
Da mesma gera��o, Marcos e Paula s�o jornalistas, fumantes e trabalham na mesma emissora de TV – ele como editor e ela como �ncora. As diferen�as, no entanto, se tornaram grandes demais: depois de mais de 20 anos de casados, eles se separaram. O processo de separa��o ocorre em meio � corrida presidencial de 2022. E � durante o �ltimo debate televisivo entre Luiz In�cio Lula da Silva e Jair Messias Bolsonaro que o ex-casal tem novo enfrentamento.
Parceiros h� d�cadas, o pernambucano Guel Arraes, de 68 anos, e o ga�cho Jorge Furtado, de 62, est�o adaptados ao trabalho remoto muito antes da pandemia. Com o primeiro vivendo no Rio de Janeiro e o segundo em Porto Alegre, os roteiros para s�ries e filmes que criaram juntos (“A com�dia da vida privada”, “Caramuru – A inven��o do Brasil”, “Lisbela e o prisioneiro”, entre outros), sempre foram escritos a dist�ncia.
Primeiramente por fax, lembra Furtado, a parceria ainda hoje se mant�m da mesma maneira: escrevem e reescrevem, e cada v�rgula que um muda � devidamente informada ao parceiro. Com as b�n��os da tecnologia, o trabalho di�rio se tornou muito mais f�cil. Foi dessa maneira que os dois escreveram no ano passado “O debate”, texto para teatro lan�ado no segundo semestre pela Editora Cobog�.
Neste fim de semana, "O debate" ganha sua primeira montagem, com tr�s sess�es no Galp�o Cine Horto – desta sexta (11/2) a domingo (13/2), sendo que a �ltima apresenta��o ter� tamb�m transmiss�o via YouTube. Em cena, Eduardo Moreira, do Galp�o, e �ngela Mour�o, do Grupo Teatro Andante, s�o dirigidos por Adyr Assump��o. N�o � um espet�culo pronto, tampouco uma simples leitura dram�tica. Assump��o prefere chamar de performance.
Furtado e Guel n�o participaram do processo de montagem. V�o assistir a “O debate” – que ter� uma vers�o em filme, marcando a estreia de Caio Blat como diretor de longas – pela primeira vez na transmiss�o de domingo. Encerrada a encena��o, outro debate, on-line, vai reunir a dupla de autores e o elenco.
CRISE
O tempo da pe�a � o tempo do debate. Nos bastidores da emissora, Marcos (Eduardo Moreira) e Paula (�ngela Mour�o) conversam sobre o que est� ocorrendo naquela noite de outubro de 2022, no terra�o da rede de TV, onde se encontram para caf�s e cigarros. Ainda que o contexto seja o das elei��es, falam tamb�m da crise do jornalismo na era da manipula��o das informa��es, de democracia e toler�ncia.
H� temas que s�o permeados pelo pr�prio debate entre Lula e Bolsonaro (a troca de ideias entre os dois candidatos n�o aparece no texto), como a pandemia, o crescimento das igrejas evang�licas, porte de armas. “Os candidatos debatem no programa, e os personagens no bastidor”, conta Furtado. O relacionamento �, obviamente, abordado pelo ex-casal.
Segundo Furtado, a hist�ria surgiu como uma “ang�stia” a partir dos encontros virtuais e di�rios com Guel. “Em um determinado momento, chegamos � conclus�o de que t�nhamos que botar para fora, tentar fazer alguma coisa que interferisse na coisa pol�tica diretamente”, afirma.
Para ele, o texto vem em defesa de duas quest�es: “O debate, em primeiro lugar, de voc� conseguir conversar. Em segundo, em defesa da vacina. Chegamos a um ponto em que tudo se pode discutir: se o isolamento social foi bem feito ou n�o, se as escolas deveriam ter fechado ou n�o... Agora, discutir a vacina em si n�o d�. A vida ou a morte das pessoas depende disso. Essa discuss�o n�o � poss�vel”.
O que moveu Furtado e Guel a escrever “O debate” foi tamb�m o que moveu Eduardo, �ngela e Adyr a mont�-lo. A performance deste fim de semana � assinada pelo Balb�rdia Atores Associados, uma reuni�o de nomes incontestes da cena mineira que se juntou no final de 2019 para trabalhar um texto do pr�prio Furtado a respeito da censura.
“Meus l�bios se mexem” foi escrita pelo ga�cho a partir de uma hist�ria contada a ele pela atriz Fernanda Montenegro. Em 1967, Fernanda fez parte do elenco de “Volta ao lar”, do brit�nico Harold Pinter, com tradu��o de Mill�r Fernandes, dirigida por Fernando Torres, marido da atriz. Depois de fazer sucesso no Rio, a montagem tinha uma temporada programada para S�o Paulo.
Em 1968, Torres e o ator e diretor Ziembinski foram chamados para uma reuni�o com Solange Hernandes, funcion�ria do Departamento de Censura da Pol�cia Federal. “Dona Solange”, como ficou conhecida a maior censora das artes no Brasil, propunha 65 cortes para que o texto fosse liberado. N�o houve acordo, e a pe�a foi proibida.
“Um pouco antes da pandemia, viv�amos (novamente) o problema da censura rondando a cultura”, conta Adyr, relembrando de casos recentes, como os das exposi��es “Queermuseu”, em Porto Alegre, e “Fa�a voc� mesmo sua Capela Sistina”, no Pal�cio das Artes, ambos em 2017.
O trio que est� em “O debate” se juntou a outros nomes, como Cida Falabella, Ant�nio Grassi e Bernardo Mata Machado, para uma leitura dram�tica de “Meus l�bios se mexem”. Esse foi o in�cio do Balb�rdia. Houve sess�es presenciais e havia uma temporada prevista. Com o in�cio da pandemia, chegaram a fazer uma experi�ncia on-line com esse texto e depois pararam.
PARTICIPA��O
“Cada um de n�s tem seu grupo, seu trabalho, e o Balb�rdia, que n�o � um grupo formalizado, veio com a ideia de reativar a participa��o pol�tica. Somos atores da gera��o que j� passou da curva dos 60, ent�o temos outra vis�o do tempo. Como temos uma experi�ncia grande e diversa, quando ensaiamos h� uma troca rica de experi�ncias. E n�o somos pessoas que ficam quietas. Agora estamos come�ando a botar a cabe�a pra fora de novo”, diz Adyr.
Para ele, chamar “O debate” de performance vai ao encontro da proposta de Furtado e Guel. “Eles est�o trabalhando com a mat�ria viva e isto � o que nos interessa. O p�blico n�o deve esperar um espet�culo pronto, mas o que vamos apresentar vai al�m da leitura, de apresentar o texto. Tem uma ambienta��o, com uma cenografia simples, com luz e equipamentos de transmiss�o. Mas � tamb�m a indica��o de que estamos querendo sair do universo exclusivamente virtual e voltar a encontrar o p�blico”, acrescenta Adyr.
Ele n�o descarta, para um futuro pr�ximo, um espet�culo. “Mas neste momento a inten��o � fazer um evento com um material pertinente com o que estamos vivendo. Afinal, existe a pandemia e a pandemia pol�tica. S�o muitos v�rus de naturezas diferentes espalhados”, comenta.
“O DEBATE”
De Guel Arraes e Jorge Furtado, com a Balb�rdia Atores Associados. Nesta sexta (11/2) e s�bado (12/2), �s 20h, e no domingo, �s 18h, no Galp�o Cine Horto – Rua Pitangui, 3.613, Horto. As apresenta��es de hoje e amanh� integram a Campanha de Populariza��o do Teatro – ingressos a R$ 20 (nos postos Sinparc e pelo site vaaoteatromg.com.br) e R$ 42 (inteira) na bilheteria. Para a sess�o de domingo, os ingressos (R$ 42 a inteira) est�o sendo vendidos pelo site Sympla. A apresenta��o desse dia tamb�m ser� transmitida pelo YouTube da R�dio Guar� (pelo link http://bit.ly/RadioGuara) e ser� seguida de debate on-line com os autores e atores