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Estado de Minas LITERATURA

Romance 'Solu��o de dois estados', de Michel Laub, chega �s livrarias

Hist�ria conta a vida de dois irm�os que cresceram juntos, mas seguiram trajet�rias diferentes, atravessando temas que dividem a sociedade brasileira


14/10/2020 04:00

O escritor Michel Laub afirma que %u201Ca dimensão da análise política é pública, você precisa trabalhar com dados mais ou menos objetivos. Na literatura, você tem a liberdade de ir além disso%u201D
O escritor Michel Laub afirma que %u201Ca dimens�o da an�lise pol�tica � p�blica, voc� precisa trabalhar com dados mais ou menos objetivos. Na literatura, voc� tem a liberdade de ir al�m disso%u201D (foto: Renato Parada/Divulga��o)

O escritor ga�cho Michel Laub aproveitou os primeiros meses da quarentena imposta pelo coronav�rus para acertar os detalhes finais do seu novo romance, Solu��o de dois estados, agora dispon�vel nas livrarias. Como o presente da trama se passa em 2018, a doen�a ainda n�o aparece, mas o livro se soma a produ��es recentes da literatura brasileira contempor�nea que come�am a explorar as transforma��es sociais e pol�ticas resultantes na elei��o daquele ano.

Sempre preocupado com a linguagem dos seus escritos, o autor conta aqui a hist�ria de dois irm�os, Raquel e Alexandre, criados em S�o Paulo sob o mesmo teto, mas cujas trajet�rias e escolhas na vida se afastam quase que diametralmente. Raquel, v�tima de bullying desde pequena por causa do seu corpo, tem tend�ncias art�sticas e vai buscar na vida no exterior ferramentas para lidar com os traumas do passado. Alexandre fica com a m�e, e passa a ditar a pr�pria vida sob a �gide da meritocracia, reproduzindo o liberalismo � brasileira.

No ano da elei��o, Raquel, convidada em um evento patrocinado por um banco, sofre uma agress�o f�sica no palco do debate, e as incertezas que rondam o incidente funcionam como fio condutor do livro."O processo todo demorou mais do que eu esperava. Ent�o, o que era uma hist�ria futurista (eu n�o tinha ideia de que o Bolsonaro iria ganhar a elei��o, por exemplo) acabou virando uma esp�cie de romance hist�rico recente (que se passa num mundo pr�-quarentena)", explica Laub sobre seu oitavo romance, publicado tamb�m pela Companhia das Letras. 

"Mas as quest�es trazidas pelos personagens independem desses marcos. Eu queria escrever sobre perd�o, perguntar se � poss�vel conciliar vis�es de mundo t�o opostas em temas como sexo, religi�o, identidade, responsabilidade individual. S�o essas vis�es que dividem de fato a sociedade brasileira, isso vai al�m do notici�rio do momento."

Solu��o de dois estados � narrado em primeira pessoa pelos personagens, que falam para uma documentarista alem� sobre o incidente – alinhavando assim uma costura das preocupa��es nacionais com o contexto internacional, outra explora��o interessante do romance. 

Na entrevista a seguir, o escritor fala sobre seu oitavo romance, o primeiro desde 2016, ano em que lan�ou O tribunal da quinta-feira, finalista do Pr�mio Jabuti no ano seguinte. (Ag�ncia Estado)

''A vida piorou muito nos �ltimos anos por causa de crise econ�mica, barb�rie pol�tica. Espero que o trauma da quarentena n�o se some a essa desumaniza��o progressiva''

Michel Laub, escritor



Voc� fez algum tipo de pesquisa espec�fica para a elabora��o dos dois personagens do livro?
Fiz um pouco. Boa parte do livro se passa em universos distantes do meu. Li a respeito e conversei com pessoas que conhecem bem a periferia de S�o Paulo, a rotina das academias de gin�stica, o meio das artes visuais. Mas tomei algumas liberdades na descri��o desses ambientes, considerando que vale aquilo que os narradores dizem, de acordo com o estado emocional e os interesses de cada um enquanto est� dizendo. O barato de escrever fic��o � este: botar-se na cabe�a de tipos diferentes de voc�. � preciso pensar como esses tipos, falar como eles, � uma forma de entender o que eles representam. Se algo soa absurdo para o leitor, para esses personagens pode ser a verdade absoluta.

Em O tribunal da quinta-feira, voc� explorava o vazamento de mensagens privadas, e aqui decide colocar os personagens em comunica��o direta com o "exterior", frente a uma c�mera. O que muda no tipo de discurso que voc� quis empreender?
Sim, foi uma preocupa��o inicial: n�o voltar a fazer um livro sobre a din�mica das redes sociais. � claro que isso vai aparecer uma hora ou outra, porque n�o h� como escrever uma hist�ria contempor�nea sem passar por essa dimens�o. Mas eu quis falar de coisas mais concretas do que um personagem humilhado virtualmente. De certo modo, � um agravamento daquilo que ocorre no Tribunal. O Solu��o fala de viol�ncia concreta, de uma barb�rie pol�tica da qual voc� n�o escapa mais desligando o celular.

Personagens "bolsonaristas" come�am a aparecer na literatura brasileira, e embora o Alexandre n�o fale isso explicitamente, o contexto � claro. Voc� acha que imaginar e fazer literatura a partir desse ponto de vista pode ajudar a preencher os espa�os que a an�lise pol�tica de anos anteriores praticamente ignorou?
A dimens�o da an�lise pol�tica � p�blica, voc� precisa trabalhar com dados mais ou menos objetivos. Na literatura, voc� tem a liberdade de ir al�m disso, tentar ver o que se esconde em n�veis mais �ntimos, amb�guos. O bolsonarismo tamb�m � essa subjetividade: uma linguagem, um modo de vida, uma escolha de valores que se quer afirmar. O Solu��o tenta captar isso e o oposto disso, por contraste ou eventual semelhan�a, porque a barb�rie surge tamb�m daquela hist�ria particular, irreproduz�vel em outro contexto que n�o o daqueles irm�os, daquela fam�lia. Ent�o, nesse sentido ao menos, � uma vis�o do problema que voc� s� vai encontrar nesse livro.

Como tem sido a quest�o profissional para voc� nestes �ltimos seis meses?
Vivo uma quarentena de classe m�dia, ent�o tenho o privil�gio material. Isso se estende ao trabalho, claro. Mas, psicologicamente, passo pelos mesmos altos e baixos de todo mundo. A dimens�o desse estrago a gente s� vai ter no futuro, inclusive dentro da produ��o art�stica em geral. A vida piorou muito nos �ltimos anos por causa de crise econ�mica, barb�rie pol�tica. Espero que o trauma da quarentena n�o se some a essa desumaniza��o progressiva.

Como � que voc� tem se sentido, enquanto escritor de fic��o, no Brasil de 2018 para c�?
Por um lado, a fic��o parece ter cada vez menos espa�o, falta tempo e disposi��o para se dedicar a ela. Por outro, � na arte que a gente vai achar o registro mais rico da sensibilidade da nossa �poca. Se algo pode mudar no futuro, nem que seja na consci�ncia de cada um, � partindo da�. Os �ltimos anos foram terr�veis nessa �rea, n�o h� d�vida, mas pelo menos uma coisa foi interessante: todo mundo descobriu que a cultura � que determina a disputa pol�tica, e n�o o contr�rio. Nos anos 1990, o debate p�blico era pautado por economistas tecnocratas, cujo horizonte m�ximo eram n�meros que fechavam as contas p�blicas e coisas assim. Hoje, temos uma guerra de valores bem mais ampla, que passa pelo que se diz na arte, na educa��o, existe todo um debate sobre quem somos de verdade, o que queremos como pa�s. Quem trabalha com cultura precisa abra�ar essa briga. O desfecho do Solu��o traz essa ideia. Dentro do poss�vel, eu a considero uma forma de otimismo.

''Hoje, temos uma guerra de valores bem mais ampla, que passa pelo que se diz na arte, na educa��o, existe todo um debate sobre quem somos de verdade, o que queremos como pa�s''

Michel Laub, escritor



(foto: Amazon/Reprodu��o)


SOLU��O DE DOIS ESTADOS
• Michel Laub
• Companhia das Letras (248 p�gs.)
• R$ 49,90 
• R$ 29,90 (e-book)


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