
A chuva que voltou a dar o ar da gra�a na noite de ontem em Belo Horizonte depois de 107 dias de estiagem foi pouco para a pr�pria capital, que enfrenta o pior crise de abastecimento de �gua de sua hist�ria, e menos ainda para um estado mergulhado na crise h�drica. Apesar dos primeiros sinais do per�odo chuvoso, Minas Gerais tem hoje cerca de 1,8 milh�o de pessoas sofrendo com a escassez de fornecimento, segundo o F�rum Mineiro de Comit�s de Bacias Hidrogr�ficas. Sem chuva suficiente, j� chega a 266 a quantidade de munic�pios com situa��o de emerg�ncia decretada pelo governo estadual e 41 cidades atendidas pela Copasa convivem com o drama do racionamento. A estiagem evidencia tamb�m outro problema: o aumento nas capta��es diretas em mananciais, sem investimentos em projetos que possam aumentar a gera��o de �gua, como prote��o de nascentes e recupera��o ambiental, ou em reservat�rios que incrementem a capacidade de armazenamento na temporada chuvosa. Especialistas alertam que, sem essas medidas, o aumento nas capta��es pode comprometer mais ainda os cursos d’�gua, especialmente, o Rio S�o Francisco, castigado por grave processo de assoreamento, recebendo 23 milh�es de toneladas de sedimentos por ano, conforme revelou s�rie de reportagens do Estado de Minas.
No Norte de Minas, a concession�ria de saneamento informou que optou por buscar �gua no Velho Chico depois de esperar pela constru��o da Barragem do Rio Congonhas, anunciada h� mais de 10 anos pelo governo federal, obra que n�o saiu do papel. Ainda para suprir a cidade, a Copasa iniciou constru��o de uma adutora de 56 quil�metros para capta��o direta no Rio Pacu� (da mesma bacia, no munic�pio de Cora��o de Jesus), que posteriormente ser� integrado ao projeto da adutora at� o S�o Francisco, com o sistema prevendo a capta��o de 500 litros por segundo.
A preocupa��o com a sobrecarga da capta��o de �gua na calha principal do Rio S�o Francisco � ressaltada pelo coordenador do Projeto Ambiental Manuelz�o e presidente do Comit� da Bacia Hidrogr�fica do Rio das Velhas, Marcus Vin�cius Polignano, que tamb�m preside o F�rum Mineiro de Comit�s de Bacias. Ele salienta que, como muitos afluentes do S�o Francisco tiveram vaz�o reduzida ou est�o secos (caso do Rio Verde Grande), est� havendo uma esp�cie de “corrida” para as capta��es diretamente no Velho Chico, que n�o s�o acompanhadas de revitaliza��o dos afluentes que sustentam o rio. Polignano afirma que, se nada for feito para alterar esse processo, a situa��o vai se agravar. “Teremos um futuro desastroso para toda a bacia”, adverte. Ele diz que a Copasa “apenas trata e distribui �gua” e que o problema deve ser discutido por todos os representantes da sociedade."A corrida para captar �gua no S�o Francisco � mais do que j� vimos e s� faz aprofundar o fosso de nossas op��es equivocadas."
Apolo Heringer Lisboa, fundador do Projeto Manuelz�o
'VELHOS ERROS' Os riscos do excesso de retirada de �gua diretamente no Rio S�o Francisco sem projetos para a revitaliza��o de nascentes ou mesmo obras para “segurar” a �gua da chuva tamb�m s�o apontados pelo professor Apolo Heringer Lisboa, fundador do Projeto Manuelz�o. “A corrida para captar �gua no S�o Francisco � mais do que j� vimos e s� faz aprofundar o fosso de nossas op��es equivocadas. Sem uma pol�tica conservacionista da vegeta��o e do solo, com educa��o para conviver no semi�rido e potencializar ao m�ximo a infiltra��o das �guas das chuvas, n�o h� rem�dio”, avalia.
Ele lembra que a pol�tica de apenas buscar �gua no rio para todas as necessidades � que inspirou o projeto de transposi��o do S�o Francisco, “passando por cima de todas as pondera��es que fizemos”. O ambientalista tamb�m chama a aten��o para o processo de soterramento do Velho Chico, como mostra estudo in�dito publicado pelo EM, elaborado pelo Corpo de Engenheiros do Ex�rcito dos Estados Unidos e t�cnicos da Companhia do Desenvolvimento dos Vales do S�o Francisco e Parna�ba (Codevasf). “Hoje, a realidade mostra o fracasso desse projeto. Neste setembro de 2017, o S�o Francisco no Norte de Minas tem mais areia que �gua”, afirma o fundador do Projeto Manuelz�o.

O ponto de vista � acompanhado pelo presidente do Comit� de Bacia dos Afluentes Mineiros do M�dio S�o Francisco, Jo�o Naves. “Ser� feita uma nova capta��o no S�o Francisco para resolver o problema do abastecimento de uma grande cidade, mas n�o ouvimos falar nada em revitaliza��o do rio”, destaca ele. O �rg�o que ele preside re�ne 24 munic�pios, praticamente todos situados abaixo de Ibia�, onde est� projetado o novo ponto de retirada de �gua do Velho Chico. “O problema � o somat�rio das capta��es no rio”, assinala.
Copasa afirma que cumpre exig�ncias
Em resposta �s criticas dos especialistas, a Copasa informou em nota que os estudos para a amplia��o do sistema de abastecimento de �gua de Montes Claros “abrangeram a avalia��o de diversas alternativas a serem empregadas”. A companhia sustenta que seus empreendimentos e capta��es “seguem os ritos legais, nos quais os �rg�os respons�veis pela emiss�o das licen�as em suas diversas modalidades confrontam as caracter�sticas do empreendimento com os regulamentos classificadores do potencial poluidor, estabelecendo quais estudos e/ou condicionantes devem ser realizados pelo empreendedor para obten��o da licen�a”.
Argumentou ainda que desenvolve estudos para ampliar o sistema de abastecimento da cidade do Norte de Minas, incluindo uma “etapa de avalia��es hidrol�gicas, de modo a antever a possibilidade de utiliza��o dos mananciais estudados”. O estudo servir� para amparar a solicita��o de outorga junto � Ag�ncia Nacional de �guas (ANA). “Contudo, a avalia��o da disponibilidade h�drica que prevalece com vista � outorga � do �rg�o gestor, detentor dos dados de usos formais e regulares da �gua. Usualmente, as portarias de outorgas trazem consigo condicionantes a serem cumpridas, tais como o estabelecimento de sazonalidade da outorga, a defini��o do fluxo residual m�nimo, a jusante do ponto de capta��o e a obrigatoriedade de monitoramento quantitativo desse fluxo residual”, argumenta a companhia de saneamento.
