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Estado de Minas

Filme in�dito de Helv�cio Ratton � atropelado pelo coronav�rus

Baseado na obra de Murilo Rubi�o, longa come�ou a ser rodado h� exatamente um ano em BH. Cineasta diz que cultura j� estava sob ataque de outro v�rus


01/04/2020 04:00 - atualizado 01/04/2020 09:35

O cineasta Helvécio Ratton e os atores Eduardo Moreira e Renato Parara no set do longa-metragem O lodo, montado na Casa Mac, em Belo Horizonte, nesta época do ano, em 2019
O cineasta Helv�cio Ratton e os atores Eduardo Moreira e Renato Parara no set do longa-metragem O lodo, montado na Casa Mac, em Belo Horizonte, nesta �poca do ano, em 2019 (foto: Ed�sio Ferreira/EM/D.A.Press)

H� exatamente um ano, em 1º de abril de 2019, Helv�cio Ratton come�ava a filmar seu nono longa-metragem. Em um andar de um edif�cio comercial na Avenida Jo�o Pinheiro que pertenceu � construtora Mendes Jr., a equipe de O lodo rodou as primeiras sequ�ncias do filme, inspirado no conto hom�nimo de Murilo Rubi�o (1916-1991).

Ali, na Regi�o Central de Belo Horizonte, Eduardo Moreira, int�rprete de Manfredo, o protagonista da hist�ria, contracenou com Leri Faria, que fazia o papel do seu chefe em uma companhia de seguros. Homem absolutamente comum, Manfredo sofre de depress�o. Procura um psiquiatra, Dr. Pink (Renato Parara), que come�a a persegui-lo na vida real e tamb�m por meio de pesadelos. O m�dico diz que o loda�al que Manfredo tem dentro de si tem que ser removido. Para tal, ele deve remexer em seu passado.

Foram s� tr�s dias de filmagens. Naquela primeira semana, Faria passou mal, foi parar no hospital e acabou diagnosticado com um tumor cerebral – morreu em 28 de abril, aos 63 anos. Mesmo com esse in�cio turbulento e triste, a produ��o de O lodo continuou em frente. Faria foi substitu�do por outro veterano da cena mineira, M�rio C�sar Camargo.

Nas semanas seguintes, a produ��o percorreu v�rios lugares de Belo Horizonte: a Casa Mac, na Cidade Jardim, virou o consult�rio do Dr. Pink; o antigo Hotel Itatiaia, no Centro, foi a fachada da companhia de seguros; uma casa prestes a ser demolida no Gutierrez fez as vezes do apartamento de Manfredo. O clima kafkiano da narrativa foi traduzido em corredores estreitos, muitos planos interiores.

Em oito meses, O lodo ficou pronto, tanto que teve sua premi�re (hors-concours) em janeiro passado,na Mostra de Cinema de Tiradentes. Pelo planejamento, o filme deveria chegar aos cinemas em 3 de setembro, com distribui��o da Cineart. Mas, como tudo, O lodo foi atropelado pela pandemia do novo coronav�rus, como Ratton, de 70 anos, conta na entrevista a seguir.

''V�nhamos sofrendo de forma radical, desde o ano passado, esse sentimento de paralisa��o do setor. A pandemia veio acentuar ainda mais. Mas, na verdade, ela colocou nosso problema como o menor. Todos os problemas particulares e profissionais ficaram menores diante de uma crise deste tamanho''

Helv�cio Ratton, cineasta



Como voc� acha que o audiovisual vai sair desta pandemia?
O setor j� vinha sofrendo com outro v�rus, o do desprezo � cultura, da nega��o da arte. Quantos secret�rios da Cultura n�s j� tivemos? O audiovisual j� estava paralisado; o Fundo Setorial, bloqueado. Ent�o v�nhamos sofrendo de forma radical, desde o ano passado, esse sentimento de paralisa��o do setor. A pandemia veio acentuar ainda mais. Mas, na verdade, ela colocou nosso problema como o menor. Todos os problemas particulares e profissionais ficaram menores diante de uma crise deste tamanho.

Pessoalmente, h� uma frustra��o ao interromper o processo de lan�amento de um filme, n�o?
� �bvio que tem uma frustra��o grande ao paralisar um processo, pois est�vamos criando, propondo coisas nele. Eu, particularmente, estou voltando minhas energias para um roteiro em que estou trabalhando. E estou repensando a atividade. Sinto que as coisas est�o mudando muito, e v�o mudar ainda mais. Este per�odo de isolamento social que estamos vivendo leva a uma mudan�a h�bitos. A gente j� vinha sentindo muito a diminui��o de frequ�ncia nas salas de cinema e o crescimento do streaming, do v�deo sob demanda. De novo (p�s- pandemia) vai ter uma nova acomoda��o da atividade cinematogr�fica em todos os pontos, desde a produ��o at� a exibi��o. N�o acho que depois ser� como antes. Dever� haver uma modifica��o.

O lodo teve uma exibi��o durante a Mostra de Cinema de Tiradentes. Por que voc� quis lan��-lo dessa maneira?
Por dois motivos. Em primeiro lugar, para refor�ar a Mostra, no momento em que a gente sentia a retirada de apoio aos festivais. Era um pouco para defender e mostrar a import�ncia que os festivais t�m para o cinema. Ao mesmo tempo, O lodo � muito original, um filme diferente de todos que j� fiz. Ent�o foi interessante fazer uma sess�o preview e ver a rea��o do p�blico. E foram mais de 700 pessoas na tenda. Foi um �timo primeiro passo para o filme.

Como voc� chegou ao universo de Murilo Rubi�o?
H� alguns anos, a Silvia Rubi�o, sobrinha do Murilo, nos procurou (a Quimera Filmes, produtora de Ratton) propondo que trabalh�ssemos na obra dele. Eu j� admirava v�rios contos, mas n�o conhecia toda a obra. A obra do Rubi�o tem 33 contos, que ele reescreveu a vida inteira. Mergulhei na obra e trabalhei em um projeto de s�rie, com 15 roteiros, que j� est�o escritos e aguardando uma boa oportunidade para ser produzidos. A dificuldade de uma s�rie como essa � que cada epis�dio tem uma mudan�a de loca��o e de personagens, o que encarece muito. Uma s�rie se barateia porque personagens e loca��es se repetem. E no caso do Murilo, cada conto � uma hist�ria diferente. Mas acredito que a s�rie tenha viabilidade, espero que O lodo possa nos ajudar nisso.

''A gente j� vinha sentindo muito a diminui��o de frequ�ncia nas salas de cinema e o crescimento do streaming, do v�deo sob demanda. De novo (p�s-pandemia) vai ter uma nova acomoda��o da atividade cinematogr�fica em todos os pontos, desde a produ��o at� a exibi��o. N�o acho que depois ser� como antes. Dever� haver uma modifica��o''

Helv�cio Ratton, cineasta




O que lhe interessou no conto O lodo?
� um conto muito pouco comentado, n�o � dos mais conhecidos. E o fato de que pouca gente conhece me interessou mais ainda. Ele tem um humor negro muito interessante, que atravessa toda a hist�ria. Um psiquiatra que fica perseguindo seu cliente, isso mexe com as fantasias do cliente. E coloca isso no plano do real, fazendo um retorno ao passado (do personagem), me interessou muito.

Manfredo � o primeiro protagonista de Eduardo Moreira no cinema. Ele foi o primeiro nome que voc� pensou para o papel?
Desde sempre. O Eduardo tinha trabalhado no Batismo de sangue (2006). Gostei muito da forma de    ele interpretar no cinema. Sempre vi o Manfredo como o Eduardo. A partir dele, fui desenhando os outros. Foi a primeira vez em que trabalhei s� com atores mineiros. Foram leituras com v�rios atores, fui fazendo a sele��o, at� escolher o Galp�o como o n�cleo em que eu poderia trabalhar (al�m de Moreira, o elenco conta com In�s Peixoto, Paulo Andr�, Fernanda Vianna, Teuda Bara e Ant�nio Edson).  O fato de ser um filme que transita entre o absurdo e o fant�stico tinha que ter uma interpreta��o muito afinada. � tudo muito sutil, pois, para o absurdo funcionar dentro do realismo, tem que ter uma afina��o grande de tom.

Entre filmagem e premi�re O lodo levou oito meses, um per�odo bastante curto. Por outro lado, � seu primeiro longa-metragem em seis anos. Como voc� lida com o tempo do cinema?
Quando as coisas v�o bem, o tempo de um filme, entre voc� ter a ideia e coloc�-lo na tela, � de tr�s a quatro anos. Isso mundialmente. Depois de O segredo dos diamantes (2014), fiz v�rias coisas. Fizemos um n�cleo criativo (na Quimera Filmes) que trabalhou em cinco projetos diferentes, como uma s�rie de anima��o e uma de fic��o. Em paralelo, fiz o roteiro de O lodo, em primeiro lugar sozinho e depois com o L. G. Bay�o, que tinha trabalhado comigo no filme anterior e hoje est� na Globo. Ent�o, se voc� somar essa dist�ncia entre um filme e outro, foi um bom tempo de cria��o. O lodo foi r�pido para fazer, pois ganhamos um edital da Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (Codemge), mas fomos atropelados, de uma forma brutal, pela paralisa��o da Ag�ncia Nacional do Cinema (Ancine) na v�spera de filmar. Percebemos que o �nico caminho era seguir em frente pois, se paralisasse, este filme teria se perdido.

Em longas, voc� j� rodou produ��es infantojuvenis, document�rios, drama, romances. Nunca se ateve a um s� g�nero. O que lhe interessa no cinema?
Sempre a narrativa. Sou apaixonado por construir uma narrativa visual, a quest�o do g�nero n�o me importa muito. Sempre quero ir para um lugar onde n�o estive, ter o desafio.


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