
Em novembro de 2015, 43,7 milh�es de metros c�bicos de rejeitos vazavam da Barragem de Fund�o, que se rompeu em Mariana (MG). Com o epis�dio, 13 milh�es de m³ de rejeitos permaneceram no vale de Fund�o, 3 milh�es de m³ ficaram retidos dentro da �rea da mineradora e 39,2 milh�es de m³ chegaram ao rio Gualaxo do Norte.
Outros 10 milh�es de m³ ficaram depositados no trecho entre Fund�o e a Usina Hidrel�trica Risoleta Neves, conhecida como Candonga. Mais 10 milh�es de m³ foram represados na Usina de Candonga e cerca de 20 milh�es de m³ percorreram o rio Doce, com parte do volume chegando at� a foz, em Reg�ncia, distrito de Linhares (ES).
O rompimento afetou boa parte das comunidades ao longo dos rios, com destaque aos distritos de Bento Rodrigues e Paracatu de Baixo, localizados em Mariana (MG), e o distrito de Gesteira, que integra o munic�pio de Barra Longa (MG). O cen�rio requereu a ado��o de iniciativas que pudessem solucionar os impactos causados pelo material, tornando-se uma das principais frentes de trabalho desenvolvidas pela Funda��o Renova, organiza��o respons�vel pela repara��o e compensa��o dos danos causados pelo desastre.
Com o Programa de Manejo de Rejeitos, uma iniciativa que tem buscado executar as melhores solu��es para o res�duo com o menor impacto para o meio ambiente e para o entorno, mais de 80 especialistas participaram da constru��o do plano de a��o, que dividiu a regi�o afetada em 17 trechos.
O trabalho de an�lise foi iniciado enquanto aconteciam as a��es emergenciais para recupera��o de margens e entornos dos c�rregos e rios, ainda em 2015. Nessa etapa, foram realizados levantamentos geomorfol�gicos, hidrodin�micos e hidrossedimentol�gicos, ou seja, an�lises do solo, �gua e sedimentos, para permitir que os especialistas tivessem uma primeira no��o do cen�rio.
J� em 2017, o estudo inicial avan�ou com a participa��o de outros atores no desenvolvimento de um plano para remo��o dos rejeitos que se espalharam pelo rio Doce e seus afluentes. Foram feitos tr�s workshops que envolveram professores universit�rios, especialistas, consultores, �rg�os ambientais e representantes do Minist�rio P�blico para elabora��o do Plano de Manejo de Rejeito, que definiu os m�todos mais adequados utilizando como crit�rio o plano que gerasse o menor impacto poss�vel nas esferas sociais e ambientais.
Restaura��o planejada
O Plano de Manejo de Rejeito foi aprovado em junho de 2017 pela C�mara T�cnica de Gest�o de Rejeitos e Seguran�a Ambiental, que faz parte do Comit� Interfederativo (CIF), coordenado pelo Ibama. O CIF re�ne representantes de �rg�os p�blicos e sociedade com a fun��o de orientar, acompanhar, monitorar e fiscalizar a execu��o das medidas de repara��o previstas no Termo de Transa��o e de Ajustamento de Conduta (TTAC).
O projeto aprovado divide as a��es em 17 trechos atingidos, devido � complexidade do trabalho, com algumas delas j� aprovadas pelos �rg�os ambientais: do 1 ao 4, que correspondem ao Vale do Fund�o; do 6 ao 9 que remetem ao rio Gualaxo do Norte, e, por fim, as etapas 10 e 11 que � o rio Carmo e a nascente do rio Doce.
Do trecho 12 ao 14, o plano segue em avalia��o. J� os trechos 15 e 16, que est�o localizados no Esp�rito Santo, e 17, na regi�o marinha, aguardam o planejamento a partir de 2020. Nos trechos de 1 a 4, a engenheira qu�mica e l�der do programa de Manejo de Rejeito da Funda��o, Juliana Bedoya, explica que por se tratar da �rea mais impactada houve instala��o emergencial de diques para proteger e reter os rejeitos que eventualmente sa�ssem. No local foi constru�da uma nova estrutura para conter os rejeitos que ainda est�o l�, uma medida focada em seguran�a e prote��o ambiental.
Al�m do trecho mais cr�tico, o especialista do programa de Manejo de Rejeito da Funda��o Renova, Pedro Ivo Di�genis, esclarece como s�o os primeiros passos para colocar o plano em pr�tica:
“Fazemos um levantamento ambiental da �rea, como solo, sedimento e �gua. Depois, identificamos o rejeito e seu volume e analisamos para avaliar as alternativas de manejo”, detalhou.
Ele conta que os trechos cujos planos foram aprovados n�o tiveram como solu��o a remo��o dos rejeitos, com exce��o de Barra Longa, onde o material precisou ser removidos em car�ter emergencial, j� que atingiram a �rea urbana do munic�pio.
Por isso, a equipe desenvolveu um grande processo de remo��o do rejeito, remanejando para uma �rea de aterro, preparada exclusivamente para este fim, e utilizou o material, tamb�m, para a reestrutura��o de um campo de futebol de v�rzea da cidade.
“No restante das �reas, foram feitas revegeta��es iniciais, que consistem em semear plantas de crescimento r�pido, para gerar nutrientes, pois o rejeito alterou a qualidade do solo. Depois, fizemos o controle de eros�o e drenagem com bioengenharia. Entramos com m�quinas nas plan�cies e margens, fazendo as interven��es para evitar que os rejeitos que estavam nas margens voltassem para os rios”, esclareceu Pedro.

Alternativas para o manejo
A bioengenharia citada por Pedro utiliza materiais naturais para prote��o do solo, como biomantas, detentores de sedimentos, entre outros. O especialista tamb�m destaca que o uso do maquin�rio foi necess�rio em a��es mais pesadas, como a coloca��o de rochas para ajudar na conten��o e estabilizar as margens dos rios.
Outro ponto relevante do trabalho foi a planta��o de esp�cies nativas, que s�o fundamentais para reconstruir a mata ciliar, que fazem parte das �reas de Preserva��o Permanente (APPs). O trabalho � crucial para a recupera��o de rios. Al�m disso, rejeitos n�o removidos foram adubados com mat�ria org�nica das plantas e, hoje, � feito o monitoramento para que elas se desenvolvam bem. “Conseguimos provar que as plantas crescem nos rejeitos”, ressaltou o especialista.
Di�logo para a reconstru��o
Um dos diferenciais da iniciativa � a atua��o pr�xima das comunidades afetadas. Isso porque o planejamento inclui o di�logo constante com a popula��o, a exemplo dos desenvolvidos com a comunidade de Camargos, distrito de Mariana (MG). Desta forma, os habitantes das regi�es s�o ouvidos e apontam como esperam que a Funda��o Renova realize a recupera��o dos cen�rios.
“Temos projetos que est�o sendo constru�dos em parceria com as comunidades, a exemplo de Camargos e Ponte do Gama, em Mariana. Nos casos em que uma �rea comum foi atingida pelo rejeito, constru�mos os projetos junto aos moradores. Por meio de reuni�es, eles nos contam como eram essas �reas antes do rompimento e o que eles esperam que a gente fa�a para recuperar o local”, frisa Pedro Ivo.
Em Camargos, um pedido espec�fico da popula��o foi atendido. O de recuperar a cachoeira da localidade, um espa�o utilizado para lazer antes do rompimento. A partir da solicita��o, uma s�rie de encontros foi realizada para integrar os moradores em todas as etapas do trabalho e, em fevereiro deste ano, o projeto de recupera��o foi aprovado e segue em execu��o. Ele inclui desde a remo��o do rejeito at� a ado��o de melhorias no local.

Estrat�gias de recupera��o e manejo
Por ser um processo complexo, o Plano de Manejo de Rejeitos engloba a��es distintas em cada regi�o. Na etapa emergencial, a estrat�gia consistiu na retirada do rejeito em locais onde havia risco de movimenta��o e na reconstru��o de margens para regulariza��o e corre��o dos contornos dos rios, com o intuito de diminuir a eros�o causada pelos sedimentos.
Ainda como medidas de conten��o, foram utilizadas t�cnicas de pali�ada, reten��o de sedimentos e drenagem de plan�cies. A primeira consiste na coloca��o de barreira em forma de grade, com bambu ou madeira, nas encostas de pequenos barrancos para evitar a passagem de sedimentos. A segunda, formada por rolo de palha e fibras naturais, impede que os sedimentos cheguem � calha por a��o das chuvas. A drenagem, por sua vez, envolve a defini��o de caminhos para o escoamento da �gua da chuva de plan�cies vizinhas �s margens, canalizando a �gua em dire��o � calha.
Para a recupera��o da qualidade da �gua, o sistema de tratamento natural tem sido um recurso importante. Isso porque a t�cnica desvia parte da �gua para tanques laterais que agitam, sedimentam impurezas e filtram com a ajuda de plantas aqu�ticas capazes de absorver metais. Outras a��es para melhoria e monitoramento da qualidade da �gua tamb�m est�o em vigor, conhe�a aqui.
Por fim, mas n�o menos importante, est� o plantio de mata ciliar e a renaturaliza��o. Confira o mapa abaixo indicando as principais a��es em cada trecho.
Renaturaliza��o: o caminho de volta � vida
Afluente do rio Doce, o Gualaxo do Norte, localizado no munic�pio de Mariana, est� recebendo uma t�cnica pioneira no Brasil que � a da renaturaliza��o do seu leito. O rio teve 48 dos seus 60 quil�metros prejudicados.
Agora, com a renaturaliza��o, o objetivo � oferecer condi��es naturais para que o curso d'�gua se recupere ao utilizar recursos na composi��o do ambiente, como � o caso do uso de troncos, ra�zes e galhos nas margens e no centro do rio para reproduzir caracter�sticas do meio aqu�tico e, assim, estimular o desenvolvimento de peixes e outros organismos que colaborem com o aumento da biodiversidade do habitat. Tudo com o menor impacto poss�vel.
O trabalho de renaturaliza��o conta com a expertise da Aplysia, empresa de servi�os ambientais envolvida no projeto. O diretor t�cnico da empresa, Fernando Aquinoga, fala de onde veio a inspira��o para aplicar a t�cnica.
“Fomos buscar essa experi�ncia no Reino Unido. H� mais de 20 anos eles usam elementos naturais para renaturalizar rios. H� cinco anos fomos conhecer mais a fundo com profissionais que atuam na �rea, e criamos uma troca de conhecimento”, disse. O principal case de sucesso da t�cnica foi registrado na Inglaterra, onde o rio T�misa foi despolu�do.
De acordo com Pedro Ivo, a hip�tese de utilizar a dragagem de rejeitos chegou a ser cogitada, mas houve a conclus�o de que o processo geraria turbidez na �gua. Ent�o, troncos foram colocados nas calhas dos rios, criando habitats para os peixes.
“Em dois quil�metros do Gualaxo do Norte, colocamos 175 �rvores e troncos e mais 15 galhas, completando quase 200 estruturas. Criamos habitats, que s�o �reas de remanso onde a velocidade do rio � menor. Tem esp�cies de peixes que gostam desse tipo de ambiente. Os troncos geram vegeta��o na �gua, formando alimento para os peixes”, declarou o especialista.
Com menor velocidade da �gua, os sedimentos v�o ficando no fundo do rio, ajudando a separar a areia dos cascalhos e das pedras. Os resultados podem ser obtidos a curto prazo, mas os efeitos mais significativos surgem entre seis meses e um ano.
A recupera��o do Gualaxo do Norte � considerada positiva. O �ndice de turbidez, que mede a quantidade de s�lidos que tem na �gua, ficou em 30 NTU (Nephelometric Turbidity Unity, ou Unidade Nefelom�trica de Turbidez) neste per�odo seco, que vai de abril a setembro. A quantidade m�xima estabelecida por lei � de 100 NTU. Mas, em 2016, o rio chegou a atingir 500 mil NTU: “Agora � 30 NTU. � um avan�o muito significativo”, resumiu Pedro.
A expectativa � que o rio Gualaxo do Norte receba a mesma heterogeneidade aqu�tica que havia antes do rompimento da Barragem de Fund�o. Para isso, al�m da renaturaliza��o, o rio recebe a��es de reflorestamento com plantio de esp�cies nativas.