
Para o pesquisador e escritor M�rio Alves Coutinho, Godard “excita” a cultura ocidental. “Nos filmes, ele fala sobre literatura, m�sica e artes pl�sticas. � um artista que faz cultura frequentando v�rias artes. Ali�s, ele pintou no in�cio da vida, a m�e dele at� chegou a fazer uma exposi��o dos quadros. Descobriu o cinema por volta dos 18 anos a despeito da pr�pria fam�lia, que desprezava a s�tima arte. Ao assistir �s com�dias italianas, percebeu que o cinema � um resumo de todas as outras artes”, explica.
LAN�AMENTO
Autor de outras tr�s obras sobre o diretor, al�m de numerosos ensaios, Coutinho lan�a agora Jean-Luc Godard: de Acossado a Imagem e Palavra (Tipografia Musical). No livro, elege e discorre sobre 14 dos principais filmes do franc�s, entre eles Acossado (1960), a estreia do cineasta, e longas recentes como Adeus � linguagem (2014) e Imagem e palavra (2018), passando ainda por O desprezo (1963), Alphaville (1965), O dem�nio das onze horas (1965) e Hist�ria(s) do cinema (1988).
“� um livro diferente, afastado das interpreta��es acad�micas que tentam aproximar a obra de Godard de filosofias e outras �reas do conhecimento. Meu livro fala dos filmes a partir de um recorte m�nimo diante da quantidade de obras que j� fez. D� conta de 10% da produ��o dele, mas eu n�o poderia deixar de lan��-lo no ano de uma efem�ride t�o importante”, comenta o autor e pesquisador.
Graduado em psicologia, doutor em literatura comparada pela UFMG com p�s-doutorado no Departamento de Comunica��o Social da mesma universidade, M�rio Alves Coutinho escreveu Godard e a educa��o (Aut�ntica, 2013), Godard, cinema, literatura (Cris�lida Editora, 2013) e Escrever com a c�mera: a literatura cinematogr�fica de Jean-Luc Godard (Cris�lida Editora, 2010).
Neles, o autor analisa a rela��o do cinema do franc�s com a literatura. No novo livro, o foco s�o os filmes por si. A publica��o levou cerca de seis meses para ficar pronta e M�rio a considera uma homenagem digna ao cineasta cuja obra � incontest�vel.
“O cinema moderno, em termos formais, � todo influenciado por Godard. Ele fez filmes que depois foram largamente copiados. Sem ele, talvez n�o existiria o Cinema Novo. O que quero dizer com isso � que a obra dele � muito importante para a hist�ria do cinema”, afirma M�rio Alves Coutinho.
Jean-Luc Godard desperta tanta aten��o n�o s� por ser pessoa pol�mica, sem papas na l�ngua, mas por n�o ter medo de errar, acredita. “Ele descobre o que vai fazer, fazendo. O resultado disso � muito improvisa��o, sem medo de arriscar e tentar novas maneiras de filmar. Isso est� presente tanto nos filmes como nos livros e nos textos que publicou.”
Tal caracter�stica est� t�o presente na trajet�ria de Godard que se transformou em muni��o para os detratores. “Existem pessoas que detestam a obra dele, acham que n�o � cinema, o consideram um chato incompreens�vel. At� compreendo a cr�tica, mas isso corrobora com o pr�prio prop�sito dos filmes que ele produz. Eles n�o foram feitos para agradar, s�o mais uma provoca��o, tanto em termos formais quanto em rela��o � narrativa”, acrescenta Coutinho.
A cinematografia de Jean-Luc Godard � prato cheio para compreender os s�culos 20 e 21, defende o autor. O pr�prio Hist�ria(s) do cinema percorre uma enormidade de refer�ncias e c�nones para, ao longo de quatro horas e meia, comprovar que n�o existe uma �nica hist�ria do cinema. O filme � um projeto que foi sendo feito ao longo de uma d�cada. L� tamb�m est� a hist�ria da filosofia, da literatura, da poesia, da pol�tica. Est� tudo interligado. Como um poeta, ele consegue resumir tudo isso num filme”, afirma.

PRECONCEITO
O segredo para assistir aos filmes do cineasta franc�s, aconselha, � a falta de pretens�es. “N�o existe f�rmula, mas � preciso n�o ter preconceitos e estar dispon�vel ao que ele tem para mostrar”, diz Coutinho, citando O dem�nio das onze horas e O desprezo como porta de entrada para a obra de Godard.Em rela��o ao novo livro, como bom cr�tico, ele afirma que espera que as pessoas primeiro assistam aos filmes para depois lerem seus textos. “Assim elas podem fazer as pr�prias descobertas e ter uma experi�ncia pessoal. Ler sobre Godard � da maior import�ncia, mas ir direto � fonte, compreender os maneirismos e influ�ncias desse cineasta revolucion�rio, � tamb�m uma forma de ador�-lo e deixar que suas ideias sejam cada vez mais perpetuadas”, conclui.
JEAN LUC-GODARD:
DE ACOSSADO A
IMAGEM E PALAVRA
• De M�rio Alves Coutinho
• Editora Tipografia Musical
• 264 p�ginas
• R$ 66 (livro)
• R$ 42 (e-book)
VEJA GODARD

NO TELECINE
A plataforma de streaming dos canais Telecine disponibilizou nove filmes do cineasta franc�s. O pol�mico Eu vos sa�do, Maria (1985, foto) est� na lista. O longa com Myriem Rousell, Thierry Rode e Philippe Lacoste conta a hist�ria de Maria, m�e de Jesus Cristo, ambientada no final do s�culo 20. � �poca do lan�amento, o papa Jo�o Paulo II (1920-2005) condenou o longa e foi seguido pelos cat�licos.
No Brasil, o governo Jos� Sarney (1985-1990) impediu que o filme fosse exibido nos cinemas por quase tr�s anos. A censura por motiva��es religiosas gerou pol�mica, sobretudo por ocorrer durante o per�odo da redemocratiza��o.
Tamb�m est�o dispon�veis Uma mulher � uma mulher (1961), Uma mulher casada (1964), Salve-se quem puder (1980) e Paix�o (1982).

NA NETFLIX
Lan�ado em 2018, Imagem e palavra (foto) � constru�do a partir da colagem de materiais de origens distintas: trecho de um filme de Michael Bay, m�sicas, textos, pinturas e videopropaganda do Estado Isl�mico retirada do YouTube. O filme estreou no Festival de Cannes e ganhou a Palma de Ouro Especial.
Ausente, Godard participou da coletiva de imprensa via chamada de v�deo. Ao ser questionado se seria um filme pol�tico, respondeu: “N�o... Queria que meu filme fosse basicamente como um romance. Queria mostrar como os �rabes n�o precisam da interven��o de outras pessoas, porque podem muito bem cuidar de si mesmos. Eles inventaram a escrita, inventaram muitas coisas. Eles t�m petr�leo – muito mais do que � necess�rio, praticamente. Ent�o, n�o sei. Acho que deviam ser deixados para lidar sozinhos com as pr�prias quest�es. N�o podemos ditar nada com filmes”.

NA GLOBOPLAY
A plataforma disponibiliza Adeus � linguagem (foto), filme de 2014. Intrigante narrativa visual, conta a hist�ria de um homem e uma mulher que dividem a intimidade em uma casa, onde mora tamb�m um cachorro. Ela � casada, mas n�o h� qualquer informa��o sobre sua vida fora daquele local. Os dois conversam sobre a linguagem sob o ponto de vista filos�fico, enquanto o c�o a tudo observa. Exibido no Festival de Cannes, o longa ganhou o Pr�mio do J�ri. A obra de Godard tamb�m foi eleita o melhor filmepela National Society of Film Critics Award.