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Estado de Minas

'Com mais informa��es, talvez o sofrimento fosse menor', diz parente de desaparecidos em Brumadinho

Familiares de pessoas desaparecidas na trag�dia de Brumadinho se apoiam em amigos para suportar a dor, ao mesmo tempo em que se revoltam com a falta de informa��es


postado em 28/01/2019 06:00 / atualizado em 28/01/2019 08:21

No distrito de Parque das Cachoeiras, onde as partes mais baixas foram atingidas pelo rompimento da barragem, a dona de casa Izabel Nunes Vieira, de 55 anos, se desespera com o desaparecimento de três primos(foto: Paulo Filgueiras/EM/DA Press)
No distrito de Parque das Cachoeiras, onde as partes mais baixas foram atingidas pelo rompimento da barragem, a dona de casa Izabel Nunes Vieira, de 55 anos, se desespera com o desaparecimento de tr�s primos (foto: Paulo Filgueiras/EM/DA Press)
 

Brumadinho –
Nas ruas do distrito de Tejuco, em Brumadinho, na Grande BH, h� sempre um bra�o para amparar, um abra�o para acolher e uma palavra ou duas, sempre abafadas pela dor, para dar for�as a um amigo. No mais, s�o os olhos do espanto, o andar a esmo ou o choro convulsivo pela falta de informa��es ou not�cias dos desaparecidos na trag�dia, ocorrida no in�cio da tarde de sexta-feira, do rompimento da Barragem da Mina do C�rrego do Feij�o, empreendimento da Vale. “Estou segurando minha m�e, ela est� desesperada, saiu andando por a�, entrou no mato e fui atr�s”, disse, ontem, Mary Cristina Nunes, de 32 anos, que tamb�m n�o esconde a apreens�o pelo desaparecimento do irm�o Peterson Firmino Nunes, de 35, casado e pai de tr�s filhos. A exemplo de muitos moradores de Tejuco, Peterson trabalhava na unidade da empresa, com atua��o no almoxarifado.


Ao lado do irm�o Fernando Nunes Ara�jo, de 29, desempregado, Mary diz que foi atr�s da m�e “no mato” e quase desmaiou, sendo socorrida por vizinhos. Com os olhos muitos vermelhos pelas l�grimas e duas noites sem dormir, Fernando, a todo momento, olha no port�o para ver onde est� Malvina Firmino Gomes, a m�e em desespero pelo filho Peterson. No in�cio da tarde de ontem, Malvina estava na casa da vizinha Izabel Andr�a Bento, que n�o tem not�cias do irm�o Jonas e de quatro sobrinhos que tamb�m trabalhavam na Vale. “Nossa vida agora � s� esperar, esperar...N�o sabemos at� quanto. Estamos todos de luto”, disse Izabel.


No alto, no fundo das casas, d� para ver as montanhas lavradas pela minera��o, o que faz Malvina lembrar que, na madrugada de ontem, soou o alarme na mineradora, embora o risco de rompimento de outra barragem tivesse sido descartado, pelo menos por enquanto. “Pois �, na hora que n�o precisa, eles ligam a sirene. Agora, quando tem que avisar, n�o fazem nada”, disse Malvina, para em seguida, citar baixinho o nome do filho Peterson e dizer que quer o filho vivo. Logo ap�s a conversa, dava para ver amigos e vizinhos chegando perto e se abra�ando numa uni�o de for�a contra o sofrimento m�ximo.


Sem perdoar a mineradora e lembrando a trag�dia ocorrida h� pouco mais de tr�s anos em Mariana, na Regi�o Central, Fernando perguntou: “At� quanto a Vale vai destruir Minas e causar tanto mal?”.

Izabel André e Malvina Firmino (a partir da esquerda) recebem o carinho das amigas no distrito de Tejuco(foto: Paulo Filgueiras/EM/DA Press)
Izabel Andr� e Malvina Firmino (a partir da esquerda) recebem o carinho das amigas no distrito de Tejuco (foto: Paulo Filgueiras/EM/DA Press)


REVOLTA Por medida de seguran�a, as estradas que conduzem � sede municipal de Brumadinho est�o fechadas, com autoriza��o de passagem apenas para pol�cia, militares, bombeiros brigadistas e autoridades. Por isso mesmo, a atendente de telemarketing Gisele Pedrelina Duarte Santana Loures, de 22, fica sentada no gramado perto da Faculdade Asa, onde foi montado um quartel-general para centralizar a��es e dar informa��es � imprensa, aguardando qualquer not�cia sobre o pai Sebasti�o Divino Loures, de 58, motorista que havia ido � mina fazer uma entrega, no caminh�o.


“Estou sem not�cias, ningu�m me informa nada, o que aumenta o desespero. J� estive at� no Instituto M�dico Legal, em Belo Horizonte, mas n�o consegui nada”, disse Gisele, ao lado do marido, Valdeci Loures Bonfim J�nior, e dos primos Adriano Gomes, Leandro Gomes e Jos� Sidnei. Vestida com uma camisa com a estampa de S�o Miguel Arcanjo, Gisele diz que � cat�lica e, como tem pessoas de outra religi�o na fam�lia, “todos n�s estamos orando”. O celular de Sebasti�o pode ajudar nas buscas pelo motorista desaparecido desde o in�cio da tarde de sexta-feira em Brumadinho. “A �ltima vez que falei com meu pai foi �s 11h53. Mas o telefone continua tocando, est� com bateria, acho que podem rastrear.” Revoltada com a situa��o que a deixa em sobressalto, Gisele pergunta: “Quero saber quanto a vida do meu pai vai valer”.

Gilsele Loures com o marido, Valdeci, e os primos, aguarda notícias do pai, Sebastião Divino Santana(foto: Paulo Filgueiras/EM/DA Press)
Gilsele Loures com o marido, Valdeci, e os primos, aguarda not�cias do pai, Sebasti�o Divino Santana (foto: Paulo Filgueiras/EM/DA Press)


DESESPERO No distrito de Parque das Cachoeiras, onde as partes mais baixas foram atingidas pelo rompimento da barragem, a dona de casa Izabel Nunes Vieira, de 55 anos, se desespera com o desaparecimento de tr�s primos. “A press�o dela j� chegou a 16 por 10”, comentou, ao lado, o marido Geraldo Ribeiro de Paula, que procurava se acalmar fazendo um cigarrinho de palha. “Desde o rompimento da barragem, tem sido muita correria, ningu�m tem sossego. Se tiv�ssemos mais informa��es, talvez pud�ssemos ficar mais calmos”, disse baixinho Izabel sem conter o pranto e com cabe�a encostada no pilar da varanda.


Enquanto uns aguardam not�cias de parentes, outros tentam se acostumar com um novo modo de viver: agora, longe da casa destru�da pelos rejeitos de min�rio vazados da Barragem da Mina do C�rrego do Feij�o, da mineradora Vale, em Brumadinho. � o caso da fam�lia de Dari Laurindo Pereira, de 39, operador de draga, e Lauriane Oliveira de Souza, pais de Iraci, de 13, e Isabel, de 18, que perdeu tudo o que tinha e agora est� abrigada na unidade de sa�de do distrito de Parque da Cachoeira. “A lama veio numa velocidade danada, s� tivemos tempo mesmo de sair correndo, para salvar nossas vidas”, afirmou Dari.


Na hora da correria, no �nicio da tarde de sexta-feira, a fam�lia de Dari e Lauriane se abrigou na casa da cunhada, que ficava perto e tamb�m foi destru�da – assim, todos bateram em retirada. Na sequ�ncia, receberam o suporte provis�rio na unidade de sa�de, onde est�o alojadas cerca de 80 pessoas. E agora?, pergunta o rep�rter. “S� Deus pode nos ajudar. Pelo visto, agora vamos ficar iguais a ciganos, cada vez num lugar”, lamentou a mulher.


Sentada num banco ao lado do marido, Abelo Gomes, de 74, Ad�lia Oliveira de Souza, de 55, tamb�m contou ter perdido a casa no tsunami de lama. “Estamos recebendo comida, abrigo, mas ficamos sem nada, inclusive sem os documentos. Mas a vida � assim: nesta hora, a gente v� que os bens materiais n�o s�o o mais importante. O que vale mesmo � a vida. E estamos vivos”, disse Ad�lia.

(foto: Arte EM)
(foto: Arte EM)

Protesto no comit� de crise

Marli Silva procurava pelo cunhado Anjo Gabriel da Silva Lemos e disse que a família não recebeu nenhuma assistência(foto: Gabriel Ronan/EM/DA Press)
Marli Silva procurava pelo cunhado Anjo Gabriel da Silva Lemos e disse que a fam�lia n�o recebeu nenhuma assist�ncia (foto: Gabriel Ronan/EM/DA Press)

 

O que deveria ser a sede das informa��es da trag�dia de Brumadinho, na Grande BH, se tornou palco da revolta de familiares dos atingidos pela cat�strofe, justamente pela falta de comunica��o. Revoltados com a interrup��o dos trabalhos de buscas do Corpo de Bombeiros, diante da amea�a de mais um rompimento de barragem, cerca de 30 moradores invadiram a Faculdade Asa, onde se abriga o comit� de crise das autoridades, na tarde de ontem. Aos gritos de “queremos o Ex�rcito”, eles cobravam a��o dos �rg�os de seguran�a e apoio da Vale, um fantasma na opini�o de todos os indignados. 

“At� ontem (sexta), ele estava na lista dos desabrigados. Hoje (ontem), ele est� na lista dos desaparecidos”, contou a moradora Paula Carvalho ao Estado de Minas. Ela estava, at� o fechamento desta edi��o, � procura do seu irm�o de cria��o, M�rcio Freitas, mec�nico da Vale. “Um deles vai ter que me escutar. O IML n�o passa nada, nem a Pol�cia Civil. Ningu�m fala nada com nada. Eles l� de cima (da Vale) s�o preparados para esconder tudo da gente. O que eu posso fazer e o que eu n�o posso fazer? Quero saber do meu irm�o”, reclamava, aos berros.


Situa��o semelhante vive Eliel de Freitas e sua esposa, que n�o quis se identificar. Eles est�o � procura do pai dele, Eliseu de Freitas, de 51 anos. “Desde sexta-feira, eles (a Vale) n�o d�o not�cia nenhuma. Ontem, eu ouvi na imprensa que a empresa estava dando apoio. Mentira! Uma hora est� na lista de desaparecidos, outra hora n�o. Isso � injusti�a demais com a gente. Estamos desesperados”, contou a nora. Para eles, a falta de dados � uma estrat�gia da mineradora para se resguardar juridicamente. “A trag�dia n�o era pra acontecer, mas j� que aconteceu, eles precisam ligar para as fam�lias. Cad� o representante da Vale aqui?”, perguntou o filho, tamb�m trabalhador do setor miner�rio, em Nova Lima, na Regi�o Metropolitana de BH.


Eliel de Freitas estava inconformado com a falta de informações sobre o pai, Eliseu de Freitas, de 51 anos(foto: Gabriel Ronan/EM/DA Press)
Eliel de Freitas estava inconformado com a falta de informa��es sobre o pai, Eliseu de Freitas, de 51 anos (foto: Gabriel Ronan/EM/DA Press)
Acordado desde sexta-feira, entre um cochilo e outro, Eliel contou sua �ltima conversa com o pai. “Ele me disse que faria uma cirurgia amanh� (esta segunda-feira). Meu pai enfrentava um problema na coluna, adquirido pelo servi�o na Vale. Agora, a empresa que ele tanto representou vira as costas pra ele”, lamentou.


Tamb�m desamparada, Marli Silva procurava pelo cunhado Anjo Gabriel da Silva Lemos. “Ele vestiu o uniforme e foi trabalhar sexta-feira. Agora, eles (autoridades) n�o d�o uma informa��o correta? Est� com a lista de ontem (s�bado) ainda”, disse. Segundo ela, a fam�lia n�o recebeu qualquer assist�ncia desde o tsunami de lama e rejeitos. No local, ela estava acompanhada de v�rios parentes do desaparecido.


O protesto dentro do comit� de crise durou cerca de 10 minutos, antes de ser barrado pelas for�as de seguran�a. Certo � que, momentos depois, as autoridades voltaram a conceder entrevista � imprensa. No boletim da vez, eles informavam sobre a volta do trabalho dos militares nas zonas quentes da trag�dia, com intuito de encontrar os desaparecidos. (Gabriel Ronan)

 

Fake news


Al�m da falta de informa��o, as fam�lias enfrentam a dissemina��o de not�cias falsas. “A gente recebe toda hora uma 
liga��o com coisa errada. Mandaram uma foto de um bombeiro com uma pessoa, dizendo que era meu pai. Mas a foto � de 2011”, disse Eliel de Freitas, sobre um registro feito em Patos de Minas, durante um resgate do Corpo de Bombeiros.


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