Voz ativa em Brumadinho: comunidade projeta monumento na �rea do desastre
Vale dever� financiar a obra, a ser instalada perto da antiga portaria do complexo miner�rio onde barragem se rompeu e que se juntar� a outro memorial, em santu�rio projetado pela Arquidiocese Metropolitana de BH
postado em 23/12/2019 06:00 / atualizado em 23/12/2019 07:20
Vista da barragem que se rompeu na Mina C�rrego do Feij�o: fam�lias das v�timas querem memorial perto da �rea
(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Encravado na mancha de destrui��o que soterrou 130 hectares e sepultou em menos de cinco minutos parte da Mina C�rrego do Feij�o e moradias rurais de Brumadinho, chegando ao Bairro C�rrego do Feij�o, um memorial ser� erguido para homenagear as 270 v�timas do rompimento da Barragem B1, que completa 11 meses no dia 25. Esse monumento n�o � o mesmo anunciado pela Arquidiocese de Belo Horizonte, 30 dias depois do rompimento. O projeto em quest�o segue as diretrizes da comunidade e dos familiares dos mortos, por meio da Associa��o dos Familiares de V�timas e Atingidos do Rompimento da Barragem da Mina do C�rrego Feij�o de Brumadinho (Avabrum).
Chamado de Minas de Esperan�a, o memorial ofertado pela arquidiocese teve sua pedra fundamental lan�ada em 25 de fevereiro, no antigo Centro de Forma��o de L�deres, na Rua Alberto Cambraia, 140, Centro de Brumadinho. Os planos tamb�m mudaram e o complexo ser� ampliado para formar o Santu�rio Arquidiocesano Nossa Senhora do Ros�rio, com a presen�a do memorial em seu interior, de acordo com informa��es da arquidiocese.
J� o memorial da Avabrum ainda n�o tem nome e ser� fundado na �rea destru�da, pr�ximo � comunidade do C�rrego do Feij�o. As negocia��es para a sua instala��o ainda ocorrem junto � mineradora Vale e ao governo do estado de Minas Gerais. N�o h� ainda uma data estimada para a constru��o nem previs�o fechada de custos. De acordo com declara��o da Vale por e-mail, “por se tratar de tema sens�vel a todos, os encontros ocorrem periodicamente e levam em conta um processo de escuta ativa da comunidade, buscando formas de atender �s necessidades e demandas dos atingidos”.
De acordo com a respons�vel pelo projeto na associa��o, Kenya Paiva Lamounier, a Vale promoveu as apresenta��es de quatro arquitetos para mostrar ideias e inspirar a concep��o do projeto do memorial. Para ela, o importante � que seja um espa�o de mem�ria das v�timas. "Vai ser para a hist�ria dessas pessoas. Pensando nessa l�gica, de como coisas como essas n�o podem ocorrer mais. Todos que vierem precisam saber o que ocorreu", afirma.
A ideia � que o monumento seja constru�do no rumo da antiga portaria da Vale para o complexo miner�rio de C�rrego do Feij�o, local que foi completamente destro�ado pela passagem dos quase 12 milh�es de metros c�bicos de lama e rejeitos de min�rio de ferro. A portaria n�o existe mais e a �nica estrada viabilizada depois do desastre � destinada exclusivamente � incessante procura pelos corpos de 13 desaparecidos que ainda est�o sob a lama. Por esse motivo, a via aberta pela Vale s� comporta o tr�fego de caminh�es, tratores e demais m�quinas pesadas.
O local n�o foi escolhido ao acaso. Ali, tanto os familiares dos trabalhadores que morreram no complexo – que representam mais de dois ter�os das v�timas – quanto o de moradores da regi�o e do Bairro C�rrego do Feij�o poderiam ter pr�ximos de si essa homenagem �s v�timas do maior desastre brasileiro em n�mero de �bitos. A pr�pria respons�vel pelo memorial � vi�va de um dos trabalhadores que estavam na mina no dia do rompimento e leva o seu trabalho como uma homenagem ao marido. Adriano Aguiar Lamounier, de 54 anos, trabalhou no planejamento el�trico da mina e era diretor do Sindicato dos Trabalhadores nas Ind�strias de Extra��o de Ferro e Metais B�sicos de Brumadinho e Regi�o (Metabase). Seu corpo foi sepultado em 20 de fevereiro, sendo o terceiro diretor do sindicato v�tima da trag�dia. “O memorial � algo que por representar uma perda t�o importante para nossas fam�lias precisa ter esse significado”, afirma Kenia.
Para lembrar vidas e hist�ria
A participa��o da comunidade do C�rrego do Feij�o, em Brumadinho, � muito importante na concep��o do memorial das v�timas do rompimento da Barragem B1, segundo a vi�va de uma das v�timas e diretora da Avabrum, Kenya Paiva Lamounier. � essa comunidade que ter� a estrutura como parte integrante de seu cotidiano. “Estamos conversando e a gente se encontra quase que semanalmente para insistir para que o monumento seja perto da portaria, pr�ximo � igreja e ao campo onde as buscas ocorreram. � um trabalho de formiguinha, n�o somos experientes em nada desse tipo, mas temos a trag�dia em comum e a miss�o de construir essa homenagem, s� com a nossa dor e a nossa mem�ria. N�o estamos dispostos a desistir nunca”, afirma.
Morador do C�rrego do Feij�o, o aposentado Sebasti�o Fel�cio Camilo, de 68 anos, afirma que o memorial ser� uma obra importante para homenagear as pessoas que perderam a vida na trag�dia, muitas delas vizinhos e amigos de grande conv�vio que foram perdidos. “Mas n�o vou precisar de memorial para me lembrar do que passamos. Nunca vamos esquecer aquilo. Minha coluna nunca mais parou de doer depois que ajudei a tirar um menino de7 meses do fundo da lama, ainda vivo. � filho de uma vizinha e estava todo enlameado. Estava preso, chorava com o nariz todo cheio de lama. Quando o entreguei para a m�e, que estava em l�grimas, ela me agradeceu e disse: ‘Minha crian�a’. Esque�o isso mais n�o”, suspira o aposentado.
O auxiliar administrativo Maikon Ant�nio Ferreira C�ndido, de 25, tamb�m morador do C�rrego do Feij�o, conta que as infesta��es de insetos s�o a mais recente praga trazida pelo rompimento que desfigurou sua comunidade e matou muitos amigos. “Para n�s, a noite se tornou um inferno, cheia de mosquitos e pernilongos que n�o t�nhamos antes. Deve ser por causa desse tanto de po�as de lama e de �gua. Todos reclamam. A agonia n�o passa. Al�m da depress�o, ainda temos as picadas de bichos todos os dias”, reclama. O rapaz conta que a comunidade mudou completamente e que a homenagem de um memorial seria bem-vinda. “Passava muito pela Pousada Nova Inst�ncia, onde tinha muitos amigos e trabalhei de gar�om por seis anos. S� que ela acabou. N�o tem mais nada. Tinha um restaurante bacana, mas tudo se desintegrou e s� ficou uma moita de bambu”, observa.