Aos 89, Tony Tornado est� no cinema, na TV e quer manter sua 'fama de mau'

"Te digo que � a primeira vez que estou do outro lado, julgando. �s vezes, fico at� mal, porque s�o pessoas esfor�adas. Mas a gente tem que falar o que acha certo, sem passar a m�o na cabe�a de ningu�m. Dia 29, na final (do Popstar), estou l� pra tomar mais vaias se for o caso. Como diz o Erasmo Carlos, tenho que manter a minha fama de mau"

Aos 89 anos, Tony Tornado n�o quer saber de desacele- rar. Neste final de ano, o cantor e ator se desdobra entre diversos projetos. Foi num intervalo das filmagens de Juntos e enrolados, longa-metragem estrelado por Cacau Prot�sio e Rafael Portugal, que ele conversou com a reportagem do Estado de Minas. No filme, Tornado interpreta o pai da protagonista. Atualmente, ele pode ser visto tamb�m no elenco de Carcereiros – O filme. No pr�ximo dia 29, ele ser� um dos jurados da final do reality Popstar.

Mas � da participa��o em Juntos a magia acontece, especial que a Globo exibe nesta noite de Natal, que o ator fala com mais entusiasmo. Na trama, escrita por Cleissa Regina Martins e com dire��o art�stica de Maria de M�dicis, ele � Ant�nio, o melhor amigo de Orlando (Milton Gon�alves) e dono de uma loja de brinquedos no Mercad�o de Madureira, no Rio de Janeiro.

Todos os integrantes do elenco principal da atra��o s�o negros. “Isso realmente vai ser bem especial. Depois de tanto tempo na Globo, estamos realizando um sonho. Esperamos muitos anos por isso. Al�m de ser um programa de Natal, traz um Papai Noel negro e s� com gente talentosa: Zez� Motta, Camila Pitanga, Fabr�cio Boliveira, Luciano Quirino e o Milton Gon�alves, que dispensa coment�rios”, afirma.

Dividir as grava��es com Milton Gon�alves teve um sabor de recorda��o para Tony Tornado. “� sempre um prazer e uma emo��o contracenar com ele. O primeiro especial que fiz na Globo foi ao lado Milton, h� uns 40 anos – O homem do sangue azul. Ele � o nosso referencial por defender uma etnia, uma classe, e ainda � o funcion�rio nº 1 da Globo (Milton � o funcion�rio mais antigo da emissora). A gente segue os seus passos em todos os sentidos. Al�m disso, � uma figura de uma grande gentileza. Estou muito feliz de estar mais uma vez atuando com ele.”

Por falar em representatividade negra, Tony Tornado lamenta o fato de Cacau Prot�sio ter sofrido ataques racistas enquanto gravava cenas de Juntos e enrolados. Na hist�ria, ela interpreta uma sargento do Corpo de Bombeiros. Ap�s uma cena rodada no quartel central da corpora��o, no Rio, a atriz foi v�tima de ofensas de um bombeiro. “Foi uma coisa muito chata, lament�vel. Adoro a Cacau. J� t�nhamos feito outro filme juntos, Os farofeiros (2018). Ela n�o merecia passar por isso”, diz o ator que exalta o clima de coes�o desse projeto. Descontado esse epis�dio, Tony diz que “est� sendo divertido fazer (o filme). O elenco � muito unido, um clima maravilhoso. N�o fa�o muitas com�dias. Ent�o est� sendo muito bacana estar nesse longa.”

Realmente, embora tenha participado de muitos humor�sticos no passado, como Chico Anysio show (1976), Os Trapalh�es (1980), Balan�a mas n�o cai (1982) e Zorra (2015), Tony Tornado � mais lembrado por personagens sisudos, como Valdir, o agente penitenci�rio que interpreta em Carcereiros – tanto no filme como na s�rie. “Ele � um eterno prisioneiro. O meliante vai preso, cumpre a pena e vai em- bora. E isso n�o ocorre com os carcer eiros. Permanecem ali”, afirma.

Tanto no cinema quanto na TV, Tony e os demais atores contaram com a colabora��o e a assessoria de agentes do sistema prisional brasileiro. Ele comemora a boa repercuss�o dos dois formatos. “A s�rie e o longa s�o totalmente diferentes. Eu, particularmente, acho o filme mais emocionante. � tiro, porrada e bomba o tempo todo. Tem uma outra pegada”, comenta.

Outro personagem austero que ficou marcado em sua carreira � Greg�rio Fortunato (1900-1962), chefe da guarda pessoal do presidente Get�lio Vargas (1882-1954), que ele desempenhou com grande brilho na miniss�rie Agosto (1993). Tony, que serviu no Ex�rcito na juventude, chegou a conhecer o verdadeiro Anjo Negro. “Lembro-me daquele jeit�o do Greg�rio, ent�o acabei incorporando isso na minha interpreta��o. Ele tinha uma fidelidade canina ao presidente. Foi uma hist�ria bonita”, diz.

O artista se tornou conhecido do grande p�blico em 1970, quando venceu o 5º Festival Internacional da Can��o e sacudiu o Maracan�zinho com BR-3, m�sica concorrente de Ant�nio Adolfo e Tib�rio Gaspar. Para ele, todo cantor � um ator em potencial, por utilizar a mise-en-sc�ne e a express�o corporal no palco. “Na verdade, venci o festival mais pela coreografia. N�o me considero um bom cantor, mas um bom int�rprete. Cantor � Agnaldo Rayol, Agnaldo Tim�teo”, diz. Apesar de minimizar seu talento na m�sica, ele faz quest�o de transmitir tudo o que sabe do of�cio para o filho, Lincoln Tornado. “Ele canta e dan�a muito mais do que eu. E o que eu puder passar pra ele, vou fazer. Ele est� no caminho certo”, diz.

Justamente por seu know-how na m�sica, Tony Tornado afirma que n�o quis fazer m�dia, mas seguir sua consci�ncia quando topou ser jurado em um dos epis�dios de Popstar, competi��o que vai ao ar aos domingos, na Globo. A disputa se d� entre artistas que j� tenham o dom�nio e a paix�o pela m�sica, embora n�o fa�am dela sua profiss�o. Por dar notas baixas aos participantes, o ator e cantor chegou a ser chamado de carrasco nas redes sociais e comparado a Pedro de Lara, jurado do Programa Silvio Santos conhecido pela rigidez nas avalia��es.

“Nada daquilo foi programado. Fiz o que minha consci�ncia mandou. Todos continuam sendo meus amigos, meus colegas, s�o atores maravilhosos. Apesar de ser uma divers�o, m�sica � coisa s�ria”, afirma. Tony justifica o rigor por ter sido avaliado a vida inteira e diz que n�o � “de fazer tipo”.

“Minha trajet�ria musical � toda baseada em concurso. S� que acho que, naquela �poca, tudo era mais rigoroso. � a primeira vez que estou do outro lado, julgando. �s vezes, fico at� mal, porque s�o pessoas esfor�adas. Mas a gente tem que falar o que acha certo, sem passar a m�o na cabe�a de ningu�m. Dia 29, na final, estou l� para tomar mais vaias se for o caso. Como diz o Erasmo Carlos, tenho que manter a minha fama de mau (risos).”

Prestes a se tornar nonagen�rio, Tony Tornado diz que s� tem a agradecer por tudo o que viveu at� aqui, sobretudo na profiss�o. “S�o mais de 40 novelas, um monte de filmes. Coisas que me marcaram demais. Agrade�o muito. Tenho uma filosofia de vida: n�o existem pap�is pequenos. Fa�o todos e tenho a pretens�o de sempre faz�-los benfeitos. At� prefiro um mordomo benfeito a um conde mal feito. Levo tudo muito a s�rio.”

Quanto � boa forma f�sica e mental a esta altura da vida, ele acredita que isso possa ser explicado pela gen�tica, apesar de se considerar j� “meio alquebrado”. O pai, seu Ray Anthony Washington Peterson, um guianense de Georgetown, est� com 108 anos. “E, se Deus quiser, vai completar 109 no pr�ximo dia 27. Tamb�m quero chegar l� e trabalhando”, afirma.