
As perspectivas neste momento n�o s�o boas e as alternativas, tampouco. Fechados h� tr�s meses, desde o in�cio do per�odo de isolamento social em decorr�ncia da pandemia do novo coronav�rus, os restaurantes t�m duas op��es: render-se ao delivery ou ficar sem servir prato algum. O bairro de Lourdes, que concentra um grande n�mero das melhores casas de Belo Horizonte, j� contabiliza baixas definitivas.
Criado h� seis anos, o Alma Chef, empreendimento gastron�mico ousado, misto de restaurante, espa�o para eventos e escola de gastronomia, fechou suas portas na Rua Curitiba, definitivamente. A marca continua existindo, mas o espa�o f�sico n�o mais. Um dos mais conhecidos restaurantes da capital mineira, o A Favorita, que h� 22 anos ocupa im�vel na Rua Santa Catarina, est� com o futuro incerto.
Considerado o melhor franc�s da cidade, o Taste Vin, tamb�m na Rua Curitiba, em casa que ocupa h� 32 anos, est� apenas com a loja de vinhos em funcionamento (com atendimento virtual). J� o Vecchio Sogno (n�o em Lourdes, mas no vizinho Santo Agostinho), que tem � frente o reconhecido chef Ivo Faria, se rendeu �s entregas, assim como o D’Artagnan Bistr�. Para tal, adapta��es tiveram que ser feitas.
''Fiz um card�pio menor, mais objetivo, escolhendo os pratos com melhor �ndice de satisfa��o. Em casa, n�o tem jeito, � diferente. Se voc� mora no Belvedere, no frio que est�, talvez o prato n�o chegue na temperatura que gosta. Ent�o, fazemos em embalagens para aquecer no forno e no micro-ondas''
Ivo Faria, chef do Vecchio Sogno
GATO E RATO
Com 50 anos de cozinha, Ivo Faria admite que nunca viveu uma dificuldade como esta. “N�o tem nem d�vida, n�o sei o que vai acontecer depois. Se o pa�s todo estivesse com a mesma postura, mas hoje h� cidade que abre, outra que n�o abre. At� quando vamos brincar de gato e rato? N�o adianta Belo Horizonte fechar, se Nova Lima n�o fecha, por exemplo. N�o consigo ver futuro.”Faria ainda tem que conviver com os boatos. Um deles dizia que o im�vel do Vecchio Sogno estava fechado. “Todo dia tem boato novo.” O restaurante ficou sem atividade por quase dois meses. Sua cozinha reabriu em maio para entrega (de sexta a domingo). “Fiz um card�pio menor, mais objetivo, escolhendo os pratos com melhor �ndice de satisfa��o. Em casa, n�o tem jeito, � diferente. Se voc� mora no Belvedere, no frio que est�, talvez o prato n�o chegue na temperatura que gosta. Ent�o fazemos em embalagens para aquecer no forno e no micro-ondas.”
Ele tamb�m come�ou a atender a empresas. “E fa�o um kit para um grupo de 30, 40, at� 200 pessoas (respeitado o distanciamento social). Envio e, mais tarde, fa�o uma live junto com cada pessoa (para finalizar o prato)”. Por ora, tais iniciativas atendem apenas a grupos de empresas. Ele tem sob encomenda um evento para 300 pessoas (cada qual em sua casa, sempre). Al�m da live, a noite vai contar com show de uma banda.
Para o p�blico em geral, Ivo Faria tem transmitido lives via Instagram – sempre �s ter�as e quintas-feiras – ensinando pratos de seu restaurante. Nesta semana, o encontro on-line � dedicado ao nhoque. “Isto tem um retorno muito bom, porque voc� mant�m viva sua marca, seu nome”, comenta.
Entre as alternativas virtuais, o chef est� iniciando um projeto de consultoria e tamb�m um curso on-line. “Profissionalizante mesmo, para aqueles que n�o t�m condi��es de ir � escola e podem estudar a dist�ncia.”
''N�o tem perspectiva alguma, pois n�o h� como planejar em cima de um pr�dio de areia, num pa�s com um abismo social como o Brasil''
Felipe Rameh, chef do Alma Chef
PRATO FEITO
Tamb�m atendendo para entrega de quinta a domingo, o D’Artagnan Bistr�, h� 19 anos em uma casa em Lourdes, fez v�rias adapta��es no card�pio. Criou inclusive o PF de Bistr�, com op��es de comida caseira (como moqueca de dourado, carne de sol e frango com requeij�o) a pre�os mais acess�veis. “O delivery vem crescendo, mas � um paliativo, pois corresponde a cerca de 30% do movimento normal”, comenta a chef Marise Rache.Pratos conhecidos do D’Artagnan continuam sendo entregues, como o camar�o com requeij�o e arroz de coco e os escalopes de filet au poivre com tagliatelle. “Nos fins de semana, s�o os cl�ssicos os mais pedidos, e eles funcionam na quentinha. Existe condi��o de a comida de qualidade se sair bem no delivery”, avalia a chef.
A crise econ�mica e os temporais do in�cio deste ano – que destru�ram uma parte do bairro de Lourdes, fazendo com que v�rios empreendimentos ficassem temporariamente sem funcionar –, j� contribu�ram para o fechamento de outras casas da regi�o.
Do ano passado para este, e antes da pandemia, encerraram suas atividades os seguintes restaurantes de Lourdes: L’Entrec�te de Paris, L’Entrec�te Bistr�, Mon Caviste, Gomide e Mes Amis. At� o tradicional�ssimo chin�s Yun Ton, que ocupava h� 50 anos uma casa na Rua Santa Catarina, deixou a regi�o – h� um m�s est� atendendo via delivery, em um endere�o no bairro Santo Ant�nio.
“N�o tem perspectiva alguma, pois n�o h� como planejar em cima de um pr�dio de areia, num pa�s com um abismo social como o Brasil”, afirma o chef Felipe Rameh, um dos nomes � frente do Alma Chef.
Nos �ltimos meses o restaurante trabalhou com delivery e lives, at� decidir fechar as portas, em meados de junho. Os s�cios tentam agora vender o neg�cio completo. “Se era dif�cil fechar a conta (de um restaurante) em condi��es normais, imagina num momento como este”, afirma Rameh, que se diz bastante pessimista quanto ao futuro do setor.
“Amigos chefs que admiro e em quem confio no Rio de Janeiro j� decidiram que, no ano que vem, n�o abrir�o seus restaurantes. N�o basta abrir, h� a quest�o do grupo de risco. Mesmo quem n�o �, tem uma av� ou algu�m da fam�lia que �. As pessoas v�o preferir ficar em casa. Paralelamente a isso, tem a recess�o econ�mica.”
Se como espa�o f�sico o Alma Chef n�o existe mais, a marca continua existindo. “O Alma Chef pode voltar como uma plataforma digital, delivery, pode ser um monte de coisas. Qualquer coisa hoje em dia no mundo sem um prop�sito perdeu o sentido. N�o existem mais empreendedores que s� pensam no umbigo e na conta banc�ria. Acho que, mais do nunca, a cozinha do futuro vai ser com o seu entorno. E os restaurantes v�o ter que se tornar mais transparentes em toda a cadeia, desde onde vem o alimento, como ele � executado, at� a pr�pria cozinha.”
''Teria que lan�ar um leque de pratos diferentes, fazer adequa��es, promo��o, adquirir material para transporte, ent�o achei que n�o era vi�vel, o melhor a fazer era aguarda''
Rodrigo Fonseca, chef do Taste Vin
RELAX
''Teria que lan�ar um leque de pratos diferentes, fazer adequa��es, promo��o, adquirir material para transporte, ent�o achei que n�o era vi�vel, o melhor a fazer era aguarda''
Rodrigo Fonseca, chef do Taste Vin
Mesmo com a mudan�a de h�bitos que a pandemia exige da popula��o – alguns deles dever�o permanecer quando a situa��o se normalizar –, h� coisas imut�veis. � nisso que acredita o chef Rodrigo Fonseca, do Taste Vin. “Vamos passar por um per�odo longo at� que as pessoas voltem a frequentar de maneira relaxada um local p�blico. Mas n�o queremos mudar o essencial no restaurante: um ambiente descontra�do ao qual as pessoas v�o relaxar, comer uma comida bem preparada, com um servi�o atencioso, o charme do Taste Vin.”
Fonseca admite que pela primeira vez, em mais de 30 anos, est� operando no vermelho. “Nunca tivemos preju�zo, desde que abrimos. Agora, estamos acumulando preju�zo.” Ele comenta que logo em mar�o, com o fechamento dos restaurantes, chegou a pensar no delivery.
Seu carro-chefe, o sufl�, obviamente estaria fora de quest�o. “Tenho alguns pratos adapt�veis, mas v�rios outros que n�o. Teria que lan�ar um leque de pratos diferentes, fazer adequa��es, promo��o, adquirir material para transporte, ent�o achei que n�o era vi�vel, o melhor a fazer era aguardar.”
S� que o tempo de espera est� sendo muito maior do que o imaginado no in�cio da quarentena. “� uma situa��o bastante angustiante, principalmente para os funcion�rios, que tiveram redu��o expressiva no sal�rio e t�m fam�lia, filho, presta��o de casa”, diz Fonseca.
Para tentar gerar caixa, o Taste Vin est� movimentando sua loja de vinhos (com 850 r�tulos, com bastante estoque, de v�rios pa�ses, e valores que v�o de R$ 77 a R$ 9 mil), que muitos clientes desconheciam existir. O contato � feito diretamente com o sommelier da casa, D�nis Marconi, a partir do Instagram.
O vinho pode ser entregue em casa ou o interessado pode busc�-lo no restaurante. “As pessoas est�o bebendo mais e aderindo aos vinhos mais baratos, mas de qualidade”, comenta. Os mais caros, Marconi admite, n�o t�m tido procura.
''O delivery vem crescendo, mas � um paliativo, pois corresponde a cerca de 30% do movimento normal''
Marise Rache, chef do D'Artagnan