mensagem que est� por tr�s das a��es e palavras, sinais de necessidades e demandas n�o atendidas. Por meio dela, o mediador consegue aproximar as partes envolvidas em um conflito, qualquer que seja, e fazer vir � tona pontos escondidos por tr�s dos questionamentos e descontentamentos dessas pessoas, facilitando o di�logo e a solu��o do problema.”
Com a aspereza da comunica��o, ser� poss�vel conversar sem julgar? Jana�na Fidelis alerta que � dif�cil, mas poss�vel: “O problema n�o est� no julgamento, mas o que fazemos com ele. A CNV n�o nos ensina a n�o julgar, mas sim a n�o usar o julgamento na nossa comunica��o com o outro. Costumo sempre dizer aos meus clientes de coaching de carreira: 'Pergunte mais, julgue menos'”. Na grande maioria das vezes, � imposs�vel controlar o que pensamos e o julgamento surge na nossa cabe�a. Mas, segundo a especialista, podemos treinar perguntas para n�s mesmos para interagir mais em cima de fatos e menos de julgamentos. Depende de cada um se comunicar de maneira n�o violenta, n�o julgando na sua comunica��o com o outro.
PALAVRAS E A��ES
A import�ncia da comunica��o n�o violenta � que a t�cnica, avisa Jana�na Fidelis, pode ser aplicada em relacionamentos pessoais, familiares, organizacionais, educacionais, em negocia��es, disputas e conflitos de qualquer natureza, estabelecendo rela��es mais profundas, afetivas e eficazes. “A CNV � um convite para termos conversas corajosas em todas as �reas da vida.”
Assim, refor�a Jana�na Fidelis, todos podem praticar a comunica��o n�o violenta. H� desafios, claro, mas para mudar � preciso querer: “O autoconhecimento � a base de tudo. Saber quais s�o nossos padr�es de comportamento, como tendemos a lidar com diferentes situa��es e como interagimos s�o passos essenciais para praticar a comunica��o n�o violenta e nos relacionarmos de maneira saud�vel”.
Para a psic�loga, se formos capazes de escutar nossos pr�prios sentimentos e necessidades, entrando em empatia com eles, poderemos exercer a empatia com o outro. “Toda mudan�a come�a com a consci�ncia para a necessidade de mudar. Mas s� isso n�o � suficiente. � preciso querer mudar e ter uma comunica��o n�o violenta. Devemos saber diferenciar inten��o de impacto. O que determinar� se minha comunica��o foi emp�tica ou n�o est� mais relacionado ao impacto gerado no outro do que na minha inten��o. Muitas vezes, agimos sem perceber como nossas palavras, a��es e at� a nossa maneira de pensar podem gerar consequ�ncias negativas e tornar as rela��es tensas, superficiais ou sem nenhum prop�sito. Conhecer e praticar a CNV ajuda a melhorar a forma de interagir com o outro e com o mundo.”
A chave para os relacionamentos
Mais do que nunca, saber se comunicar � muito importante em qualquer �rea da vida. Viver em sociedade implica, quase que necessariamente, na comunica��o. Infelizmente, nem sempre as pessoas conseguem ser bem-sucedidas nesse ponto e acabam criando atritos nos relacionamentos, gerando distanciamento e at� mesmo rompendo la�os importantes porque n�o souberam como entender o que a outra pessoa queria dizer.

“O grande prop�sito da comunica��o n�o violenta � resgatar a capacidade inata que todo ser humano tem de se expressar sem viol�ncia, ou seja, de uma maneira que consiga dizer o que sente, mas sem carregar na fala suas dores, frustra��es, ang�stia e outros sentimentos n�o saud�veis e, portanto, n�o ferir o outro”, explica Camila Cury, psic�loga e presidente da Escola da Intelig�ncia, que aplica o programa de educa��o socioemocional, idealizado por Augusto Cury.
Camila Cury enfatiza que h� quatro pontos importantes que devem ser avaliados quando se pensa em melhorar a comunica��o: “O primeiro deles � observar as pessoas e as situa��es sem julgar, fazer o exerc�cio de ler tudo o que est� ocorrendo de uma maneira neutra, sem muitos apontamentos. Olhar para as pessoas de forma que, mesmo que voc� n�o entenda os motivos, saiba que deve existir uma boa raz�o para determinadas atitudes”.
O segundo ponto � saber identificar e dar nome aos sentimentos. Em meio a uma situa��o ruim, � preciso entender que, �s vezes, era voc� que estava colocando uma expectativa alta em uma pessoa ou um momento espec�fico: “Com o tempo, conseguimos adquirir maturidade suficiente para entender que nossos pensamentos e sentimentos t�m muito mais a ver com a gente, com a nossa hist�ria, do que necessariamente com o outro. Ent�o, desse lugar seguro, � mais f�cil ter essa leitura equilibrada das coisas. Muitas das coisas que atribu�mos ao outro na verdade s�o nossa responsabilidade”.
FRUSTRA��ES
Outra importante iniciativa � n�o culpar os outros pelas situa��es que ocorrem na vida. “Se responsabilizar pelas suas atitudes, comportamentos, escolhas e decis�es, por exemplo, far� com que toda a expectativa seja real e n�o idealizada. Portanto, diminuir� o impacto dos momentos nos quais a outra pessoa n�o faz o que foi imaginado.”
E, por �ltimo, Camila Cury chama a aten��o para o que muitos n�o conseguem: saber fazer pedidos e dizer, com clareza, o que quer ou espera. “Vale a pena dizer sempre a verdade. As pessoas n�o dizem exatamente o que est�o esperando e imaginam que, mesmo assim, ser�o compreendidas rapidamente e correspondidas. Mas se n�o houver clareza no que se espera � bem mais prov�vel que haja frustra��es. O exerc�cio � falar sem medo o que se espera. Nunca saberemos o que se passa na mente do outro. Por isso, quanto mais soubermos como expor o que est� dentro de n�s, mais chances teremos de ter uma comunica��o limpa, sem ru�dos e interfer�ncias. Olhar para si e se colocar no lugar do outro � sempre uma chave para relacionamentos mais sadios e transparentes.”

Leandro Cardoso, jornalista e professor de comunica��o
Multiplicador da ideia
“Pratico a comunica��o n�o violenta muito antes de ela ser t�o difundida. Claro que, depois de ler mais sobre o tema, a minha comunica��o com as pessoas melhorou, principalmente quando a entendemos como um m�todo de linguagem. Digamos que quem convive mais tempo comigo percebe e � mais beneficiado. Minha m�e, por exemplo, que � de uma gera��o muito diferente, n�o sabe o que � a comunica��o n�o violenta, mas acaba praticando a partir das experi�ncias que t�m comigo. Nunca falei como ela deve ou n�o se comunicar com as pessoas, simplesmente pratico com ela, e ela replica, naturalmente. No trabalho, com meus colegas, tamb�m sou uma esp�cie de multiplicador. � uma forma de evitar conflitos ou lidar com os problemas de forma madura. Como praticante do m�todo, me considero multiplicador dessa ideia. N�o costumo apontar os erros das pessoas ou adjetiv�-las. Comunica��o n�o � o que falo, comunica��o � o que o outro entende. Em sala de aula, por exemplo, cada aluno tem sua forma de interpretar a vida, seus costumes, sua cultura. Sendo assim, cada um necessita de um cuidado especial da minha parte. Quando percebo que um aluno n�o entendeu determinado comando durante as aulas, me esfor�o para adaptar minha comunica��o. N�o fa�o ju�zo de valores. � assim que h� mais de 15 anos atuo ministrando cursos de comunica��o. Na pr�tica funciona assim: um colega de trabalho gosta de ouvir m�sica com volume mais alto e isso o incomoda. Voc� tem a op��o de falar 'cara, voc� acha que est� na sua casa pra ouvir m�sica assim?', ou 'voc� divide o espa�o de trabalho com outras pessoas, que podem gostar ou n�o das mesmas m�sicas que voc� gosta. Sugiro que coloque o fone para ouvir suas m�sicas preferidas'.”
Os quatro passos
Conhe�a as atitudes essenciais para garantir uma comunica��o n�o violenta, conforme Marshall Rosenberg, psic�logo cl�nico norte-americano, criador do m�todo:
1 - Observa��o: observar sem julgar
2 - Sentimentos: identificar os sentimentos
3 - Necessidades: reconhecer e assumir os sentimentos
4 - Pedidos: quem consegue expressar aquilo que observa, sente e necessita far� um pedido de forma clara e objetiva com o desejo de satisfazer suas necessidades. Pedir� de forma genu�na