postado em 25/12/2019 06:00 / atualizado em 25/12/2019 07:31
Letreiro enfeitado para o Natal: cidade ainda em clima de consterna��o (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press
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Para um, a dor de quase ter perdido a vida no rompimento da Barragem B1 da Mina C�rrego do Feij�o, em Brumadinho, e nunca mais ver quem ama, interrompeu uma carreira de 10 anos, trocada pelo seio familiar. Para outro, o trabalho cont�nuo na busca pelos 13 corpos ainda desaparecidos � o que lhe mant�m a sanidade e a vida em perspectiva. Depois de sobreviverem ao desastre com mais v�timas do Brasil, deixando 270 mortos em Brumadinho, h� exatos 11 meses, os operadores de saneamento ambiental Sebasti�o Gomes, de 54 anos, e Elias de Jesus Nunes, de 43, seguiram caminhos diferentes para suportar a trag�dia, mas buscar�o for�as neste Natal passando a data, que relembra o nascimento de Jesus Cristo, com os filhos, esposa, m�e, pai e outros parentes. Ambos confessam que chegaram a pensar que essa data poderia ter sido de luto se n�o fosse a “m�o de Deus”, como define Sebasti�o. Algo com que � f�cil concordar quando se veem os v�deos do desastre em que aparecem ilhados pelo rejeito, se equilibrando sobre a lataria de uma caminhonete.
O percurso de Sebasti�o at� o Natal em fam�lia foi t�o duro e triste que, depois de tr�s meses e meio do desastre, ele pediu demiss�o. Sem os parentes teria sido ainda mais dif�cil. “Foi uma decis�o muito dif�cil. Conversei com a minha fam�lia e n�o foi f�cil. Mesmo depois daquilo, a Vale foi uma das melhores empresas em que j� trabalhei”, conta. Segundo ele, cada dia de trabalho ap�s o rompimento e o seu salvamento pelos bombeiros era de extrema tristeza. “N�o estava conseguindo trabalhar. Passei mal por dois meses. Fui transferido para Nova Lima, onde fiquei mais 40 dias. Tomava medicamentos e fazia tratamento psicol�gico e psiqui�trico. Tinha muita �nsia, ficava triste e chorava sem parar. Quando achava que estava tudo bem, aparecia um amigo e contava uma dor �s vezes pior ainda que a minha e eu voltava a chorar. O pior � saber que muitos l� est�o assim e que n�o saem por n�o saber fazer outra coisa ou por n�o conseguir mesmo”, afirma.
J� a trajet�ria de Elias seguiu por outro caminho, n�o menos pesado e sofrido. Ele decidiu continuar a trabalhar na Mina C�rrego do Feij�o auxiliando as equipes de resgate dos bombeiros a procurar pelos 13 desaparecidos. “N�o precisei de aux�lio, pois cada um reage de um jeito. Penso que tenho de dar gra�as a Deus por estar vivo e que o trabalho que fazemos hoje � muito importante. Dar esse apoio aos bombeiros para achar as v�timas me ajuda a superar toda essa dor. Se ficasse em casa, mil coisas ruins passariam pela minha cabe�a”, diz o operador de saneamento.
Sebasti�o Gomes ao lado dos filhos Gabriel e Daniel, agradecido a Deus por poder estar ao lado da fam�lia, mas ainda abalado: 'Todo dia 25 � como se fosse 25 de janeiro' (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Segundo Elias, o clima nos dias que antecederam este Natal na �rea de buscas e nas demais depend�ncia+.s da mina destru�da pelo rompimento era de tristeza e consterna��o. Mas a esperan�a permanece. “Fico reparando como � diferente. Na mina vizinha, de Jangada, j� h� luzes de Natal, tem �rvores natalinas e um clima de alegria. Em (C�rrego do) Feij�o n�o tem o menor clima. Todos os dias a gente v� pessoas vindo procurar saber se encontraram alguma pista de seu filho, do pai, do marido. N�o fico perto e deixo os bombeiros conversarem. � tristeza demais, porque muitos s�o meus amigos, meus colegas”, desabafa.
Natal especial
"S� espero que as pessoas que ainda n�o enterraram seus falecidos tenham esperan�a" - Elias de Jesus Nunes, operador de saneamento ambiental (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Tanto para Sebasti�o quanto para Elias, o Natal em fam�lia � ainda mais especial este ano. Rodeado pelos filhos, que depois do desastre n�o desgrudam mais do pai, Sebasti�o antecipou que a ceia deste Natal seria em casa, em Betim, depois de irem � missa na sua igreja, cat�lica, e ao culto, na Igreja Batista frequentada pelo filho. “N�o tem como esquecer n�o. Todo dia 25 � como se fosse 25 de janeiro. � como se tivesse ocorrido (o rompimento) de novo. Achei que tinha tudo acabado para mim. Que n�o veria meus filhos. Que poderia estar soterrado l� at� hoje”, afirma. O filho mais novo, o motorista Gabriel Lima Gomes, de 22, n�o consegue verbalizar o significado de ter o pai ao seu lado no Natal e prefere ficar em sil�ncio. O mais velho, o operador de produ��o Daniel Jackson Gomes Lima, de 26, agradece. “� uma honra a gente estar juntos. Nunca passou pela minha cabe�a que poderia passar sem o cabe�a da casa, sem um peda�o da gente. Agora, a gente faz tudo juntos”, disse.
O medo de Elias era deixar desamparada sua filha L�via, de 13, que mora com ele h� muitos anos em M�rio Campos, na Grande BH. Neste Natal, a casa da m�e foi a escolhida para celebrar em fam�lia. “Nem gosto de pensar que poderia estar desaparecido e minha filha �rf�, sem ter nem o corpo do seu pai para enterrar. Ela � muito apegada a mim e disse que se tivesse acontecido algo n�o saberia o que fazer. S� espero que as pessoas que ainda n�o enterraram seus falecidos tenham esperan�a e saibam que n�o vamos parar at� que tenham um destino digno”, promete.
A caminhonete em que a dupla se equilibrou para escapar da lama boiou nos rejeitos dias ap�s a trag�dia (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press - 1�/2/19
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