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Estado de Minas

Decis�o de liberar envolvidos em acidentes de tr�nsito com mortes levanta pol�mica

Concess�o de habeas corpus ao motorista que atropelou e matou casal com carro turbinado revolta parentes das v�timas e reaviva debate sobre a soltura dos acusados nesse tipo de crime


postado em 13/08/2015 06:00 / atualizado em 13/08/2015 11:13

Kamila, irmã da confeiteira Kátia, que morreu no acidente da Américo Vespúcio, com a sobrinha Giovana, que ficou órfã de pai e mãe: sentimento de impunidade(foto: Túlio Santos/EM/DA Press)
Kamila, irm� da confeiteira K�tia, que morreu no acidente da Am�rico Vesp�cio, com a sobrinha Giovana, que ficou �rf� de pai e m�e: sentimento de impunidade (foto: T�lio Santos/EM/DA Press)

“Estou no Brasil. Aqui nada acontece”. A declara��o do franc�s Olivier Rebellato, de 20 anos, que em 2009 dirigia embriagado pela Savassi, Regi�o Centro-Sul de Belo Horizonte, avan�ou um sinal vermelho em alta velocidade e provocou um acidente de tr�nsito que deixou cinco pessoas feridas, uma delas em estado vegetativo, reflete bem o sentimento de muitos parentes de v�timas de acidente: o de impunidade. No caso do franc�s, a previs�o dele estava certa. Olivier foi preso em flagrante no dia do acidente, denunciado pelo Minist�rio P�blico, mas teve a liberdade provis�ria seis meses depois. Com o passaporte devolvido, ele voltou para a Fran�a. O processo foi arquivado. Conclus�o: o r�u saiu impune.

A descren�a na Justi�a aumentou ainda mais a dor dos parentes da confeiteira K�tia Aisten de Assis, de 27, e do marido dela, o vigilante Paulo Medeiros Mendes, de 29. O casal morreu na noite do �ltimo dia 3, em um acidente provocado pelo motorista Jos� Alm�rio de Amorim Neto, de 35, solto pela Justi�a na madrugada de ontem depois de passar nove dias na pris�o. O acusado havia instalado um turbo no seu Gol, para participar de uma competi��o, e testava o equipamento dirigindo a mais de 150km/h, segundo testemunhas (o laudo pericial ainda n�o ficou pronto), pela Avenida Am�rico Vesp�cio, no Bairro Cachoeirinha, Regi�o Noroeste de BH, quando perdeu o controle da dire��o, passou por cima do canteiro central e bateu no Palio onde estavam as v�timas.

A decis�o de colocar o motorista em liberdade foi do juiz auxiliar do 1º Tribunal do J�ri, Silvemar Jos� Henriques Salgado. O magistrado estipulou, ainda, pagamento de fian�a no valor de 50 sal�rios m�nimos (R$ 39,4 mil) e determinou a suspens�o da carteira de habilita��o de Jos� Alm�rio.

Apesar da gravidade do acidente, que ainda ser� julgado, o magistrado explicou em sua decis�o que a lei autoriza a concess�o da liberdade provis�ria quando n�o h� risco para a ordem p�blica ou ao andamento do processo. Silvemar disse que a repercuss�o do caso “causou grande indigna��o, clamor p�blico e como��o social”, mas que isso n�o � motivo para que a pris�o do acusado seja mantida.

Jos� Alm�rio foi indiciado pela Pol�cia Civil por homic�dio com dolo eventual, quando se assume o risco de matar, e o fato de ele ter sido solto revoltou os parentes das v�timas. “N�o � apenas um crime de homic�dio cometido por um acidente ou uma fatalidade. A pessoa assume o risco de produzir o resultado. Isso est� no artigo 18 do C�digo Penal. No dolo, ou ele tem a inten��o de matar ou assume o risco de produzir o resultado”, explica o delegado coordenador de Opera��es Policiais do Detran-MG, Anderson Alc�ntara. Muitos delegados t�m uma interpreta��o nesse sentido, segundo o chefe do COP, e alguns ju�zes e tribunais j� referendam esse tipo de entendimento. “Mas a maior parte n�o entende dessa forma e sim que todo acidente e crime de tr�nsito tem que ser disciplinado pelo C�digo de Tr�nsito Brasileiro (CTB)”, disse o policial. No caso de Jos� Alm�rio, a pena seria muito maior se ele fosse julgado pelo C�digo Penal. A pena pelo homic�dio doloso, por assumir o risco de produzir o resultado, seria de seis a 20 anos de reclus�o. J� no homic�dio do C�digo de Tr�nsito, a pena � deten��o de dois a quatro anos, o que dificilmente leva o r�u � pris�o.

REGIME ABERTO Para o presidente da Comiss�o de Assuntos Penitenci�rios da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MG), Anderson Marques, o homic�dio culposo (sem inten��o de matar) n�o resulta em pris�o. “Se o infrator for condenado ser� no regime aberto. N�o h� que se falar em pris�o no decorrer do processo”, explica. J� no doloso, acrescenta, pode ser gerada pris�o no decorrer do processo e ap�s a senten�a transitada em julgado. Procurado, o advogado de Jos� Am�rio n�o foi encontrado pelo Estado de Minas para comentar o assunto.

Uma fam�lia destru�da

Caet� – Da frente da casa, de portas e janelas de um vermelho desbotado, d� para ver o cemit�rio, ouvir as rezas no vel�rio e enxergar o topo da Serra da Piedade. Sentada na escada, olhando a tarde, Kamila Fernanda de Assis Oliveira abra�a a sobrinha Giovana e pensa na irm� K�tia Aisten de Assis, que morreu h� 10 dias, aos 27 anos. “Nosso sofrimento s� aumenta. � um absurdo esse homem estar solto. Matou duas pessoas, deixou dois �rf�os, Giovana, de 9 anos, e Jo�o Pedro, de 4. Ser� que a vida vale R$ 40 mil?”, pergunta Kamila, com voz firme e olhos de descren�a. No dia 3, enquanto testava o turbo do seu carro, na Avenida Am�rico Vesp�cio, na Regi�o Noroeste de Belo Horizonte, Jos� Alm�rio de Amorim Neto, de 35, invadiu a contram�o e bateu no Palio no qual estavam K�tia e o marido Paulo Guilherme Medeiros Meireles, de 29. Ontem, Jos� Alm�rio foi liberado pela Justi�a e deixou o Pres�dio Inspetor Jos� Martinho Drummond ap�s pagar fian�a de 50 sal�rios m�nimos, valor correspondente a R$ 39.400.

“O sentimento aqui � de revolta. Caet� est� revoltada, Belo Horizonte est� revoltada”, diz Kamila, casada, residente em Guarapari (ES) e h� dois meses na casa da m�e, Fl�via Cristina Gon�alves, de 45, em Caet�, na Grande BH. “Meu marido ficou em Guarapari, mas agora estou sem condi��es de voltar para l�. Toda a fam�lia se desestruturou. Minha m�e teve um AVC (acidente vascular-cerebral) em 16 de novembro e n�o posso deix�-la”, conta. Para preservar a sobrinha, Kamila revela algumas partes da dor da fam�lia longe da garota, que, de vez em quanto, se aninha em seus bra�os.

Ontem, logo de manh�, Kamila diz que come�ou a receber telefonemas de amigos sobre a decis�o judicial. “Foi um baque violento, a gente nem acreditou. Falaram que o crime era inafian��vel, que a velocidade do carro era de 170 quil�metros por hora. Desse jeito, vamos acabar desistindo da Justi�a. Esse homem assumiu o risco de matar, n�o pode ficar impune”, desabafou. Nesse momento, toda a fam�lia est� reunida para dar conforto a Giovana e Jo�o Pedro. “N�o � f�cil controlar duas crian�as. Minha sobrinha entende tudo. Outro dia achou um retrato do pai e chorou muito � noite. Estamos fazendo o poss�vel para suprir a falta dos pais.”

�RF�OS Com seu vestido azul, a menina brincava na tarde de ontem e �s vezes chegava no port�o, sob o olhar vigilante da tia. “O menino est� na escola. Por enquanto, eles v�o ficar aqui. Est�o aqui minha av� Tereza, madrinha de Giovana, o Vicente, o tio Luiz, minha m�e, meus irm�os Erick, Karla e Karen. Nosso maior desafio, o tempo todo, � explicar a um menino e a uma menina que eles v�o viver sem pai para sempre”, lamenta Kamila.

Giovana volta para mais um abra�o, e, dessa vez, se agarra com for�a � tia, numa demonstra��o de que, de agora em diante, ter� que contar com outros afagos, carinhos e cheiros. De repente, as duas se levantam e v�o se encontrar com Fl�via, servidora municipal afastada desde o AVC. Com ajuda de uma muleta, a av� dos pequenos �rf�os diz n�o carregar �dio no cora��o. “Somos evang�licos e acreditamos que Deus vai agir”, acredita.

Ver galeria . 8 Fotos Condutor de um Gol disse que fazia testes em dispositivo de
Condutor de um Gol disse que fazia testes em dispositivo de "turbo", instalado no carro. Testemunhas disseram que ele estaria em alta velocidade. Ve�culo bateu em meio fio, girou no ar e caiu em cima de um Palio, que seguia no sentido contr�rio (foto: Marcos Vieira/E.M./D.A Press )


Tr�s perguntas para

FL�VIA CRISTINA GON�ALVES, DE 45 ANOS, M�E DE K�TIA AISTEN DE ASSIS

1 - Como a senhora recebeu a not�cia da libera��o de Jos� Alm�rio de Amorim Neto?
Ele est� solto e, n�s, presos � dor, � saudade. Estamos muito tristes, revoltados, falaram tanto que era um crime inafian��vel.

2 - A senhora esperava tal decis�o da Justi�a?
A gente � m�e. No fundo da alma, n�o tinha esperan�a.

3 - O que a fam�lia pretende fazer agora?
Vimos que a Justi�a n�o funcionou. N�o sinto �dio desse homem. Est� tudo nas m�os de Deus. Ele vai agir.”

DECIS�ES POL�MICAS

Veja alguns casos em que a Justi�a concedeu liberdae a envolvidos em crimes de tr�nsito

Gustavo Henrique de Oliveira Binttencourt

Em 1º de fevereiro de 2008, o administrador de empresas, ent�o com 22 anos, provocou o acidente que matou o empres�rio Fernando F�lix Paganelli, de 48. Segundo o Minist�rio P�blico, ele estava embriagado e entrou na Avenida Raja Gabaglia,  na contram�o, em velocidade acima da permitida. Gustavo foi solto depois de ficar 51 dias detido no Ceresp da Gameleira. Em novembro de 2013, ele foi condenado a pagar R$ 900 mil de indeniza��o aos parentes do empres�rio.

(foto: Maria Tereza Correia/EM/DA Press - 15/9/12)
(foto: Maria Tereza Correia/EM/DA Press - 15/9/12)
Michael Donizete Louren�o

Na madrugada de 15 de setembro de 2012, o estudante de odontologia, ent�o com 22 anos, descia a Avenida Nossa Senhora do Carmo em alta velocidade, supostamente sob efeito de �lcool e maconha e disputando “racha”, quando atingiu o ve�culo de  F�bio Pimentel Fraiha, de 20, que avan�ou o sinal vermelho e morreu na hora. Michael ficou preso por cinco dias e foi solto, depois de pagar fian�a de R$ 43.540. Ontem, a 4ª C�mara Criminal do TJMG manteve senten�a que pronunciou o motorista pela suposta pr�tica do crime de homic�dio com dolo eventual. Com essa decis�o, o r�u ser� julgado pelo Tribunal do J�ri.

Olivier Rebellato


Em 17 de abril de 2009, o franc�s, ent�o com 20 anos, avan�ou um sinal vermelho em alta velocidade na Rua Sergipe, na Savassi, feriu cinco pessoas, deixando uma em estado vegetativo. O baf�metro constatou a embriaguez. Ele foi preso em flagrante, mas seis meses depois, a Justi�a concedeu a ele liberdade provis�ria e tamb�m devolveu-lhe o passaporte. Olivier embarcou para Fran�a. O pa�s n�o extradita seus cidad�os. O processo foi arquivado.

Anderson Luiz de Ara�jo Rocha


Na madrugada de 1º de outubro de 2011, o motorista de 37 anos, que dirigia com sinais de embriaguez, invadiu a contram�o na Via Expressa, em Contagem, Grande de BH, e atingiu o carro dirigido por Jeferson Dias Marques, de 26, que morreu na hora. Ele foi solto quatro dias depois ao pagar fian�a de 50 sal�rios m�nimos.O processo est� na fase de alega��es finais.

(foto: TV Alterosa/Reprodução)
(foto: TV Alterosa/Reprodu��o)
Jos� Alm�rio de Amorim Neto


Por volta das 19h30 do �ltimo dia 3, o motorista de 35 anos testava o turbo instalado no seu Gol, perdeu o controle do ve�culo na Avenida Am�rico Vesp�cio, em BH.  O carro dele, segundo testemunhas, estava a mais de 150km/h, invadiu a contram�o e bateu no Palio dirigido pelo vigilante Paulo Medeiros Mendes, de 29, que estava acompanhado da mulher, K�tia Aisten de Assis, de 27. Os dois morreram na hora. Na ter�a-feira, a Justi�a concedeu habeas corpus a Jos� Alm�rio.


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