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Estado de Minas

Questionamento � Lei Maria da Penha � carregado de intoler�ncia e preconceito, diz Iriny Lopes


postado em 07/03/2011 19:27

(foto: Agência Brasil)
(foto: Ag�ncia Brasil)
Ter�a-feira � o Dia Internacional da Mulher e, para a ministra da Secretaria Nacional de Pol�ticas para as Mulheres, Iriny Lopes, h� avan�os para se comemorar, mas, tamb�m, muita preocupa��o com a consolida��o dos direitos alcan�ados. Uma amea�a real �s conquistas dos �ltimos tempos, na sua opini�o, s�o os questionamentos da constitucionalidade da Lei Maria da Penha que, hoje, se reproduzem em v�rias comarcas e tribunais.

A lei que garante puni��o para a viol�ncia cometida dentro de casa, motivada pela quest�o de g�nero, chegou a ser classificada como “diab�lica” por um juiz. Al�m disso, o artigo que garante que a v�tima n�o ser� coagida a retirar a den�ncia vem sendo questionado nos tribunais superiores. Para Iriny Lopes, h� “intoler�ncia e preconceito”.

A ministra assumiu como primeira tarefa de sua gest�o estabelecer um di�logo com os magistrados para sensibiliz�-los da import�ncia da aplica��o da lei tal como foi aprovada. Segundo ela, os ju�zes precisam aproximar-se mais das quest�es da popula��o. “A alma da Lei Maria da Penha � que a mulher n�o seja coagida”, disse a ministra, em entrevista � Ag�ncia Brasil. Iriny tamb�m defendeu a forma��o de um banco de dados confi�vel para medir a dimens�o da viol�ncia contra as mulheres.

Ag�ncia Brasil – A Lei Maria da Penha foi aprovada e sancionada no governo de Luiz In�cio Lula da Silva, mas, at� hoje, h� problemas com sua aplica��o efetiva. At� a constitucionalidade da lei que protege as mulheres em rela��o � viol�ncia cometida dentro de casa vem sendo discutida no meio judici�rio. Um juiz da cidade mineira de Sete Lagoas chegou a chamar a lei de “diab�lica”. Como convencer as pessoas da necessidade de aplica��o dessa lei?
Iriny Lopes – Primeiramente, seria prudente, seria bom para o Brasil que o Poder Judici�rio se aproximasse um pouco mais do que s�o os anseios da popula��o. A Lei Maria da Penha foi considerada pelas Na��es Unidas como uma das tr�s melhores legisla��es do mundo de prote��o � mulher e instrumento eficaz e rigoroso contra a viol�ncia dom�stica. Uma pesquisa recente mostra que 63% dos brasileiros conhecem e apoiam a Lei Maria da Penha. � um �ndice alt�ssimo. N�s poder�amos arriscar a dizer que � a lei brasileira mais popular de toda a hist�ria. O que ocorre no interior do Judici�rio reflete o que vai tamb�m na sociedade. Em alguns casos, eu n�o generalizo, trata-se de intoler�ncia e preconceito.

ABr - Mas n�o cabe ao juiz, desembargador ou ministro prezar pela aplica��o da lei?
Iriny – Ao examinar um processo, aquela leitura � feita de forma contaminada pelo preconceito e pela cultura de que � natural a viol�ncia. Trata-se da naturaliza��o da viol�ncia praticada contra a mulher e alguns magistrados j� v�o imbu�dos dessa conduta.

ABr - Como � que o Executivo pode tratar esse assunto sem que isso caracterize invas�o de Poderes ou atribui��es?
Iriny – [Em] Alguns casos, � discuss�o sobre doutrina e � nessa �tica que queremos tratar e j� estamos dialogando com o Judici�rio.

ABr – O artigo da lei que n�o permite que a queixa seja retirada pela v�tima causou discuss�o no Congresso [Nacional] e ainda � um ponto que muitos n�o aceitam. [Alguns parlamentares] Alegam que, diferentemente de outras leis, a v�tima, nesse caso, a mulher, n�o pode se arrepender da den�ncia. Como superar essa discuss�o?
Iriny – Posso falar [disso] com uma certa tranquilidade porque fui relatora da Lei Maria da Penha quando ela estava sendo apreciada pela Comiss�o de Constitui��o e Justi�a da C�mara. O ponto contestado � o Artigo 16, que trata da a��o ser ou n�o condicion�vel. A lei � clara. A mulher pode retirar, sim, a queixa, mas perante a um juiz, em audi�ncia. Ent�o, n�o h� a alegada inconstitucionalidade. Existem coisas, como esse questionamento, que nos deixam perplexos. Mas a perplexidade n�o vai nos tirar a capacidade de a��o.

ABr – N�o d� para abrir m�o desse ponto para manter as penalidades previstas na lei?
Iriny – Esse ponto � indispens�vel. As varas especializadas tanto na Justi�a como na promotoria s�o importantes. As delegacias, n�cleos e casas-abrigo s�o tamb�m importantes, a qualifica��o dos profissionais, servidores p�blicos que v�o receber as mulheres [tudo isso] � tamb�m importante. A obrigatoriedade de uma central de dados � importante, mas o mais importante de tudo, a alma da Lei Maria da Penha, � que a mulher n�o seja coagida. Esse artigo a protege para que ela n�o seja constrangida a retirar a a��o.

ABr – A senhora esperava esse embate com setores do Judici�rio?
Iriny – N�o se trata disso. H� quest�es que temos que enfrentar de forma decisiva e estou me esfor�ando nesse di�logo. Houve uma decis�o recente no Superior Tribunal de Justi�a (STJ) que n�s, do governo, consideramos muito ruim. A decis�o d� um prazo � mulher para ver se ela vai mesmo manter a a��o. O agressor, ao saber disso, vai agir. A intimida��o da v�tima, nesse caso, � l�quida e certa.

ABr – A senhora considera que essa decis�o tem um car�ter discriminat�rio?
Iriny – Sim. Quando se tem uma briga entre dois homens, por um motivo qualquer, um deles registra queixa e isso evolui para um processo, nunca se pergunta a ele se ele quer retirar a queixa ou n�o. Muito menos � dado a ele prazo para confirmar essa den�ncia. Por que essa distin��o em rela��o � mulher? Por que a Justi�a tem que perguntar isso a uma mulher? Ela � v�tima de agress�o, ela apresentou den�ncia. A den�ncia foi objeto de inqu�rito, que originou uma den�ncia do Minist�rio P�blico para, depois, virar um processo. Nesse tempo todo, se ela tivesse se arrependido, ela poderia ter ido l� e falado: "Doutor, quero retirar a queixa". N�o tem porque o Judici�rio perguntar isso a ela.

ABr – Outro questionamento � em rela��o � especificidade da pr�pria lei que protege as mulheres. Como driblar isso?
Iriny – J� me perguntaram, ao vivo, em uma entrevista: por que n�o h�, ent�o, uma lei especial para homens? Eu simplesmente respondi: porque n�o precisa. Os homens n�o s�o agredidos porque s�o homens. Eles s�o agredidos em brigas por ci�me, por bebida, por qualquer outra coisa, mas n�o por serem homens. J� a agress�o de g�nero ocorre s� contra a mulher. � por isso que h� a necessidade da lei. A motiva��o da agress�o por g�nero n�o consegue ser atingida pela legisla��o comum.

ABr – Que caracter�sticas a senhora enxerga na chamada “viol�ncia de g�nero”? Como caracterizar esse tipo de crime?
Iriny – � uma viol�ncia que vem em uma curva crescente. Come�a com uma agress�o psicol�gica, do tipo: 'Voc� est� parecendo uma p... com essa saia', 'N�o tinha uma outra roupa n�o?', 'Esse batom est� escandaloso', 'Nossa, tenho at� vergonha de ficar perto de voc�'. Depois passa para amea�a. O parceiro diz: 'Se voc� for trabalhar com essa roupa, n�o precisa mais voltar porque voc� n�o entra mais aqui'. Depois passa para uma sacudida, depois um tapa, depois uma surra, depois o corte de dinheiro. N�o passa um recurso no caso de haver um s� provedor, depois c�rcere privado, deixa a mulher trancada e diz que s� pode sair com ele. Se sair sem ele, quando voltar, mais surra, at� chegar � morte, que pode acontecer de forma premeditada ou mesmo em consequ�ncia das sucessivas viol�ncias. Vai batendo, batendo, at� a mulher n�o resistir. � por isso que esse tipo de crime tem que ter uma legisla��o espec�fica que n�o podemos chamar nem de especial. Trata-se de uma legisla��o especializada.

ABr – A senhora considera que a lei j� teve um efeito de diminuir esse tipo de viol�ncia?
Iriny – N�s podemos medir a Lei Maria da Penha e sua import�ncia para as mulheres do pa�s pelo Disque 180, o nosso disque-den�ncia. O n�mero de den�ncias ampliou-se enormemente. Tem muita gente dizendo que a viol�ncia aumentou. Eu n�o acho isso. O que aumentou foi a confiabilidade das mulheres. Elas sabem que podem denunciar porque ser�o protegidas e seus agressores ser�o exemplarmente punidos. � isso, as mulheres brasileiras acreditaram que poder�o deixar de ser v�timas de viol�ncia porque, agora, t�m uma lei que as amparam.

ABr – O que pode acontecer caso essa lei seja considerada inconstitucional?
Iriny – Se as mulheres forem frustradas no acesso ao seu direito, sustentado na Lei Maria da Penha, n�s teremos um retrocesso e corremos o risco de ter aumento dos homic�dios, que j� n�o s�o poucos.

ABr – Como est� o cen�rio de homic�dios de mulheres provocados pela viol�ncia dom�stica?
Iriny – Nossos dados est�o muito atrasados. H� pouco, foi divulgado o Mapa da Viol�ncia, mas ainda n�o se t�m mecanismos confi�veis para distinguir se as mortes s�o originadas pela viol�ncia dom�stica ou o crime comum. N�o d� para saber a quantidade de mortes que ocorrem motivadas por viol�ncia de g�nero. Os dados que as pol�cias enviam s�o dados misturados.

ABr – Como resolver essa car�ncia de dados que poderiam alimentar, inclusive, outras pol�ticas p�blicas voltadas para a redu��o da viol�ncia?
Iriny – N�s vamos trabalhar num novo banco de dados no Brasil. � preciso que se tenha um formul�rio diferenciado. Na hora do �bito, a pr�pria pol�cia tem que poder registrar que foi uma briga com o marido, com o namorado, com o pai ou com o irm�o. Estamos ainda discutindo como ser� esse formul�rio. Ele ainda n�o existe, mas a pr�pria Lei Maria da Penha determina a cria��o de um banco de dados no pa�s.

ABr – Quando as pol�cias poder�o contar com esse novo formul�rio?
Iriny – Estou falando em formul�rio porque foi a primeira forma pensada para a forma��o desse banco de dados, mas podemos utilizar outro mecanismo. Nesta semana, eu conversei sobre esse assunto com o ministro da Justi�a, Jos� Eduardo Cardozo, e estamos criando um grupo de trabalho para discutir a forma de constituir esse banco de dados e aliment�-lo com dados confi�veis. Esse banco de dados tem que nos dar a informa��o, por exemplo, do n�mero de homic�dios de mulheres no pa�s, quais mortes est�o relacionadas � viol�ncia dom�stica e � intoler�ncia de g�nero /*.


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