
Depois de se transformar em fen�meno na internet com o v�deo que ironiza a postura do governo brasileiro na aquisi��o das vacinas da Pfizer, o humorista mineiro Esse Menino lan�a o especial que revela outra face de seu trabalho.“Poodle” estreia nesta sexta-feira (13/08), fiel ao princ�pio da com�dia, a capacidade de rirmos de n�s mesmos, e com a proposta de oferecer um novo olhar sobre a comunidade LGBT.
Nascido em Te�filo Otoni, no Vale do Mucuri, Esse Menino tem 25 anos. Desde 2018, publica v�deos de humor na internet. Morou em Belo Horizonte, tentou ganhar a vida como comediante de stand up e roteirista em S�o Paulo, mas a pandemia de COVID-19 o trouxe de volta � capital mineira. Em junho, ficou famoso com o divertido “v�deo da Pifaizer”.
“Mudou tudo, porque agora tenho uma carreira. Antes, tinha planos e sonhos, estava correndo atr�s para botar meu nome na pra�a”, diz o humorista. “Estou trabalhando muito e vivendo disso, o que era a minha maior meta.”
''Esses pap�is caricatos s�o rasos. Muitas vezes, eles n�o t�m outra fun��o na narrativa al�m de estar ali fazendo uma gracinha, assumindo a cota gay''
Esse Menino, humorista
BOY LIXO
No v�deo, Esse Menino “encarna” a Pifaizer, indignada por ter dezenas de e-mails ignorados pelo presidente Jair Bolsonaro, a quem chama de “Naro”. H� refer�ncias ao mundo pop e ao universo gay, com seus “boys lixo”.O carisma, o humor �cido e a linguagem moderna transformaram Esse Menino n�o s� em meme nas redes sociais, mas em inspira��o para cartazes exibidos durante as manifesta��es de protesto contra o governo federal.
Desde a publica��o do v�deo, o mineiro ganhou mais de 1 milh�o de seguidores no Instagram. Tamb�m fechou contrato com a ag�ncia Mynd, de Preta Gil, que gerencia a carreira de celebridades. “Fiquei muito feliz por ter viralizado, porque acho que o v�deo d� o tom do meu posicionamento, de quem eu sou. Ao mesmo tempo, � muita coisa que vem de uma vez”, conta.
“Poodle” est� diretamente ligado ao “v�deo da Pifaizer”. Esse Menino gravou o especial uma semana antes de o trabalho viralizar na internet. A inten��o era experimentar algo novo, al�m do formato de tr�s minutos nas redes sociais. Artista independente, sem patroc�nio, ele juntou todas as economias para viabilizar “Poodle”. “Foi um tiro no escuro”, comenta.
Ao publicar o v�deo da vacina em 9 de junho, a ideia era bater a marca de 40 mil seguidores do perfil Esse Menino e divulgar o especial. No entanto, o resultado foi muito al�m do esperado. Em contrapartida, o humorista mineiro alcan�ou p�blicos pouco familiarizados com sua performance, que poderiam estranhar “Poodle”.
O especial prop�e uma reflex�o para (e sobre) a comunidade LGBTQI+, em cinco atos baseados no processo de luto: “Nega��o”, “Revolta”, “Depress�o”, “Barganha” e “Aceita��o”.
O roteiro inicial foi elaborado para um edital de micrope�as lan�ado pela Prefeitura de Belo Horizonte. A aprova��o da proposta, em dezembro de 2020, viabilizou a performance solo com 10 minutos, estrelada pela nova personagem da comunidade LGBT.
“Primeiramente, queria explorar s� a quest�o do papel do ‘gay pet’, esses homens gays, cis, que s�o meio alienados. Ningu�m sabe o que eles fazem exatamente, qual � a profiss�o deles. S�o conhecidos por estar sempre com famosos, naquela posi��o subalterna”, explica.
A experi�ncia foi bem-sucedida e o humorista ampliou a proposta, produzindo o especial in�dito, com 47 minutos. “Achei que bater s� nessa tecla (do 'gay pet') ia parecer um lugar meio de superior, como se eu tamb�m n�o tivesse v�rios pontos que podem ser abordados. Acabei tirando a narrativa um pouco daquele lugar de s� apontar o dedo”, explica Esse Menino, que pede para ser identificado assim nesta reportagem – e n�o por seu nome civil. Al�m de performar, ele assina o roteiro e a produ��o de “Poodle”.

CANCELAMENTO
Com formato stand up, “Poodle” se baseia em situa��es que seu autor vivenciou. Ele critica a sociedade heteronormativa, a comunidade LGBT, a cultura do cancelamento, a m�dia e a padroniza��o de estere�tipos.Esse Menino se assume “mais gay do que o normal”, e n�o teme rir de si mesmo. “Quis mostrar a minha personalidade, essa persona falha que eu sou”, afirma.
O especial conta com a participa��o especial da cantora Jup do Bairro e as vozes da cantora e compositora Duda Beat e do roteirista Chico Felitti. Figurino e cen�rio n�o poupam o rosa-choque.
“A gente foi na coisa do rosa, dos penduricalhos e da bicha caricata porque essa � uma posi��o que existe muito na m�dia. Se a gente olhar para as novelas e seus personagens, (a abordagem) � sempre nesse lugar”, afirma. “Esses pap�is caricatos s�o rasos. Muitas vezes, eles n�o t�m outra fun��o na narrativa al�m de estar ali fazendo uma gracinha, assumindo a cota gay”, critica. “Ent�o, (o especial) foi mais para mostrar que existe complexidade (na comunidade LGBT).”
“Poodle” retoma a inf�ncia de Esse Menino e os conflitos de uma crian�a homossexual no interior de Minas. Ao amadurecer, ele incorpora a milit�ncia LGBT e problematiza algumas quest�es, como a dificuldade de dialogar com a comunidade enquanto humorista.
“Algumas pessoas podem ficar incomodadas, mas eu quis mostrar uma coisa mais crua em rela��o ao que sinto do lado de c�, tendo de produzir para pessoas engajadas, que tamb�m t�m um interesse pol�tico no que fa�o”, comenta.
O roteiro remete �s consequ�ncias da ascens�o da comunidade LGBT na sociedade e � dificuldade de seus integrantes para se identificar com a milit�ncia, em meio ao fen�meno do cancelamento nas redes sociais e � representatividade proposta pela m�dia.
“Existem pessoas que perdem a m�o (no ativismo) e muitas empresas capitalizaram em cima dessa milit�ncia. Isso tamb�m � um problema, porque a representatividade vira estrat�gia de marketing”, observa.
''Algumas pessoas podem ficar incomodadas, mas eu quis mostrar uma coisa mais crua em rela��o ao que sinto do lado de c�, tendo de produzir para pessoas engajadas, que tamb�m t�m um interesse pol�tico no que fa�o''
Esse Menino, humorista
GAY PET
Esse Menino pretende trazer nova vis�o sobre a figura do “gay pet”. A vida alienada desse personagem � mais f�cil e glamourosa em compara��o � realidade dos ativistas. Bem-humorado, o artista mineiro assume que n�o sabe de tudo, diz que ningu�m � perfeito.“Minha inten��o foi mostrar que aquela pessoa, no in�cio t�o convicta de si, se sentiu perdida com tudo o que est� acontecendo, com todas as informa��es que a gente recebe, e simplesmente desistiu”, adianta.
“Poodle” destaca tamb�m o trabalho de Esse Menino como roteirista e cantor. No in�cio do especial, ele faz piadas sobre a realidade do artista independente, que, apesar de tanto se esfor�ar, ainda � visto como “tiktoker”, ou seja, figurinha carimbada do aplicativo Tik Tok. Ao final, deixa claro que n�o veio para ser mais um. Quer lutar por espa�o sem abdicar de sua identidade, sem a responsabilidade de agradar a todos.
“O humor brasileiro ainda � feito pelas mesmas pessoas de antes. N�o que sejam sempre os mesmos caras, mas � o mesmo perfil: homem branco, h�tero, cisg�nero. Eles s�o bons tamb�m, mas � muito igual”, afirma.
“A inten��o do especial, da minha carreira, n�o � mudar a cena. Isso acontece indiretamente a partir do momento em que outras pessoas est�o ocupando espa�os”, conclui.
“POODLE”
Especial com o humorista Esse Menino. Estreia nesta sexta-feira (13/08), com ingresso a R$ 20. Link de acesso: evoe.cc/essemenino. At� 20 de agosto.
* Estagi�rio sob supervis�o da editora-assistente �ngela Faria