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Estado de Minas QUARENTENA CRIATIVA

Paulo Eduardo, produtor de Djonga, pesquisa a arte das ruas de BH

Jovem mineiro aproveita os dias de isolamento para refletir sobre a contribui��o de sua gera��o para a cena cultural de Belo Horizonte. Drummond e Fernando Sabino s�o inspira��es para ele


postado em 04/05/2020 04:00

Paulo Eduardo destaca a inspiração vinda das ruas, hoje proibidas, tanto para o rap quanto para a poesia de Carlos Drummond(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
Paulo Eduardo destaca a inspira��o vinda das ruas, hoje proibidas, tanto para o rap quanto para a poesia de Carlos Drummond (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)

 

 O mineiro Djonga � um dos grandes do rap nacional – s� o novo disco dele, Hist�rias da minha �rea, bateu 55 milh�es de streamings um m�s depois de chegar �s plataformas digitais, em 13 de mar�o. Desde sempre, Paulo Eduardo Neves Correa, o Paul�o, de 25 anos, � “linha de frente” do staff de Gustavo, seu amigo de inf�ncia. Coordena a equipe de shows, cuida das viagens, da log�stica, do backstage.

 

O coronav�rus impediu o in�cio da nova turn� de Djonga. N�o tem show, mas Paul�o est� a mil. Nesta quarentena, ele se dedica a pesquisar a cultura produzida por sua gera��o, a contribui��o de jovens como ele para a arte de BH. O produtor faz parte da turma (Djonga, FBC, DV Tribo, Duelo de MCs, Coyote Beatz, Hot & Oreia e Clara Lima, entre outros) considerada o “bra�o” do rap na ampla – e complexa – cena que fez da capital mineira um polos culturais mais vigorosos do pa�s.

 

Essa gera��o est� ligada ao renascimento do carnaval de rua, ao movimento Praia da Esta��o e �s ocupa��es urbanas, diz Paulo. Tudo isso se refletiu nas artes c�nicas e visuais, na literatura, na m�sica e no cinema mineiros

 

“A pergunta que me fa�o �: como a gente chegou at� aqui? Como o rap de BH chegou aonde chegou?”, questiona. De 2013 a 2017, o jovem produtor cursou ci�ncias do estado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). N�o se formou, assim como Djonga, que estudou hist�ria, mas trouxe da academia ferramentas para suas reflex�es.

 

Aluno do ensino p�blico – estudou no Escola Estadual Bueno Brand�o, no Instituto de Educa��o e na Escola Estadual Pedro II –, Paul�o l� desde crian�a. Filho da bibliotec�ria Idalina e do advogado Marcelo, costumava desenhar as pr�prias HQs quando o dinheiro para os brinquedos rareava. Aos 16, gostava de heavy metal. Novinho, encantou-se pelos rol�s realizados por poetas e m�sicos nas ruas de BH. Lembra-se do Gra�a na Pra�a, na Boa Viagem, do Rapa do Papa, no Alto das Mangabeiras.

 

F� de Fernando Pessoa, Carlos Drummond e Augusto dos Anjos, quando surgiu o Sarau Vira Lata Paul�o estava l�, assim como os rappers Djonga, FBC, Hot, Oreia e Kdu dos Anjos, todos garotos. Hoje, acredita que a literatura � uma das ra�zes do hip-hop peculiar de BH. A turma do sarau de poesia sempre teve gosto pela palavra. “Eu ficava dias escrevendo em casa, quebrando a cabe�a, antes de ler os versos na rua”, conta Paul�o.

 

Nesta quarentena cumprida � risca (aceitou sair rapidamente de casa para ser fotografado pelo EM), Paulo “devora” o romance O encontro marcado, de Fernando Sabino, sobre as ang�stias dos jovens na BH dos anos 1940. Outro na lista dele � O desatino da rapaziada, livro do jornalista Humberto Werneck sobre os escritores da cidade, com destaque para os modernistas.

 

VIADUTO Os dois livros t�m como “personagem” o Viaduto de Santa Tereza. Neste s�culo 21, rappers fazem hist�ria debaixo dos mesmos arcos escalados pelo jovem Drummond nos anos 1920. Nas madrugadas, Fernando Sabino e amigos “puxavam ang�stia” por l�, observando as �guas do Arrudas, agora canalizadas.

 

“Nos dias de hoje, os �nicos alpinistas urbanos a escalar os arcos s�o os pichadores, que n�o perdoaram nem a fachada da tradicional Serraria Souza Pinto. O que aconteceu com os grandes autores e poetas que, regados de inspira��o, ang�stia e doses de chope, escalaram os grandes arcos? Onde se encontram os grandes alpinistas contempor�neos? Para localiz�-los, talvez n�s n�o devamos procurar no topo, e sim nas bases do viaduto”, observa. “O poeta das alturas � o pichador”, resume.

 

Rap � literatura? “Se n�o for, cumpre essa fun��o com maestria”, diz. “O 'puxar ang�stia' de Fernando Sabino sai do gramado esverdeado da Pra�a da Liberdade e vai para o ch�o cinzento de concreto”, compara Paulo, referindo-se ao pilotis do viaduto, na Rua Aar�o Reis, onde a garotada acompanha o Duelo de MCs.

 

Em suas reflex�es, Paulo Eduardo conecta a arte de sua gera��o a experi�ncias marcantes vividas por ela: as Jornadas de Junho de 2013 (“at� hoje pouco compreendidas”, diz); a hiperconex�o do mundo via internet; a pol�tica de cotas, que buscou reduzir a desigualdade social e confrontar o racismo; a for�a das pautas identit�rias em defesa da minorias.

 

“No �pice da globaliza��o, vem essa pandemia. Ela � a materializa��o da ang�stia”, observa Paul�o, citando o verso “E agora, Jos�?”, do poema de Drummond. A pesquisa ainda est� no in�cio, mas de uma coisa ele j� tem certeza: o “sentimento do mundo” de sua gera��o – sobretudo dos jovens negros e da periferia – pode ser sintetizado em um verbo: ocupar. E as ruas (hoje proibidas) s�o o palco da poesia.


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