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Estado de Minas CURVAS DA IMORTALIDADE

Legado une as duas artes - a da beleza e a da justi�a social - por meio de constru��es, espa�os e poesia

Niemeyer n�o desafiou apenas a l�gica da arquitetura, mas tamb�m a no��o de obra-prima, com um conjunto de constru��es sublimes nos quatro cantos do mundo


postado em 06/12/2012 08:08 / atualizado em 06/12/2012 08:37

(foto: Lisl Steiner/O Cruzeiro/EM. Brasil)
(foto: Lisl Steiner/O Cruzeiro/EM. Brasil)
Niemeyer tornou o mundo mais bonito. Cumpriu com isso parte dos seus sonhos. O outro desejo era ainda mais ambicioso: construir um mundo mais justo. O grande legado do maior arquiteto brasileiro foi unir as duas artes – a da beleza e a da justi�a social – por meio de constru��es, espa�os e poesia. Sua obra, espalhada por todo o mundo, � um signo de cria��o e busca de di�logo com seu tempo. Niemeyer entendeu que o espa�o era curvo, que os volteios s�o belos, que as formas buscam alegria e que o homem � o sentido da arquitetura.


Com mais de 100 anos de vida e quase 80 de trabalho, Oscar sempre fez quest�o de afirmar que o que contava na exist�ncia eram os amigos. “A vida � um sopro”, dizia como quem sente correr entre os dedos a areia dos afetos que o ligavam aos homens e mulheres. Sua trajet�ria – que se confunde com o s�culo 20 em sua movimentada a��o hist�rica – foi feita de talento, ousadia t�cnica, capacidade de trabalho, humanismo e pol�tica. Comunista toda a vida (mesmo depois que deixou o partido, em 1990), militou com suas armas para melhorar o que via em sua volta e o desgostava. Criador na mais p�blica das artes, soube trazer para o seu campo o empenho igualit�rio que n�o via em torno de si.

Desde os tempos da Pampulha, nascedouro de sua vis�o de arquitetura, Niemeyer sempre conjugou a palavra liberdade em concreto. Dobrou o espa�o r�gido como quem se encantava com o barroco, que trazia na alma, como todo brasileiro. Aparentemente um poeta das formas, soube desenvolver solu��es em que a beleza era o outro nome da t�cnica. Passo a passo, foi incorporando ideias, criando um repert�rio de gestos que serviam de suporte para novos voos. Fez casas e pr�dios p�blicos, construiu pal�cios e pra�as, edificou igrejas e mesquitas. Fez brotar uma cidade no cora��o do Brasil.

A capacidade de realiza��o do arquiteto chega a ser assombrosa, pela quantidade de grandes obras e pela qualidade e permanente estado de renova��o que encerram. No entanto, em tudo que fez parece haver sempre uma inspira��o que nasce da simplicidade, do risco origin�rio que seus desenhos evidenciam, nas palavras quase singelas dos memoriais que acompanham cada constru��o. Essa atitude pode ser traduzida numa consci�ncia clara de sua miss�o como arquiteto: quanto mais belo melhor.

Niemeyer n�o desafiou apenas a l�gica da arquitetura, defendendo com intelig�ncia e sensibilidade o primado dos sentidos. Ele desafiou a no��o de obra-prima, com um conjunto de constru��es sublimes pousadas nos quatro cantos do mundo. Para quem pensa em processo de evolu��o, Oscar Niemeyer responde com a inteireza presente desde os primeiros projetos, como se cada etapa nada mais fosse que a afirma��o de um sentido adormecido � espera da luz. No campo da tecnologia, parece ainda desafiar a temporalidade, como se cada obra inventasse suas possibilidades pela necessidade de existir e completar a paisagem. Suas constru��es, por isso, nunca foram datadas: elas integram o calend�rio da realiza��o humana, dirigindo a no��o de tempo. A �poca de Niemeyer.

O g�nio do arquiteto se desdobrou ainda em seu modo de trabalhar, que foi mais uma manifesta��o do prazer da amizade. Desde o come�o, sempre em conjunto, fez com que os colaboradores se unissem no prop�sito de realizar grandes intentos e mostrou generosidade em dividir os m�ritos. E fez isso em v�rios contextos sociais e pol�ticos. Esse comportamento o habilitou para a dura arte do di�logo, que permitiu que trabalhasse para governos com os quais n�o concordava e empresas das quais destoava da orienta��o capitalista. Lutou contra o conservadorismo em est�tica e reacionarismo em pol�tica. Sua obra, sempre, saiu �ntegra desses embates.

Homem de ideologia, Niemeyer nunca caiu na armadilha f�cil das chamadas obras sociais da arquitetura simplificada em nome da pobreza de seus destinat�rios e de um certo paternalismo demag�gico. Arquitetura n�o � substituta ou paliativo da d�vida social, de sal�rios injustos e de desrespeito humano. Para o povo, s� o melhor. O mesmo empenho explica sua inclina��o em alguns momentos para a monumentalidade, para a realiza��o do belo em grande escala, democr�tico na origem e na finalidade.

Darcy Ribeiro gostava de afirmar que Niemeyer seria o �nico brasileiro a ser lembrado no s�culo 30. Dizia mais, que ele n�o era inspirado apenas pela sinuosidade das nossas montanhas e pelas curvas femininas: “Oscar � a realiza��o at� o limite da capacidade humana de criar beleza”. � elogio que parece excessivo para um homem que sempre achou que a arquitetura n�o era t�o importante, que os amigos eram a melhor coisa da vida e que � preciso lutar para acabar com as injusti�as. A tarefa de tornar o mundo digno das obras de Oscar Niemeyer ficou como sua principal heran�a.
Enquanto se esfor�a na tarefa de melhorar o mundo, a humanidade ter� pelo menos a sombra das constru��es que Niemeyer criou para encher os olhos de beleza e o cora��o de solidariedade.

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