Tela 'As mulatas', de Di Cavalcanti, com sinais de perfurações

Perfura��es sofridas por tela "As mulatas", de Di Cavalcanti

Reprodu��o de internet
A s�rie de danos que o patrim�nio art�stico sofreu com a invas�o de Bras�lia, na tarde de domingo (8/1), ficou simbolizada com as sete perfura��es sofridas pela tela “As mulatas”, de Di Cavalcanti. A imagem dos estragos provocados pelos radicais no quadro de 1962, que fica no Pal�cio do Planalto, foi reproduzida milhares de vezes nas redes sociais.
 
“O espa�o mais danificado foi o segundo andar do Planalto, que foi praticamente revirado do avesso”, afirmou o arquiteto Rog�rio Carvalho, do Instituto de Patrim�nio Hist�rico e Art�stico Nacional (Iphan), e membro da equipe curatorial dos pal�cios da Alvorada, Planalto e Jaburu.
 
Relógio histórico produzido por artistas franceses na época de Luis 14

Antes da depreda��o, este era o rel�gio produzido na corte de Luis 14 que foi destru�do por radicais

Reprodu��o de internet
Al�m de “As mulatas”, Carvalho elencou outras perdas como uma escultura de Frans Krajcberg e um rel�gio com m�quina de Balthazar Martinot e ebanesteria de Charles Boulle, dois franceses que circularam pela corte de Luis 14 e trabalharam para o Rei Sol.
 
“Infelizmente, foi totalmente destru�do, assim como a escultura ‘O flautista’, de Bruno Giorgi. Foram outros danos � arquitetura, com muitos vidros quebrados e espa�os desmerecidos.”
 
O jornalista Marcelo Bortoloti, que publica neste ano, pela Companhia das Letras, a primeira biografia do pintor, caricaturista e ilustrador carioca (1897-1976), afirma que est� procurando quando a tela foi incorporada ao acervo do pal�cio federal, j� que n�o foi encomendada para a constru��o de Bras�lia.
 
Pr�ximo de Niemeyer, Di recebeu do arquiteto algumas encomendas para a ent�o capital federal em constru��o: as tape�arias “As m�mias” e “M�sicos” (esta �ltima, segundo den�ncia da primeira-dama Janja, ter� que ser restaurada porque sofreu com a��o solar, quando foi retirada pela gest�o anterior da biblioteca do Pal�cio das Alvorada), o painel “Candangos”, no Congresso Nacional e a via sacra, na Catedral. Entre o final dos anos 1950 e o in�cio dos 1960 o artista come�a a trabalhar mais com murais – hoje expostos em v�rios locais do Brasil. 
 
Em foto preto e branco feita durante construção de Brasília, vemos um grupo de pessoas, entre elas o ex-presidente JK e o artista Di Cavalcanti

Em visita a Bras�lia em 1959, Di Cavalcanti, sentado, ao lado de JK

Mario Fontenelle/Reprodu��o
Bortoloti comenta que Di nunca deu t�tulo a seus trabalhos. O nome “As mulatas” veio por uma quest�o mercadol�gica. “Ele sempre pintou mulheres de todas as cores. A tem�tica da mesti�agem est� na obra dele desde o come�o, na d�cada de 1920. Era uma resposta inclusive para o movimento fascista na Europa, com a quest�o da supremacia branca crescendo. Ent�o o Brasil tinha seu valor como terra da mesti�agem.”
 
Somente em 2022, para celebrar o centen�rio da Semana de Arte Moderna, da qual Di foi um dos art�fices, Bras�lia teve sua primeira exposi��o individual do artista. Realizada na Casa Albuquerque, a mostra “Protagonismo e perman�ncia” teve como curadora Denise Mattar.
 
Ser conhecido como “pintor das mulatas” �, na opini�o de Denise, uma quest�o n�o s� mercadol�gica, “mas at� redutora do talento”. “A grande op��o dele foi pintar o povo com a sua cara. Ele pintou negras, mulatas, brancas, ruivas.”
 
Na exposi��o, foram expostos pouco mais de 40 trabalhos, do in�cio da carreira at� 1976. Di trabalhou at� o ano de sua morte, aos 79 anos. “Na verdade o Di foi o grande articular da Semana de 22. Ele pr�prio definia sua obra como realismo m�gico, que � uma defini��o excelente, pois ele pintava o que via, mas com os olhos da imagina��o.”

 Outras obras que foram depredadas
 
Escultura 'A Justiça', em Brasília, foi pixada com os dizeres 'perdeu, mané'

Pixa��o em escultura do mineiro Alfredo Ceschiatti remete a fala de ministro do STF a bolsonarista

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“A Justi�a” (1961), de Alfredo Ceschiatti
 
Localizada em frente ao pr�dio do Supremo Tribunal Federal, a escultura foi pichada com os dizeres “perdeu, man�”. A frase � uma refer�ncia a uma resposta dada pelo ministro do STF Lu�s Carlos Barroso a um bolsonarista ap�s ser hostilizado, em novembro de 2022, em Nova York.
 
Feita em granito, a escultura de 3,3 metros de altura e 1,48 metros de largura foi criada pelo artista mineiro a convite da Oscar Niemeyer – os dois foram colegas na Escola Nacional de Belas Artes, no Rio de Janeiro.
 
Nascido em Belo Horizonte, Alfredo Ceschiatti (1918-1989) foi escultor, desenhista e professor. Na �poca da constru��o de Bras�lia, tornou-se seu principal escultor. Tem obras no Pal�cio da Alvorada, Pal�cio do Jaburu, Catedral, Itamaraty, C�mara dos Deputados e Universidade de Bras�lia, onde lecionou at� pedir demiss�o, em solidariedade aos colegas perseguidos por motivos pol�ticos.
 
 . “Araguaia” (1977), de Marianne Peretti
O vitral de Marianne Peretti, que fica no sal�o verde da C�mara dos Deputados, foi danificado. Artista franco-brasileira, Peretti (1927-2022) � considerada uma das mais importantes vitralistas do pa�s. Foi tamb�m a �nica mulher a integrar a equipe de cria��o de artistas na constru��o de Bras�lia. 
 
H� v�rias obras delas na Capital Federal, com destaque para os vitrais da Catedral de Bras�lia. Em 2016 veio a p�blico uma hist�ria controversa. Doada pela pr�pria artista em 1978, o painel “Alumbramento” (1978), com 200 pe�as de vidro, havia sido desmontado e estava abandonado no dep�sito do Senado desde os anos 1990. 
 
Todos os vidros tinham sido arrancadas e s� restava a estrutura de ferro. Ap�s muita luta a artista, ent�o com 89 anos, conseguiu recuper�-lo – e a obra voltou ao Senado.
 
. “Bailarina” (1920), de Brecheret
Localizada na C�mara dos Deputados, a escultura em bronze n�o est� mais em seu local original, s� restando a base da obra. Considerado o introdutor do Modernismo na escultura brasileira, Victor Brecheret (1894-1955) nasceu em Farnese, na It�lia, e chegou ao Brasil em 1904, onde instalou-se em S�o Paulo.
 
Mesmo ausente no pa�s na �poca, participou da Semana de Arte Moderna de 1922, expondo obras no Teatro Municipal de S�o Paulo. Na �poca, estava em Paris, per�odo que realizou a escultura desaparecida. “Bailarina” � uma das express�es mais importantes do per�odo parisiense.