
Com a popularidade de personagens como Tio Maneco e � frente do seriado “Shazan, Xerife & Cia”, o ator Fl�vio Migliaccio, como explica o filho dele, Marcelo, sempre era interpelado na rua por f�s. Esse carinho e reconhecimento est�o retratados no longa “Migliaccio — O brasileiro em cena”, que tem assinatura de Marcelo Migliaccio tanto no roteiro quanto na produ��o. Junto com a proje��o do ator no cinema e na tev�, o teatro, movido por ensaios exaustivos, tem plano privilegiado no filme, sobretudo com as inser��es da pe�a autobiogr�fica “Confiss�es de um senhor de idade”, que norteiam a narrativa do document�rio.
"A pe�a foi uma esp�cie de despedida que meu pai fez da carreira e da vida tamb�m, porque a decis�o que ele tomou (suic�dio), no ano passado, era filos�fica, e acho que j� estava com ele h� muito tempo, isso de n�o se deixar definhar pela velhice. A pe�a � uma esp�cie de ajuste de contas feito com Deus; ele, que era ateu. Essa �ltima pe�a dele foi tamb�m uma carta-testamento”, avalia Marcelo.
Filmada em 15 ocasi�es e por v�rios �ngulos, a pe�a foi parar no YouTube e baliza o atual document�rio que mostra as origens da verve c�nica de Fl�vio Migliaccio: o jogo de sombras na janela, acompanhado pelo violino do pai. Depois das tentativas de ser engraxate, pedreiro e mec�nico, Migliaccio se encontrou no Teatro de Arena, com a an�lise da realidade brasileira — “minha gente, minha l�ngua”, como ele ressalta no filme—, e ao lado da ala “intelectual”, com Augusto Boal — com quem interpretou “Revolu��o na Am�rica do Sul” — e da ala “estudantil”, com Gianfrancesco Guarnieri e Oduvaldo Viana Filho, criou a vertente “do povo” ao lado de Milton Gon�alves.
“O Arena definiu o estilo de uma gera��o inteira de atores em contraposi��o ao teatr�o impostado que era feito por T�nia Carrero e Paulo Autran. V�rios atores daquela �poca vieram para o jeito brasileiro de representar, e para o Fl�vio, como era instintivo, caiu como uma luva naquela turma, com aquele estilo dele visceral de representar”, observa o roteirista de “Migliaccio”.
MUSA
Outra hist�ria que saiu da coxia para as telas � a de Helena Ignez, uma das maiores musas do cinema novo. “A mulher da luz pr�pria” � assinado por uma das filhas da atriz, Sinai Sganzerla. “O encontro com o teatro foi o encontro com a pr�pria luz, n�o s� a luz do projetor de cinema, mas ainda com a luz das artes e das realiza��es pessoais e profissionais”, avalia a diretora do longa, que j� participou de mais de 40 festivais, numa rota que contemplou Cuba e Turquia. Narrado por Helena, que se assume em eterna transforma��o, o longa praticamente estreia na tev� (Canal Curta!), uma vez que teve o circuito comercial alterado por causa da pandemia.
“No longa, mostro o encontro da minha m�e com Martim Gon�alves, uma pessoa important�ssima para a nossa cultura. A aproxima��o veio na Escola de Cinema da Bahia, em 1958. L� que houve a forma��o do Glauber Rocha (ex-marido de Ignez) e do Ant�nio Pitanga (ator de 'A idade da Terra')”, comenta a diretora. Fotos in�ditas da pe�a “A �pera dos tr�s tost�es” (de Bertolt Brecht) trazem din�mica para um trecho do filme em torno da atriz que esteve na vanguarda da cena teatral, ao lado de Ant�nio Abujamra, e dirigiu as pe�as “Savannah Bay” e “Cabaret Rimbaud — Uma temporada no inferno”.
PIONEIRO
Atra��o do streaming da Tamandua.TV.br, o longa “Paulo Autran — O senhor dos palcos” (de Marco Abujamra) examina os bastidores de parte das mais de 80 pe�as em que o carioca, criado em S�o Paulo, se consagrou. Da estranheza de n�o pertencer a grupos na inf�ncia at� a dedica��o por 16 horas di�rias de ensaios, passando pelo aprimoramento no corpo do Teatro Brasileiro de Com�dia, Autran emociona diante da robustez da carreira, encerrada com a morte em 2007. Sem constrangimento de tratar de fiascos como o “Macbeth”, montado por Fauzi Arapi, nos anos 1970, Autran tamb�m apresenta o sin�nimo da excel�ncia nas atua��es em “Rei Lear” (com montagem de Ulysses Cruz), “Solness” (um Ibsen recriado por Eduardo Tolentino) e na shakespeariana “A tempestade”.
Pioneiro, em 1957, ao lado de T�nia Carrero, das grandes excurs�es de trupe no Brasil, o filme justifica por que Autran era capaz mobilizar um p�blico por tr�s anos – como no espet�culo “Pato com laranja”. O filme tamb�m mobiliza grandes nomes da s�tima arte, como Bibi Ferreira, relembrando de quando o aconselhou a recitar dentro da m�trica em vez de cantar no musical “O homem de la mancha”, o que lhe rendeu ova��es. Fernanda Montenegro traz um dos depoimentos mais emocionantes. A ex-parceira da novela “Guerra dos sexos” estipula o fim do ciclo de uma gera��o combativa com a partida do amigo.