
O orgulho sobe � cabe�a, transforma o visual feminino e mostra que, quanto mais natural, melhor. Depois de anos e anos vivendo como escravas da chapinha, do formol e do cabelo liso, cada vez mais brasileiras assumem os cachos e balan�am a cabeleira proclamando aos ventos que fios crespos s�o, sim, muito bonitos. Decididas a fazer do ato uma mudan�a de comportamento, e n�o simples tend�ncia de moda, dezenas de mulheres participaram, no domingo, em S�o Paulo, da 1ª Marcha do Orgulho Crespo, para lembrar o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha e alertar contra a discrimina��o, o racismo e o preconceito. Muitas mineiras gostaram da iniciativa e j� est�o firmes nessa nova onda, “que veio para ficar com for�a total”, na opini�o da dona de sal�o de beleza e estudiosa de tricologia, Betina Borges.
Formada em servi�o social e se especializando em gest�o de pol�tica p�blica, ra�a, g�nero e etnia, La�s Esther Cardoso Silva, de 24 anos, moradora de S�o Jo�o del-Rei, na Regi�o do Campo das Vertentes, diz que sempre houve uma imposi��o de branqueamento na sociedade brasileira. “Minha fam�lia, pelo lado materno, � de brancos, enquanto, pelo lado paterno, de negros. Como convivia muito com o lado materno, fiz chapinha at� os 15 anos. Depois, deixei natural”, conta a jovem, que desenvolve um trabalho no distrito de S�o Miguel Arcanjo do Cajuru, a 36 quil�metros da sede municipal. “Os negros predominam na comunidade. Ent�o, o objetivo � valorizar a hist�ria e o fortalecimento da cultura, principalmente em a��es com os jovens. Por muito tempo, o negro foi considerado feio e o branco, bonito”, diz a pesquisadora. Em muitas conversas, ela j� falou com a garotada que o cabelo crespo dos negros � devido �s condi��es clim�ticas da �frica.
Especialista no assunto, Betina Borges est� certa de que “� muito importante essa consci�ncia e transforma��o”. “Somos brasileiras, fruto da mistura de ra�as. Nosso cabelo � completamente diferente do das europeias”, afirma, com a experi�ncia de 35 anos de trato dos cabelos, tendo estudado na Carolina do Sul, nos Estados Unidos. “O natural � muito mais bonito. As mulheres, n�o s� as negras, que t�m cabelo assim, devem ficar satisfeitas. Muitas louras chegam aqui no sal�o, depois de tempos de qu�mica, e contam que nem sabem mais como eram. Pedem para voltar ao natural e digo que o �nico jeito � a ‘Vitamina T’. A letra, nesse caso, � de tesoura”, explica a bem-humorada Betina, esclarecendo que � preciso cortar para voltar ao normal. “J� usei meu cabelo de v�rias maneiras, agora � desse jeito”, diz a empres�ria, passando as m�os nos cabelos.
Cabeleireira e professora do curso de tran�as no sal�o Beleza Negra, na Floresta, na Regi�o Leste de Belo Horizonte, Adriana Assis, casada, conta que assumiu os fios crespos e vai mant�-los assim. “Antes eu alisava e fazia escova, chegava a gastar R$ 70 por semana e perdia muito tempo no sal�o. Al�m disso, com a qu�mica o cabelo n�o pode ver chuva, sem falar que atrapalhava na atividade f�sica”, revela Adriana. No entanto, as especialistas orientam mulheres e homens cacheados sobre a necessidade de manuten��o permanente na cabeleira, com produtos de qualidade e acess�rios apropriados.
ACEITA��O “Lidar com o cabelo natural � bem mais f�cil, consigo arrumar sozinha, n�o dependo de ningu�m. E � um cabelo exclusivo. Voc� chega num lugar e pouca gente tem igual. Em casa, meu marido adora”, gaba-se Adriana. Ao longo dos anos, a cabeleireira viu situa��es extremas em clientes devido ao uso excessivo de qu�mica, como a perda completa dos fios. “Como profissional, afirmo que a escova progressiva, quando malfeita, faz estragos. Muita gente usa verdadeiras bombas qu�micas, com formol, que � proibido pela Agencia Nacional de Vigil�ncia Sanit�ria (Anvisa)”.
Adriana destaca que o ato de assumir os fios crespos, que, para muitas mulheres, passa por um per�odo de aceita��o, vem sendo discutivo e apresentado nas novelas. “Outro dia, num cap�tulo, a m�e negra conversou com a filha, que havia sofrido bullying na escola pelo volume dos seus cabelos. Com delicadeza, disse que a menina deveria se orgulhar do seu tipo f�sico. Eu, por exemplo, n�o gostava muito do meu cabelo em fun��o de toda a imposi��o cultural.”
A professora Aparecida Maria Gon�alves de Almeida, moradora do Bairro S�o Geraldo, na Regi�o Leste de BH, tamb�m resolveu cuidar dos cachos. “Outro dia, minha netinha falou que eu estava muito descabelada. Ent�o resolvi tomar uma provid�ncia e tratar dos fios crespos. Meu marido adora o cabelo natural, tem horror a escova”, afirma a professora que, na tarde de ontem, comprava xampu espec�fico para seu tipo de cabelo. Enquanto isso, o mercado se aquece e atrai cabeleireiros com cursos espec�ficos. Loura de cabelos escorridos, Gabriela Fi�za, de 28, faz curso de tran�as e megahair. “Gostaria de ter cachos, tentei, mas n�o d� certo”, lamenta Gabriela, ao mostrar as pontas bem lisas. “Gosto muito do cabelo afro. A cabeleira cacheada, com tran�as na lateral, fica muito legal”, acrescentou.