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Estado de Minas

Estreia no Brasil o filme de Polanski que acumula pr�mios e pol�micas

'O oficial e o espi�o' reconstitui o mais rumoroso caso de persegui��o e injusti�a praticadas pelo Estado franc�s. Condena��o do diretor por estupro levantou onda de protesto ao filme


12/03/2020 04:00 - atualizado 11/03/2020 18:42

Jean Dujardin interpreta o coronel Georges Picquart (foto: Califórnia Filmes/Divulgação)
Jean Dujardin interpreta o coronel Georges Picquart (foto: Calif�rnia Filmes/Divulga��o)
Logo no in�cio de O oficial e o espi�o, o longa de Roman Polanski que estreia nesta quinta-feira (12) no Brasil, Alfred Dreyfus (Louis Garrel) confronta seu professor Georges Picquart (Jean Dujardin), o �nico que lhe destina notas baixas na Escola de Guerra. O aluno quer saber se a avalia��o desfavor�vel que Picquart faz de seu desempenho tem rela��o com os sentimentos antissemitas do professor.
 
Picquart n�o nega seu antissemitismo, mas assegura ao judeu Dreyfus ser capaz de fazer um julgamento de seus alunos isento da influ�ncia de suas convic��es sobre ra�a e religi�o. A cena final do longa colocar� novamente os dois homens frente a frente, num extraordin�rio di�logo que delineia o cerne da atitude de Dreyfus. Ele exige o que � justo. N�o quer nada al�m disso, mas tamb�m n�o aceitar� calado nada aqu�m.

Entre um di�logo e outro, Polanski reconstitui o hist�rico (e rumoros�ssimo) “Caso Dreyfus”, que dividiu a Fran�a na virada do s�culo 19 para o 20, ao trazer para a esfera p�blica um apaixonado debate em torno da imparcialidade – ou a corre��o de car�ter, que � o mesmo dito em outros termos – exigida para a aplica��o do devido processo legal. � a capacidade humana de fazer uma justi�a digna desse nome, na verdade, o tema de O oficial e o espi�o, no qual Polanski apenas d� a impress�o de falar sobre o passado, quando, na verdade, coloca o dedo numa ferida aberta do presente.
 
O fato de o diretor ter uma condena��o pelo crime de estupro de uma adolescente e ser acusado por outras mulheres de t�-las violentado, o que ele nega, colocou o pr�prio filme, o direito de Polanski faz�-lo e de ser premiado por isso em quest�o, desde sua estreia, no Festival de Veneza, no ano passado. Mas, antes de tratarmos da controv�rsia provocada pela exist�ncia do longa, vamos a ele.

Capit�o do Ex�rcito considerado brilhante, Dreyfus � acusado de espionagem e condenado, em 1895. Perde a sua patente e � degredado para a Ilha do Diabo, na Guiana Francesa, onde seus vigias s�o proibidos de lhe dirigir a palavra. O “espi�o” Dreyfus se torna um fantasma.

Georges Picquart, que havia tido um papel secund�rio na condena��o de Dreyfus, � promovido a coronel e assume a �rea de Intelig�ncia das For�as Armadas, onde passa a ter acesso a todos os arquivos confidenciais sobre suspeitos e processos de espionagem.

Por causa de sua nova fun��o, Picquart se d� conta de que Dreyfus � inocente e identifica o verdadeiro espi�o. A rea��o do coronel responde � l�gica da retid�o: ele informa aos seus superiores que o caso deve ser reaberto, que Dreyfus deve ser trazido de volta da Ilha do Diabo e submetido a novo julgamento, � luz dos fatos que incriminam outro oficial (n�o judeu) do Ex�rcito.

Louis Garrel vive o capitão judeu que é degredado para a Ilha do Diabo, na Guiana Francesa (foto: Califórnia Filmes/Divulgação)
Louis Garrel vive o capit�o judeu que � degredado para a Ilha do Diabo, na Guiana Francesa (foto: Calif�rnia Filmes/Divulga��o)
O comando das For�as Armadas, no entanto, prefere manter o caso encerrado e escantear Picquart, destinando-o a miss�es ora irrelevantes, ora perigos�ssimas, mas sempre distantes do centro do poder. Depois de um longo tempo aceitando a puni��o disfar�ada, o coronel parte para o contra-ataque.

O movimento que deslancha a reviravolta no “Caso Dreyfus” � a publica��o pelo escritor �mile Zola (1840-1902) da carta aberta ao presidente franc�s intitulada J'accuse (Eu acuso), t�tulo original do filme em franc�s. Ao expor toda a trama que julgou e condenou Dreyfus injustamente e seu vi�s antissemita, nomeando cada um dos envolvidos, Zola tamb�m se tornou alvo de um julgamento – e de uma condena��o – por difama��o. Passam-se anos at� que o processo de Dreyfus seja finalmente revisto.

Polanski narra essa hist�ria com a gram�tica de um cinema cl�ssico. � um filme de tribunal e de espionagem, recheado de flashbacks e subtramas. Para interpretar personagens cujas a��es representam motiva��es arquet�picas, como os desejos de justi�a e de vingan�a e as no��es de honra e covardia, o diretor escalou diversos atores da Com�die Fran�aise, experts, portanto, em dar espessura humana a esse tipo de papel.

Trata-se de um cuidado fundamental para que n�o assumam um tom caricato frases como a dita por um dos oficiais do Ex�rcito na cerim�nia de degrada��o de Dreyfus, acompanhada por um p�blico em f�ria: “Antes, os romanos atiravam os crist�os aos le�es. Agora, n�s mandamos os judeus. Veja que progresso!”.
 
A carta aberta de Émile Zola ao presidente da França é o texto histórico que provocou a reviravolta do caso (foto: Califórnia Filmes/Divulgação)
A carta aberta de �mile Zola ao presidente da Fran�a � o texto hist�rico que provocou a reviravolta do caso (foto: Calif�rnia Filmes/Divulga��o)
Elegante sem ser pomposo – Polanski chega a fazer figura��o em uma cena de divertimento mundano –, o filme tem um ritmo que n�o se deixa comprometer por suas mais de duas horas de dura��o (132 minutos) e � capaz de manter o espectador interessado, sem afund�-lo em excessos de informa��o. Ponto para o claro fio condutor da trama, que Polanski escreveu em parceria com o autor do livro no qual o filme se baseia, Robert Harris.

Quando O oficial e o espi�o estreou em competi��o pelo Le�o de Ouro em Veneza, a cineasta argentina Lucrecia Martel, presidente do j�ri, se recusou a comparecer � sess�o de gala, afirmando que n�o aplaudiria um homem condenado por estupro. Os produtores do longa protestaram e apontaram na atitude de Martel uma condena��o antecipada ao filme, sem dar a ele nem sequer o direito de julgamento.

No fim da disputa, o longa de Polanski recebeu o pr�mio da cr�tica e o Le�o de Prata (Grande Pr�mio do J�ri). Coringa, de Todd Philipps, ficou com o Le�o de Ouro. Com essa decis�o, Martel talvez tenha provado que, embora possa tomar caminhos sinuosos, a faculdade de julgar consegue se sobrepor �s paix�es. Mas isso requer coragem e intelig�ncia, atributos que a diretora argentina tem de sobra.

Um filme no banco dos r�us

Sucesso de p�blico na Fran�a, O oficial e o espi�o recebeu 12 indica��es ao pr�mio anual do cinema franc�s, o C�sar. Grupos feministas, sobretudo o Osez le Feminisme (Ouse o Feminismo), protestaram contra as indica��es e anunciaram que fariam atos no local da cerim�nia de entrega dos pr�mios, ocorrida no �ltimo dia 28.

Diante dessa rea��o, Polanski e sua equipe decidiram n�o comparecer. “Lamento tomar esta decis�o, de n�o enfrentar um tribunal de opini�o autoproclamado, disposto a pisotear os princ�pios do Estado de direito para que o irracional triunfe novamente”, disse Polanski, de 86 anos, em nota.

No comunicado, ele afirmou ainda: “Tenho que proteger minha fam�lia, minha mulher e meus filhos, que s�o submetidos a ofensas, afrontas”.

Quando da eclos�o da pol�mica,  Alain Terzian, presidente da Academia Francesa, respons�vel pela realiza��o do C�sar, afirmou que a premia��o “n�o deve adotar posi��es morais” e acrescentou: “Se eu n�o estiver equivocado, 1,5 milh�o de franceses assistiram ao filme”. Pouco depois, a intensidade das rea��es levou � queda da dire��o da Academia Francesa.

“A m�dia e as redes sociais apresentam nossas 12 indica��es como um presente da diretoria da Academia, um gesto autorit�rio que teria provocado sua demiss�o. Ignoram assim o voto secreto de 4.313 profissionais, que s�o os �nicos que decidem as indica��es, e os mais de 1,5 milh�o de espectadores que foram assistir ao filme na Fran�a”, afirmou Polanski.

O oficial e o espi�o obteve tr�s vit�rias no C�sar – melhor figurino, roteiro adaptado, e dire��o. Ao ser anunciado o pr�mio para Polanski, a atriz Ad�le Haenel (Retrato de uma jovem em chamas) se retirou da sala em protesto. Ela havia afirmado que o reconhecimento ao diretor equivaleria a “cuspir na cara das v�timas”.

Haenel, de 31 anos, denunciou no ano passado o diretor Christophe Ruggia de t�-la assediado de seus 12 aos 15 anos. Ela filmou com ele o longa Les diables, lan�ado em 2002, e afirma que ele praticou “ass�dio sexual permanente” com ela durante a rodagem e a divulga��o do filme pelo circuito de festivais.

Indicado a melhor ator e ausente da cerim�nia, Jean Dujardin, o int�rprete do coronel Picquart, escreveu em seu Instagram: “Ao fazer esse filme, eu acreditei, e eu ainda acredito, que fiz mais bem do que mal”. 
(Com ag�ncias de not�cias)


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