
Santos, ver�o de 1994. Foi essa uma das primeiras frases que Graziela Gon�alves, ent�o com 23 anos, ouviu de Alexandre Magno Abr�o. Um ano mais velho, o paulistano havia se mudado para a cidade litor�nea no in�cio daquela d�cada. E j� tinha feito fama.
Um casamento desfeito, um filho pequeno e nova confus�o a cada fim de semana. Mas Graziela resolveu pagar para ver. Iniciava-se ali seu relacionamento com o Al�, como a vi�va de Chor�o chama o l�der da banda Charlie Brown Jr.
Pol�mico tanto na vida quanto na morte, Chor�o foi encontrado morto na madrugada de 6 de mar�o de 2013 em um apartamento em Pinheiros, Zona Oeste de S�o Paulo. Overdose de coca�na – apontou o laudo do Instituto M�dico Legal, um m�s mais tarde.
O m�sico, que completaria 43 anos em 9 de abril daquele ano, estava separado de Graziela desde novembro de 2012. “Gra, eu vou voltar. Te amo, tenha for�a, meu amor. Pra sempre te amo”, foi o recado dele para a mulher ao deixar o apartamento do casal.
“Uma catarse”, � como Graziela define o processo de revirar sua hist�ria e pass�-la para o papel. “No come�o, fugia principalmente na hora das partes mais dif�ceis, o final do relacionamento, o v�cio em coca�na. Essa ‘obriga��o’ de revisitar o passado fez com que virasse uma chave dentro de mim. Passei a ver a minha hist�ria, inclusive as coisas ruins, com generosidade. Hoje, sei que a vida de ningu�m � perfeita”, afirma Graziela, de 47 anos.

Desde a morte do m�sico, ela foi procurada por tr�s editoras para contar sua hist�ria. �s duas primeiras n�o demorou a dar o n�o. “Queriam um enfoque muito trash, falar de coisas que n�o queria”, conta. Depois de aceitar a proposta da Paralela (selo da Companhia. das Letras), Graziela levou os �ltimos tr�s anos para finalizar o livro.
“Foi um processo bem complicado, achei que n�o fosse conseguir. No come�o, houve uma pessoa para estruturar o texto, mas isso acabou n�o sendo usado. Como � uma hist�ria muito pessoal, queria dar a minha voz. Foram v�rias vers�es. S� de um ano para c� consegui encontrar o tom”, revela.
Musa de sucessos do Charlie Brown como Proibida pra mim (que tem o subt�tulo Grazon, a maneira como Chor�o a chamava), Te levar, Ela vai voltar e Hoje eu acordei feliz, Graziela conheceu o m�sico antes de a banda estourar com o primeiro �lbum, Transpira��o cont�nua prolongada (1997).
A narrativa, cronol�gica, � marcada pelos �lbuns da banda (10 de est�dio). Livro para f�s, destaca na parte pessoal a inseguran�a emocional de Chor�o, os (muitos) conflitos do Charlie Brown (o vocalista foi o �nico integrante que se manteve em todas as forma��es do grupo), a (hoje hist�rica) agress�o f�sica a Marcelo Camelo, em 2004. A depend�ncia qu�mica domina a parte final do livro.
“O melhor e o pior de ser mulher de m�sico � n�o ter rotina”, comenta Graziela, que acompanhava Chor�o no in�cio da carreira. “Depois a gente vai cansando. E eu precisava ter a minha vida”, explica ela, que � estilista, mas recentemente vem atuando na produ��o de eventos.
CONEX�O Graziela n�o se intimida em transformar suas mem�rias em um relato a�ucarado. “Repassei infinitas vezes cada detalhe daquela noite, cada olhar, cada palavra, sendo invadida por um turbilh�o de sentimentos. Nossa conex�o foi imediata e fulminante. Meu cora��o tinha um novo dono”, escreveu ela depois de seu primeiro encontro com o m�sico.
Uma das frustra��es de Chor�o, a vi�va relata, foi a n�o realiza��o de um sonho antigo: ser bombeiro. “Ele voltou para casa depois de algum tempo, com o rosto molhado das l�grimas que ainda ca�am. O Al� descobriu uma s�rie de procedimentos e exig�ncias para ser bombeiro. Uma delas era a idade, que ele j� tinha ultrapassado.”
Passado o turbilh�o, Graziela, hoje em dia, prefere se concentrar nas coisas boas. “Ele tinha um cora��o grande demais, para o lado bom e para o ruim. A postura mais rebelde do Al� veio desde a �poca de skatista, n�o foi algo que ele desenvolveu quando se tornou artista. Os conflitos refletiam negativamente em casa e no trabalho, mas ele era t�o amoroso que quando fazia porcaria, arrependia-se na hora”, finaliza.
TRECHO
“Fomos mais duas vezes � m�dica, mas depois ele se recusou a fazer qualquer exame e voltou a usar a droga diariamente. Ele j� n�o se mostrava t�o disposto a se abrir comigo, por�m ainda havia momentos em que fal�vamos a respeito da situa��o. Numa dessas conversas, confessou que estava dif�cil encarar os f�s. Dizia que queria inspirar a molecada, mas que se sentia longe disso. Falava que era muito do�do cantar algumas m�sicas, como Quinta-feira, sobretudo o refr�o ‘parecia inofensiva/ mas te dominou’, que era como se ele estivesse cantando para si mesmo... Quando eu tentava falar no assunto de retomar o tratamento, ele se alterava, me chamava de chata e dizia que a nossa conviv�ncia estava ficando dif�cil, que ele era respons�vel por si mesmo e que n�o deixava seu problema interferir na vida profissional, do que eu discordava totalmente.”
SE N�O EU, QUEM VAI FAZER VOC� FELIZ?
De Graziela Gon�alves. Paralela, 262 p�ginas, R$ 49,90