Chico Science levou para suas can��es o cotidiano do Bairro Rio Doce, onde morava
Em abril de 1994, a banda pernambucana Chico Science & Na��o Zumbi lan�ou Da lama ao caos. Eram duas vers�es – o LP tinha 11 faixas; o CD, 14. O disco causou estranheza. A gravadora Sony n�o sabia muito bem o que fazer com o grupo, que n�o soava como os roqueiros do momento. As r�dios n�o tocaram as can��es. Apenas 10 mil LPs e CDs foram vendidos, numa �poca em que artistas mais populares superavam 1 milh�o de c�pias. Por�m, em pouco tempo, Da lama ao caos tornou um cl�ssico da m�sica brasileira, consagrando o movimento manguebeat.
Como esse disco, inicialmente criticado e colocado para escanteio, virou o jogo? Esse � um dos temas do novo livro do jornalista Jos� Teles, que acompanhou o in�cio da carreira de Chico Science & Na��o Zumbi quando trabalhava no Jornal do Commercio, no Recife. Da lama ao caos: Que som � esse que vem de Pernambuco? integra a cole��o Discos da m�sica brasileira (Edi��es Sesc S�o Paulo), s�rie de e-books organizada pelo cr�tico Lauro Lisboa Garcia.
Teles se valeu da pr�pria mem�ria, de material da �poca e de suas entrevistas com m�sicos, produtores, empres�rios e diretores de gravadoras. Destaca as conversas com Liminha, produtor do �lbum, e Goretti Fran�a, irm� de Chico Science, que esclareceram pontos relevantes. Gra�as a Liminha, ouviu vers�es originais do repert�rio. Por sua vez, Goretti revelou a intimidade de Chico, autor de praticamente todas as faixas de Da lama ao caos.
O material joga luz sobre mitos envolvendo a obra de Science, que morreu em 1997, aos 30 anos, em acidente de carro. Um deles � sua rela��o com o legado do m�dico e ativista pernambucano Josu� de Castro (1908-1973). “Esclareci de vez uma liga��o que se fantasiou de influ�ncia de Josu� sobre Chico Science, que foi praticamente nenhuma. Ele soube de Josu� atrav�s de mim, numa conversa muito r�pida. Chico tinha imagina��o f�rtil. Logo depois, faria a can��o em que colocou o nome de Josu�. Fez a liga��o entre o m�dico cientista, mangues e caranguejos a partir do t�tulo do livro Homens e caranguejos, que lhe mostrei em minha casa”, conta Teles.
“A partir da�, sugiram mil conjecturas sobre influ�ncias, disserta��es, teses. Um tempo depois, n�o sei quando, Chico comprou Geografia da fome”, conta o jornalista, referindo-se ao cl�ssico do intelectual pernambucano, lan�ado em 1946.
PSICOD�LICOS Com 30 anos de carreira nas reda��es, Teles � autor de uma obra de refer�ncia: Do frevo ao manguebeat (Editora 34), lan�ado em 2000. Esse livro revelou ao pa�s a importante cena psicod�lica de Pernambuco, surgida nos anos 1970. “Gravaram-se muitos discos totalmente sem potencial comercial, experimentais. Hoje, s�o considerados cl�ssicos, mas esse status � recente. Pa�bir�, de Lula C�rtes e Z� Ramalho, tornou-se um dos �lbuns mais caros do Brasil. Eles n�o apareceram na �poca porque n�o houve divulga��o no Sudeste, sen�o teriam sido bem recebidos como foram os do manguebeat”, assegura.
Revisitar o ic�nico �lbum do manguebeat, vinte e cinco anos depois de seu lan�amento, permitiu ao jornalista perceber aspectos importantes da obra do l�der do manguebeat. “Goretti, irm� do Chico, explicou trechos de can��es que v�m de coisas simples, do cotidiano dele em Rio Doce, bairro da periferia de Olinda, onde a fam�lia morava.”
Teles destaca o car�ter essencialmente conceitual do �lbum. “As m�sicas se interligam, falam do Recife pobre, da periferia, dos bandidos lend�rios dos anos 1970, empregam manifesta��es da cultura popular pernambucana”, observa, chamando a aten��o para a faixa Maracatu de tiro certeiro, assinada por Chico e Jorge du Peixe.
A ent�o jovem banda pernambucana trouxe informa��es inovadoras, apontando novos rumos para a m�sica brasileira, ressalta. “Ela evoluiu muito do primeiro para o segundo �lbum. Chico Science & Na��o Zumbi provou que n�o era grupo de um disco s�. O seguinte, Afrociberdelia, foi ainda mais elogiado”, relembra Teles.
DA LAMA AO CAOS: QUE SOM �
ESSE QUE VEM DE PERNAMBUCO?
De Jos� Teles
Edi��es Sesc S�o Paulo
R$ 15 (e-book)
Esclareci de vez uma liga��o que se fantasiou de influ�ncia de Josu� de Castro sobre Chico Science, que foi praticamente nenhuma”
Jos� Teles, jornalista
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