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Estado de Minas ENTREVISTA/MATEUS FREIRE - 34 ANOS, COMPOSITOR

Paraibano que fez hist�ria em Minas se lan�a como compositor de trilha de sonora em Hollywood

M�sico se muda para Los Angeles e j� trabalha em curta-metragem que ser� lan�ado em dezembro


postado em 06/10/2019 04:00 / atualizado em 04/10/2019 11:47

(foto: Naty Torres/Divulgação)
(foto: Naty Torres/Divulga��o)


Mateus Freire fez hist�ria em Minas. De Jo�o Pessoa, na Para�ba, o jovem come�ou a carreira como violinista e trabalhou por 10 anos na Orquestra Filarm�nica de Minas Gerais. Ele tamb�m ficou conhecido por adaptar m�sicas dos Beatles e Alceu Valen�a para concertos em parceira com a Orquestra Ouro Preto. Agora, Mateus come�a a fazer hist�ria nos Estados Unidos. Decidido, mais uma vez, a mudar o rumo da sua carreira, o m�sico quer ser compositor de trilha sonora. No seu curr�culo, j� tem a participa��o em um filme exibido no Festival de Cannes, na Fran�a, e o convite para trabalhar no curta The gatekeeper, que ser� lan�ado em dezembro. Futuramente, ele pensa em mirar projetos no Brasil.
 
Voc� vem de uma fam�lia de m�sicos, certo?
Minha m�e teve forma��o cl�ssica de conservat�rio e meus pais, na juventude, tinham uma banda de rock and roll chamada Os Diplomatas, muito conhecida no fim dos anos 1960 e come�o dos anos1970. Talvez era a �nica que existia l� em Jo�o Pessoa, chegou a ser conhecida no Nordeste inteiro. Eles n�o puderam seguir carreira de m�sica – a minha m�e virou arquiteta e o meu pai virou engenheiro civil, mas sempre cultivaram o amor pela m�sica. Ent�o, eu e a minha irm�, violinista tamb�m, sempre tivemos muita m�sica dentro de casa, escutando na radiola, assistindo a concertos na televis�o ou escutando a minha m�e tocar piano e flauta. Quando tinha reuni�es de fam�lia em casa, sempre tinha rodas de viol�o. Meus pais me incentivaram muito a come�ar a estudar e fui fazer violino com quatro anos. N�o escolhi o instrumento, mas adorei a ideia.

Quando entendeu que queria seguir carreira de violinista?
Comecei a estudar por influ�ncia dos pais. M�sica ajuda na disciplina e na concentra��o, mas eles nunca acharam que a gente ia seguir carreira. Por volta dos 15 anos, levava o violino bem a s�rio, participava de concursos e j� tinha o desejo de seguir carreira de violinista. Fui fazer vestibular no Rio de Janeiro e tive aulas com Paulo Bosisio, um dos grandes nomes do violino no Brasil e no mundo. Conclu� o bacharelado de m�sica, com especializa��o em violino, na Uni Rio.

E o seu interesse pela composi��o?
Desde pequeno, sempre tive interesses al�m do violino. N�o sabia ler nem escrever, mas j� compunha algumas coisas, fazia algumas melodias e comecei a desenvolver o interesse pela composi��o. L� em Jo�o Pessoa ainda, antes do Rio de Janeiro, participava da orquestra Camerata Bras�lica e come�aram a surgir as primeiras oportunidades. Nessa �poca, fui colocado para fazer arranjos e chegamos a gravar alguns CDs, ent�o tive esta escola informal de arranjo e composi��o. Depois trabalhei em tudo quanto � orquestra. Fiquei oito anos no Rio e mais 10 em Belo Horizonte como violinista. J� estava em posi��o consolidada na Orquestra Filarm�nica de Minas Gerais, n�o tinha nem para aonde ir aqui no Brasil, s� se fosse tentar fora. Paralelo a isso, continuei escrevendo e fazendo arranjos. At� que a Orquestra de Ouro Preto come�ou a precisar de arranjos e comecei a ganhar dinheiro com isso. A nossa parceria deu muito certo e dura at� hoje.

Fale sobre alguns projetos marcantes.
O primeiro trabalho de sucesso foi o concerto dos Beatles, em 2009. Fez tanto sucesso que rodou o Brasil inteiro e fomos tocar em Liverpool, na Beatles Week International. Dois anos veio o convite para fazer Valencianas. Claro que aceitei, fiquei superfeliz, me lembrava da minha m�e tocando viol�o em casa. Como sou de fam�lia nordestina, escutava Alceu Valen�a nas rodas de viol�o. Contei isso para o Alceu e demos muita risada juntos. Era pouco experiente na �poca, ent�o tinha muito medo, era muita responsabilidade. Todo mundo conhece Alceu, queria fazer um bom traba- lho. Estreamos em 2012 e Valencianas ganhou o Brasil e est� sendo tocado at� hoje. Em 2015, ganhou como melhor CD do ano no Pr�mio da M�sica Brasileira – assinei todos os arranjos e compus a m�sica de abertura, a minha primeira composi��o. Agora mesmo estou escrevendo Valencianas 2, que vai ser gravado no in�cio do ano que vem, em Portugal. Depois deste sucesso todo, comecei a ser conhecido no Brasil tamb�m como arranjador e compositor e come�aram a surgir outros convites que nem imaginava na �poca. Deram-me a chance na Orquestra da Petrobras, em que tinha trabalhado como violinista e voltei quase 10 anos depois como arranjador. Era o projeto Arca Sinf�nica, em que fizemos a adapta��o do CD Arca de No�. Pegamos as m�sicas de Vin�cius de Moraes e fizemos um musical com elas. Senti o mesmo medo na �poca, mas ter sido violinista e trabalhado quase 20 anos nas orquestras do Brasil me ajudou muito na composi��o. A Orquestra da Petrobras continuou me chamando para fazer Saltimbancos sinf�nico, Bal�o M�gico sinf�nico, a� comecei a dividir a carreira entre tocar e escrever. Inclusive, acho que, num determinado momento, comecei a gostar mais de escrever que de tocar, porque era sempre novidade, tem a quest�o da colabora��o. Violinista tem carreira solit�ria, voc� est� com o instrumento ali, sempre seguindo a fila na sua frente ou o maestro, n�o tem muita liberdade. � como se fosse um ex�rcito ou time de futebol.
 
Como foi para voc� trabalhar com obras de grandes compositores?
Facilitou muito ter contato com m�sica a vida inteira. Alceu Valen�a, Beatles, Vin�cius de Moraes, j� conhecia muito todos eles, desde pequeno, mas tem todo um trabalho de pesquisa. No caso dos Beatles, fui pesquisar um jeito de escrever para que o p�blico n�o sentisse falta das vozes. Os Beatles me ajudavam muito, porque as pessoas conhecem tanto as m�sicas que v�o cantando junto na cabe�a delas. Ent�o, � quase como se tivesse um cantor ali na frente.

Por que quis se especializar em trilha sonora?
Isso � outra hist�ria. Desde pirralho, assistia a filmes com a minha m�e. N�o s� os cl�ssicos da Disney, mas E.T., Jurassic Park, Star wars e alguns filmes um pouco mais cabe�a, tipo Cinema Paradiso, que marcou muito a minha inf�ncia e um dos motivadores de eu ter escolhido o novo desafio da trilha sonora. Ouvia as m�sicas dos filmes e ficava apaixonado, achava aquilo lindo. Na �poca, nunca imaginava que iria escrever, mas a composi��o foi ocupando uma parte maior da minha vida. Chegou o momento em que tive que decidir e tive o apoio da minha fam�lia. Sentia-me mais realizado escrevendo que tocando. Tinha medo de desistir da carreira na qual investi a vida toda, mas tomei coragem e pedi minha demiss�o da Filarm�nica em 2016. Queria realizar este sonho de estudar trilha sonora. Acho que, antes de sonhar em ser violonista, sonhava com trilhas sonoras, mas nem sabia que um dia ia ter contato com isso. Na �poca, comecei a procurar faculdades fora do Brasil, porque no Brasil n�o existe, e achei este mestrado na University of Southern California (USC) pesquisando na internet. Decidi vir conhecer pessoalmente, pude assistir a algumas aulas como ouvinte e fiquei muito interessado. Voc� tem que fazer prova para ser selecionado, e � muito disputado. S�o 20 vagas por ano, uma turma s�. Achava que n�o ia passar, porque o mundo inteiro disputa. Neste ano, concorri com quase 500 pessoas. Era o �nico brasileiro da sala, tinha peruano, colombiana, americanos, alem�es, franceses, italianos, ingleses e chineses, era gente do mundo inteiro. Depois fui tomar conhecimento de que este curso � considerado o melhor e maior do mundo. Ent�o, vim fazer este mestrado de um ano e cheguei aqui sem experi�ncia nenhuma. Nunca tinha estudado filme, trilha sonora.

Como voc� foi parar no Festival de Cannes?
No fim do mestrado, aconteceu algo inusitado. T�nhamos que trabalhar em conjunto com a escola de cinema, que vinha com os filmes para a gente escrever a trilha sonora. T�nhamos que fazer pelo menos cinco, acredito que tenha feito oito. Um desses projetos, bem no fim do curso, naquela loucura de provas finais, foi selecionado para Cannes. O festival era na outra semana. Sei que na �poca pensei: eu vou e dane-se, depois vejo como entro de volta nos Estados Unidos. Era uma oportunidade �nica de participar do festival como m�sico. Foi uma experi�ncia incr�vel chegar � festa e estar em contato com o mundo inteiro. Todo mundo da ind�stria estava l�, Hollywood inteira. Quentin Tarantino, Leonardo DiCaprio, Brad Pitt, Sylvester Stallone e eu no meio no dia da exibi��o do filme. Foi a maior emo��o do mundo ver meu nome na tela de cinema na Fran�a. Aquilo valeu todo o meu investimento e me deu gostinho de quero mais. O filme It happened one night � muito centrado na quest�o do racismo, do preconceito contra a mulher, fala de aborto, � um filme bem pol�tico neste sentido, com uma carga emocional forte. Para mim � �timo. Quanto mais carga emocional, mais posso traduzir para a m�sica.

Como surgiu o convite para fazer a trilha sonora do filme The gatekeeper?
O convite surgiu atrav�s do curso, o nosso portf�lio fica estampado no site da universidade. N�o conhecia o diretor Jordan Martinez. Ele entrou na p�gina, gostou da minha hist�ria, do meu trabalho e me chamou para o projeto. � o meu primeiro grande projeto como compositor de filmes. O curta tem quase 20 minutos e vai ser lan�ado em dezembro. � um drama de guerra, que conta a hist�ria de um ex-soldado americano que esteve na Guerra do Iraque e volta cheio de traumas, n�o consegue se adaptar � vida cotidiana e acaba se suicidando. � um tema bem sens�vel nos Estados Unidos, ent�o tem uma parte de carga emocional, mas tamb�m tem muita a��o. Quando vi o primeiro corte, j� fiquei muito impressionado, ele � um diretor muito talentoso, estou apostando muito nele e espero que tenha muito sucesso no trabalho. Nesta profiss�o, temos que apostar nos diretores, eles que v�o nos chamar para futuros trabalhos. No caso do John Williams, Steven Spielberg o chamou para fazer Tubar�o e ele fez aquela trilha ic�nica. A parceria ficou para o resto da vida.

Como funciona o processo de cria��o de uma trilha sonora?
O meu trabalho de compositor � entrar na cabe�a do diretor e chegar o mais perto poss�vel da ideia dele. Leio o roteiro todo, depois sento para conversar com o diretor e localizar no filme onde ele quer que a m�sica entre e saia. Quando vou escrever a trilha sonora, tenho que respeitar tr�s elementos: di�logos, efeitos sonoros e m�sicas. Nunca posso sobrepor um ao outro, tenho que saber equilibrar a trilha sonora com tudo o que est� acontecendo ali dentro. Tem tamb�m o trabalho do compositor, de escrever as m�sicas. Fa�o digitalmente para o diretor ouvir comigo e, assim que ele aprovar, vou para o papel e a caneta transcrever tudo para a orquestra. Tenho que escrever todas as partituras, depois contratar a orquestra inteira. Vou para o est�dio e fa�o papel de maestro. Depois que gravo tudo, vou para o est�dio mixar e masterizar. A� sim terminei a trilha sonora.

Na sua opini�o, qual filme tem a trilha sonora mais marcante de todos os tempos?
Duas trilhas me marcaram muito, desde a minha inf�ncia: a do Star wars e a do Cinema Paradiso. John Williams e Ennio Morricone s�o meus �dolos.

Qual � o seu sonho?
Meu sonho � viver profissionalmente neste meio. Conseguir projetos como este de agora, que v�o nutrir minha liberdade art�stica e me permitir estar inserido em um processo de cria��o, isso � o mais gostoso. Espero que consiga ter certa estabilidade e dividir meu tempo entre Estados Unidos e Brasil. Minha fam�lia est� toda a�, n�o quero ficar longe.

Voc� se mudou definitivamente para Los Angeles. N�o existe mercado no Brasil?
No Brasil, n�o existe curso de trilha sonora e o mercado n�o se compara ao daqui, que � gigantesco. Aqui n�o falta oportunidade. Los Angeles � o centro do cinema mundial. Se conseguir fazer sucesso aqui, fa�o sucesso em qualquer outro canto. Mas espero que, num futuro pr�ximo, apare�a algum convite do Brasil.

O que a m�sica significa para voc�?
M�sica para mim � tudo. � o meu meio de vida, meu passatempo, minha paix�o. Faz parte do meu dia como profiss�o e como forma de relaxamento. M�sica tamb�m me traz mem�rias da minha m�e, que faleceu, e de outras pessoas que passaram pela minha vida. Desde crian�a, � como se fosse uma pessoa da fam�lia. Deixa-me muito feliz conseguir viver de m�sica. Realizei o sonho dos meus pais, que tiveram que seguir outras carreiras, e para mim � uma realiza��o fazer o que amo.

Qual � a trilha sonora da sua vida?
Depende. J� tive fases de escutar mais MBP, mais rock, hoje em dia estou escutando mais trilhas sonoras. Como tive contato com todo tipo de m�sica, sou muito ecl�tico. Mas, se fosse escolher um estilo preferido, diria que � a m�sica cl�ssica, com a qual tive mais contato.

Voc� tem tocado violino?
Profissionalmente, nunca mais toquei, desde que pedi demiss�o da Filarm�nica, em 2016. Toco de vez em quando por hobby ou gravando as minhas trilhas sonoras. Mas vou guardar o meu violino para o resto da vida. Muita gente pergunta por que n�o vendo. Sou apaixonado por ele e, mesmo n�o tocando profissionalmente, ele n�o sai de perto de mim. 


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