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Estado de Minas FILHOS DE PEIXE

Jovens artistas mineiros contam como � seguir a carreira de pais famosos

Eles tem um modelo profissional em casa, mas tamb�m precisam driblar as expectativas alheias em torno de suas carreiras


15/10/2021 04:00 - atualizado 15/10/2021 09:29

Imane Rane com seu pai, Sérgio Pererê
Imane Rane com seu pai, S�rgio Perer� (foto: Artur Rane/Divulga��o)

"Eu sempre vi que (a carreira musical) era uma coisa dif�cil, no sentido de se sustentar com isso. Ele sempre fez quest�o de mostrar que tinha as dificuldades desse meio, mas tamb�m nunca deixou de apoiar e instruir. Ent�o, fui por um caminho que n�o era ilus�rio, pensando na fama, no sucesso, nessas coisas. � muito p� no ch�o e com tranquilidade, fazendo do jeito que eu acho que tem ser e fluindo"

Imane Rane, MC, filho de S�rgio Perer�



“Tal pai, tal filho”; “Filho de peixe, peixinho �”; “O fruto nunca cai longe da �rvore”. Essas s�o algumas das in�meras express�es que descrevem as semelhan�as entre pais e filhos. Mas como lidar com essa rela��o familiar na carreira profissional? � mais f�cil ou mais dif�cil?

Tr�s jovens mineiros que herdaram a voca��o dos pais falaram � reportagem sobre  os desafios de dar continuidade a uma linhagem art�stica e, ao mesmo tempo, construir um caminho pr�prio na profiss�o.

TRABALHO EM FAM�LIA 

Aos 19 anos, B�rbara Luz protagoniza o rec�m-lan�ado curta-metragem “A primeira perda da minha vida”, uma produ��o do Grupo Galp�o, que tem dire��o assinada por sua m�e, In�s Peixoto, e roteiro escrito por seu pai, Eduardo Moreira, ambos fundadores da companhia teatral mineira. 

A jovem atriz conta que cresceu dentro do Galp�o, acompanhando ensaios, apresenta��es e bastidores. “Com tr�s meses, eu estava fazendo minha primeira viagem de avi�o para acompanh�-los numa temporada de teatro”, diz B�rbara. “Eu sempre estive muito dentro do universo da fantasia, do teatro e dos diversos cen�rios que eles me apresentavam nas pe�as.”

Ela conta que desde pequena queria ser atriz e sempre teve vontade de participar dos espet�culos do Galp�o, mas ficava chateada quando os pais viajavam a trabalho sem sua companhia. In�s Peixoto tentava compensar a frustra��o do per�odo em que ficavam distantes trazendo lembran�as para a filha, que, ainda assim, protestava: “N�o quero presentes, quero voc�s perto de mim”.  

Aos 10 anos, B�rbara teve a primeira experi�ncia profissional no filme “O menino no espelho” (2014), de Guilherme Fiuza. Aos 14, conquistou o papel de protagonista em “Unic�rnio” (2017), de Eduardo Nunes. A experi�ncia pr�tica foi crucial para a sua decis�o de se tornar atriz, ainda jovem. Segundo ela, n�o faltou apoio dos pais, que ficaram cheios de orgulho de presenciar a estreia da filha no cinema. 

B�rbara Luz afirma n�o ter medo de ficar “na sombra” deles ao longo da carreira. A inseguran�a est� mais ligada � realidade profissional de um artista no Brasil. “A gente vive em um pa�s onde a arte est� sendo cada vez mais desvalorizada. E eu tamb�m penso muito no futuro do teatro depois da pandemia. O que vai ser fazer teatro?”  

Ela conta que gostou da experi�ncia de ser dirigida por In�s Peixoto em “A primeira perda da minha vida”, sobretudo pela sensibilidade que sua m�e tem no trabalho de cria��o. O texto de Eduardo Moreira, que somente agora saiu da gaveta, tinha sido escrito para a filha quando B�rbara estava com 6 anos de idade. “Meu pai escreveu com muita delicadeza esse texto e ainda cabe muito em mim”, diz ela.

Segundo B�rbara, uma vantagem de trabalhar com os pais � que a conviv�ncia n�o fica restrita ao ambiente da filmagem. “Existe uma liberdade, porque a gente pode tomar o caf� da manh� conversando sobre o filme, trocando ideias, conselhos, pensando num tom. Acaba que o trabalho vira uma coisa mais cotidiana e, ao mesmo tempo, mais divertida.”

Para ela, a “troca” � a principal vantagem de seguir a profiss�o dos pais. “A gente escolheu amar a mesma coisa. E, ao mesmo tempo, a gente est� vivendo para amar isso. Al�m de compartilhar o amor entre n�s, a gente ainda compartilha um amor por outra coisa, que � o teatro.”

Rafael Zavagli com seus pais, Sandra Bianchi e Mário Zavagli
Rafael Zavagli com seus pais, Sandra Bianchi e M�rio Zavagli (foto: Acervo pessoal/Rafael Zavagli)

"Quando descobri a pintura a �leo, tive a certeza de estar no lugar certo. At� ent�o, eu n�o estava achando um caminho muito dif�cil. Descobri que precisava apanhar mesmo, encontrar uma coisa que me tirasse do lugar, me desse uma dor de cabe�a. A� que eu fui entender mais o processo de cria��o. Senti que me desvinculei, que estava num caminho que era meu"

Rafael Zavagli, artista pl�stico, filho de Sandra Biachi e M�rio Zavagli�



VANTAGEM DE APRENDER 

O MC Imane Rane, filho do cantor, compositor e instrumentista S�rgio Perer�, lan�ou seu primeiro EP, “Gana”, em setembro passado, buscando conquistar o seu lugar na  frut�fera cena de rap belo-horizontina. A voca��o musical vem do ber�o (e da casa inteira). 

“Quando eu nasci, j� estava todo mundo (da fam�lia) envolvido com a m�sica. Ent�o, nem me lembro de quando foi o meu primeiro contato com a m�sica, porque, com certeza, foi quando eu era muito novo. Cresci vendo meu pai compondo, cantando, escutando m�sica”, conta Imane Rane, de 18 anos. 

A rotina de um m�sico profissional era vista com naturalidade por ele na inf�ncia. Imane costumava acompanhar S�rgio Perer� no est�dio e nos shows e notou cedo que na arte “nem tudo s�o flores”. “Desde sempre, aprendi que n�o era um mar de rosas, aquela coisa que aparecia na televis�o. Eu percebi que era mais embaixo o buraco”, afirma.    

Aos 8 anos, Imane come�ou a ganhar intimidade com o microfone, cantando ao lado do pai em alguns shows e grava��es. No in�cio, ele levava como uma “brincadeira”, mas, aos poucos, a m�sica se tornou coisa s�ria para ele. A sua primeira letra de rap surgiu quando, certo dia, S�rgio Perer� escreveu um refr�o e pediu para os filhos desenvolverem a can��o.

“Cheguei a mostrar pra ele um rascunho, depois a gente gravou. A partir da�, ele foi sempre me apoiando a fazer as coisas”, conta o MC. Em seguida, eles fizeram parceria nos singles “Dourada”(2019) e “Minha hist�ria” (2021). Quando lan�ou o EP “Gana”, Imane j� tinha certeza de que queria seguir a carreira musical. Seu pai foi uma motiva��o a mais para tomar essa decis�o. 

“Nunca foi uma preocupa��o minha ficar na sombra dele, at� porque s�o caracter�sticas muito diferentes, tanto no timbre da voz quanto no estilo de m�sica. S�o coisas distintas, ent�o n�o estou fazendo nada parecido com a m�sica dele”, afirma. 

Al�m de rapper, Imane � produtor musical e beatmaker. “� uma �rea muito ampla. � a mesma do meu pai, mas n�o � o mesmo setor. Tem v�rias possibilidades.” Embora se veja num universo musical diferente do de seu pai, Imane d� ouvidos ao que S�rgio Perer� tem a dizer sobre sua carreira, que ele faz quest�o de acompanhar de perto, desde o nascimento das letras at� os shows. 

Segundo Imane, ele e o pai cultivam uma rela��o de m�tuo respeito, sem interferir no trabalho um do outro. “Eu sempre vi que (a carreira musical) era uma coisa dif�cil, no sentido de se sustentar com isso. Ele sempre fez quest�o de mostrar que tinha as dificuldades desse meio, mas tamb�m nunca deixou de apoiar e instruir. Ent�o, fui por um caminho que n�o era ilus�rio, pensando na fama, no sucesso, nessas coisas. � muito p� no ch�o e com tranquilidade, fazendo do jeito que eu acho que tem ser e fluindo.”  

Para ele, o dif�cil n�o � seguir a carreira do pai, mas “fazer a arte por si s�”. “Eu vejo como um ponto positivo (seguir a mesma profiss�o do pai). � uma quest�o de legado, sabe? Vejo como uma continua��o do processo, algo tranquilo, porque � uma coisa que eu tamb�m gosto de fazer. Quando a gente tem algu�m mais experiente para instruir � sempre uma vantagem.” 

Bárbara Luz com seus pais, Inês Peixoto e Eduardo Moreira
B�rbara Luz com seus pais, In�s Peixoto e Eduardo Moreira (foto: Adalberto Lima/Divulga��o )

"A gente escolheu amar a mesma coisa. E, ao mesmo tempo, a gente est� vivendo para amar isso. Al�m de compartilhar o amor entre n�s, a gente ainda compartilha um amor por outra coisa, que � o teatro"

B�rbara Luz, atriz, filha de In�s Peixoto e Eduardo Moreira



PRESS�O EXTERNA 

L�pis, pap�is, tintas e desenhos fizeram parte da inf�ncia de Rafael Zavagli, filho dos artistas pl�sticos M�rio Zavagli e Sandra Bianchi. Desde pequeno, ele acompanhava os pais em exposi��es, viagens profissionais, ateli�s e aulas (os dois foram professores de belas-artes na UFMG). Sandra pintava retratos dos filhos, enquanto M�rio os levava para fotografar paisagens que inspiraram obras suas. E, claro, os pais sempre incentivaram os filhos a exercer sua criatividade. 

“Enquanto a gente era pequeno, sempre foi uma coisa meio l�dica. E levava para um lado de 'olha, como � legal a gente desenhar e criar’”, conta Rafael, de 40 anos. Ele s� tomou a decis�o de seguir a mesma carreira dos pais aos 45 minutos do segundo tempo. No momento de se inscrever para o vestibular de m�sica, Rafael mudou de ideia e resolveu fazer belas- artes, sem perguntar a opini�o dos pais. A escolha foi um processo natural, segundo diz. 

“N�o era um sonho de crian�a. Se eu falar que sempre quis ser (artista pl�stico), � mentira. Mas foi muito natural. Eu j� gostava daquilo, era uma paix�o minha, mas nunca tive certeza”, afirma. Ao comunicar aos pais sua decis�o, ouviu deles uma rea��o bem-humorada por terem emplacado dois filhos no meio art�stico. Sua irm� mais velha, J�lia, ingressou um ano antes no curso de belas-artes da UFMG. 

“No dia em que eu me inscrevi em belas-artes, eles falaram: ‘Nossa, mais um artista, ai meu Deus’. Eles racharam de rir, mas foi �timo”, relembra Rafael. Segundo ele, os pais sempre o incentivaram a seguir seus sonhos, seja na m�sica ou nas artes pl�sticas. No entanto, na faculdade, ele sentiu a press�o de sua escolha. Havia grandes expectativas em rela��o � carreira do filho de dois artistas pl�sticos, grandes aquarelistas, que tamb�m lecionaram na universidade. 

“Eu ficava muito t�mido. Por exemplo, eu n�o trabalhava muito nos ateli�s, na frente das pessoas. Eu tinha um pouco essa trava”, conta Rafael. A facilidade que tinha para pintar inspirado no trabalho dos pais lhe trouxe uma crise criativa em seus primeiros per�odos de faculdade. Ele chegou a trancar o curso para repensar sua decis�o. Esse processo teve uma solu��o quando Rafael Zavagli come�ou a se dedicar � pintura a �leo, que nunca foi a especialidade da fam�lia.   

“Quando descobri a pintura a �leo, tive a certeza de estar no lugar certo. At� ent�o, eu n�o estava achando um caminho muito dif�cil”, comenta. “Descobri que precisava apanhar mesmo, encontrar uma coisa que me tirasse do lugar, me desse uma dor de cabe�a. A� que eu fui entender mais o processo de cria��o. Senti que me desvinculei, que estava num caminho que era meu.” 

Na opini�o dele, ser filho de um artista � positivo 90% do tempo, mas “essa nuvem de desconfian�a, cobran�a e de expectativa atrapalha um pouquinho”. “Isso nunca passou por eles (meus pais), sempre foi um problema meu”, diz. Para Rafael, ter podido contar com o suporte, a compreens�o e a independ�ncia que seus pais lhe ofereceram foi algo fundamental em sua carreira. “Se por um acaso um filho meu passasse pelo mesmo processo, acho que eu agiria da mesma forma que os meus pais agiram comigo.”

*Estagi�rio sob a supervis�o da editora Silvana Arantes


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