
A empres�ria Fl�via Carvalho recebeu influencia de seus pais e por algum tempo ficou dividida entre o com�rcio de moda, exemplo de sua m�e, e a arquitetura, profiss�o de seu pai. A necessidade de se relacionar com outras pessoas falou mais alto e decidiu abrir a Tahari, loja de moda feminina, que completa 30 anos. Sempre antenada no que h� de mais novo no mundo, Fl�via foi atualizando seu neg�cio � medida que o mundo foi mudando, sempre com uma grande paix�o por seu trabalho. Durante toda essa trajet�ria o que mais caracteriza a empresa � a constante renova��o. Come�ou com importados, com a desvaloriza��o da moeda local, mudou o perfil e passou a trabalhar com a moda nacional, mudou de endere�o e hoje est� mais atual que tudo, com servi�os delivery e presen�a marcante nas redes de relacionamento.
Qual a sua forma��o?
Sou arquiteta de forma��o, pelo Izabela Hendrix e como meu pai, Ney Carvalho, tamb�m � arquiteto, trabalhei com ele por dois anos.
E o que te levou para a moda?
Minha m�e, Mar�lia – mas todos a conhecem por Lila –, tinha uma loja chamada Dengo, na Pampulha, em sociedade com minha tia Beatriz Barbosa. Mas minha m�e parou logo de trabalhar e eu fiquei com essa minha tia, desde os meus 17 anos. Trabalhava de manh� na loja, de tarde fazia est�gio com meu pai e de noite eu estudava. Comecei a namorar o Daniel Medrado, filho da Maria Eunice Medrado Aroeira, que tinha uma loja na sua casa. Quando ela adoeceu pediu para eu ficar na loja com ela durante seu tratamento. Fiquei l� por tr�s anos. Casei, separei, enviuvei e resolvi abrir uma loja, porque eu j� estava na moda. Era uma coisa que me atra�da e me dava esse relacionamento, que era uma coisa que me alimentava naquele momento.
E parou totalmente com a arquitetura?
Sim. Parei, mas a arquitetura est� muito associada � moda. Gostei muito do tempo que trabalhei com meu pai, mas o que me afastou da profiss�o foi o isolamento. Naquela �poca o arquiteto n�o era como hoje, que al�m do projeto tamb�m faz a decora��o. Antes, ele n�o participava com o cliente, ele fazia o projeto. Isso, h� 32 anos. Como eu gosto muito de gente, vi que precisava experimentar esse lado da moda. Mas n�o sou da �rea de cria��o da moda, sou uma comerciante.
Trabalho dobrado para colher o mesmo resultado. Mesmo assim, amanhe�o feliz vindo trabalhar. L�gico que tudo tem um ciclo, uma hora o meu vai se fechar
Com tato bom gosto, porque n�o se arriscou na cria��o?
Sei comprar e vender. Sou boa nisso. N�o sei fazer estilo, produzir uma roupa. Jamais. Sei fazer uma curadoria, sei fazer uma sele��o e sei o que � comercial. Esse foi o grande segredo da Tahari por 30 anos. Nunca lancei moda, n�o � minha praia. Minha �rea � o com�rcio. Sei comprar e vender.
De onde voc� acha que veio essa veia de comerciante e de curadora?
Nesse aspecto a arquitetura soma. Estamos falando de equil�brio, propor��o, harmonia, combina��o de cores. Do mesmo jeito que na moda temos pessoas b�sicas, temos arquitetos e decoradores b�sicos, que s�o aquelas pessoas clean. E temos as ousadias. Para mim a arquitetura e a moda conversam, est�o muito ligadas. Porque vemos moda na arquitetura. As coisas voltam, tem sempre uma reciclagem, um casamento. N�o � como uma medicina e a moda. O com�rcio me pegou.
Seu pai n�o ficou chateado de voc� “abandon�-lo”?
N�o, ele entendeu, e muito rapidamente eu tive uma resposta. Tudo o que voc� faz tem que ter feedback do p�blico, seja na �rea que for, n�o adianta s� desejar. Eu tive uma resposta positiva muito r�pido.
A primeira Tahari foi na Pampulha?
Sim, na casa onde era a loja da minha m�e. Era no fundo da nossa casa, passava a quadra e tinha a loja. Morei na Pampulha por 30 anos. Comecei a loja, j� em sociedade com minha irm�, Lulu Abreu.
Por que ela saiu?
Lulu foi minha s�cia na loja por 20 anos. Nos cinco �ltimos anos da loja em Lourdes, ela manifestava constantemente o desejo de sair e eu lutando para ela ficar. Chegou uma hora que ela falou que n�o estava feliz e queria fechar a loja, mas ainda n�o estava na minha hora. Decidi tentar sozinha. Ela fazia o financeiro e eu o comercial. Propus tentar aprender o financeiro e ver como eu me virava, e deu certo, n�o tive a menor dificuldade.
Quanto tempo depois abriu a de Lourdes?
Depois de tr�s anos, abrimos uma loja na Rua Tomas Gonzaga, onde ficamos por dois anos, mas a loja ficava no piso inferior, sempre que chovia alagava. Mudamos para uma casa enorme na Rua Cear�, no bairro Funcion�rios, onde ficamos por oito anos. De l� fomos para o Bairro de Lourdes. Trabalhamos s� com importados por 15 anos.
Quando mudou esse nicho?
Quando teve a virada do d�lar. Tive que repensar tudo. E nessa mesma �poca a ind�stria brasileira teve um boom de moda, porque teve o fechamento de muitas lojas de venda de importados. Eu fazia importa��es gigantescas. Foi maravilhoso, mas ficou impratic�vel. E a moda nacional aprimorou e cresceu muito em estilo. No primeiro momento fiz um mix de importados e nacional. Depois fiquei basicamente com nacional.
Qual � a porcentagem de importa��o hoje?
Hoje, apenas 10% do mix de produtos. N�o trabalho com grife nenhuma, temos que escolher uma fatia do bolo.
Qual � o seu foco?
Uma roupa de qualidade, atemporal, que n�o seja modinha. Minha importa��o n�o tem nome e sobrenome, ela vende por ser um produto bom e diferente.
Por que mudou de Lourdes?
Porque o propriet�rio pediu o im�vel. Hoje, o local n�o seria interessante para a loja porque virou uma regi�o de muito bares e restaurantes. Na mesma �poca minha quis sair da sociedade. Fiz um happy hour junino, que fa�o h� 17 anos, e comuniquei que fecharia a loja de Lourdes, e continuaria com a Pampulha.
E o que te fez vir para o Belvedere?
Eu tinha um �nico desejo, que era este espa�o onde estou hoje. N�o me serviria outro. H� nove anos o Belvedere n�o tinha nada. A Seis Pistas era simplesmente seis pistas, n�o tinha uma loja. Neste quarteir�o s� tinha as lojas dessa galeria, o Banco do Brasil e o Nectar da Serra, e eu tinha o desejo de ter essa loja e ela caiu na minha m�o tr�s meses depois que eu falei em fechar a loja de Lourdes.
Hoje o mundo � muito digital. Como migrou para a internet?
Temos que estar abertas a novas experi�ncias, porque se voc� n�o se adequar, est� fora do mercado. Tenho uma pessoa que me ajuda nesse marketing digital. Ela disse que era importante eu aparecer usando roupas da loja, e eu n�o queria de jeito nenhum, mas tive que ceder. Fa�o a fotos para o Instagram xingando o tempo todo, mas elas me obrigam.
E a roupa que vai at� acasa da cliente?
Hoje isso � muito usado.A Tahari foi das pioneiras nesse servi�o. Criamos o delivery h� mais de 15 anos.
Come�ou o delivery por demanda de cliente ou foi inven��o sua?
Nessa �poca n�o usava isso, e funciona muito bem. Essa venda faz diferen�a na loja, apesar de eu considerar que o cliente aqui dentro tem mais op��es e a ajuda da gente. Mas temos que adaptar ao mercado. � igual a digital influencer e um profissional de marketing.
Voc� trabalha com esse modelo?
Precisamos ter essas pessoas. Essa mudan�a do neg�cio come�ou h� cinco anos, mas fortemente foi de dois anos para c�. Veja quantas influencers surgiram aqui na cidade, te falo de cara 15 fortes, n�o s� de moda, mas de life style. Elas n�o vendem s� moda, vendem uma maneira de viver. Assim est� vivendo o mercado e a gente correndo atr�s para se adaptar. Eu comecei este ano.
D� resultado?
Esse trabalho de t� visibilidade. N�o quer dizer que voc� ganhe um volume de venda consider�vel, mas voc� passa a ser vista, e ao ser vista, passa a ser desejada. O que n�o � visto, n�o � desejado.
Consegue medir a diferen�a dos posts feitos por voc�s, dos feitos pela digital influencer?
Como tudo cansa, a m�dia exaure as pessoas. Em mar�o do ano passado contratei a menina do marketing, ela disse que eu precisaria aparecer, eu, Fl�via. Eu era a cara da loja e a idade da cliente que eu atendo. N�o vendo roupa para meninas de 15 anos, melhor, at� vendo roupa de festa, um jeans, mas eu n�o tenho um croped, uma hot pants, porque n�o e o meu p�blico-alvo. Resisti muito, mas encarei o desafio. Nos cinco primeiros meses era a conta de postar e as pessoas ficavam loucas. Depois, eu n�o aguentava ver minha cara ali, nem o cliente. Ele cansa de te ver, n�o � mais novidade. Tenho uma digital influencer que faz roupas de provador, mas se ficar s� ela, tamb�m vai cansar.
Ficamos um pouco ref�ns dessa m�dia?
Sim, ela � necess�ria, � o que chamamos de fast fashion, que tamb�m exaure as pessoas. Falei esta semana com as meninas que trabalham comigo que acabou foto em instagram. Quando quiserem vender alguma coisa devem fazer v�deo no instagram, falar. N�o devemos mais escrever, mas pegar a roupa, fazer um v�deo mostrando e falando da roupa, tanto no instagram quando pelo WhatsApp. A voz emociona, se a pessoa diz “roupa maravilhosa” com uma intensidade, n�o � o mesmo que escrever a palavra. Deixou de ser mensagem para ser �udio, de foto para video. N�o sei qual ser� a pr�xima mudan�a, mas temos que estar prontas e abertas para ela, se n�o, estaremos fora do mercado.
Como � fazer 30 anos de loja?
Para Belo Horizonte, que eu me lembre, da minha �poca � s� eu e a Mary Caetano. � uma satisfa��o e gratid�o, mas posso falar que � um grande esfor�o, e muita determina��o. Temos que amar e ser perseverantes.
A que voc� credita essa longevidade?
Ao trabalho, emprenho, persist�ncia e o fato de eu nunca achar que sou a “dona”, at� hoje tenho vontade de servir e me alegro com isso. Interpreto a loja assim, estou aqui para te atender. Foi isso que fez a loja durar tanto tempo, eu n�o achar, hoje nenhuma que estou acima das clientes e da equipe.
O que te leva a trabalhar at� hoje?
Porque tenho uma satisfa��o e uma motiva��o enorme. Ainda n�o chegou a minha hora de fechar. Uma de minhas vendedoras me pergunta isso toda a semana. Eu ponho a m�o na massa. Se no fim do dia a loja est� suja e a faxineira n�o vem no dia seguinte, eu pego um pano de ch�o e passo na loja toda, pego o aspirador e dou a limpeza. Se eu estiver atendendo, marco bainha das clientes at� hoje. Aqui � meu local de trabalho, me realizo aqui dentro.
Tem sucessor para a loja?
N�o, ningu�m, meus filhos n�o querem.
Como consegue adequar a presen�a na loja com todas as viagens para comprar produtos e a fam�lia?
Fa�o tudo sozinha, Rio, S�o Paulo, exterior, todas as feiras. Tem uma demanda de tempo. �s vezes as pessoas falam que eu estou sumida, n�o � isso. Tenho duas lojas das quais sou compradora, administrativo e financeiro. Ficou duas tardes na semana na loja da Pampulha. Moro na Seis Pista, muito perto dessa loja, mas a Pampulha me desanima um pouco por causa da dist�ncia. Quando amea�o fechar l� as clientes choram amea�am protestar, invadir a loja e que eu teria que fechar a loja com elas l� dentro.
Tem tempo para o lazer?
Tenho minhas prioridades e sou focada. Qualquer dia da semana, se algu�m me chamar para tomar um caf�, eu acho um intervalo para estar com os amigos. N�o abro m�o, em hip�tese nenhuma, de estar com amigos em detrimento do trabalho. Mas, quando estou aqui dentro, estou trabalhando. Guilherme (Teixeira)ama viajar, ent�o viajamos sempre. Eu me organizo, deixo tudo abastecido e vou. Tenho uma vida paralela � Tahari, n�o me resumo na loja. O que me move � equil�brio e o foco.
Como conseguiu esse equil�brio e n�o se deixou ser dominada pelo seu neg�cio?
Nessa quest�o o Guilherme teve grande influencia. Quando casamos ele quis ter logo os dois filhos e queria que eu parasse de trabalhar. Aprendi a dividir meu tempo para ter a loja e o casamento. N�o sou centralizadora, dou autonomia para as pessoas que est�o comigo. Elas t�m responsabilidade, por isso eu posso sair. Mas eu trabalho dobrado para colher o mesmo resultado. Mesmo assim amanhe�o feliz vindo trabalhar. L�gico que tudo tem um ciclo, uma hora o meu vai fechar, mas n�o me cobro mais. Acordar feliz para vir trabalhar � o que justifica.