Numa manh� qualquer, a presidente Dilma Rousseff decide convocar todos os ministros e secret�rios das 37 pastas do primeiro escal�o do governo para uma reuni�o no Pal�cio do Planalto. A convoca��o � improv�vel, mas serve para ilustrar o que aconteceria na Esplanada dos Minist�rios. Se os 37 ministros e 180 secret�rios ordenassem os motoristas a se dirigirem ao Eixo Monumental, rumo ao Planalto, a via seria tomada por quase 220 carros oficiais. Enfileirados, os ve�culos ocupariam um trecho de mais de um quil�metro de extens�o. Os carros pretos tomariam uma faixa do Eixo Monumental da Catedral ao Congresso Nacional.
As regalias v�o al�m de ter um carro � disposi��o, poss�vel de ser usado, por exemplo, no caminho de casa para o trabalho e do trabalho para casa. Cargos comissionados que se encaixam no grupo de Dire��o e Assessoramento Superiores (DAS 4, 5 e 6) garantem acesso ao aux�lio-moradia. Os secret�rios dos minist�rios, que pertencem ao DAS-6 e s�o, em sua maioria, indica��es pol�ticas, est�o entre os principais benefici�rios. Eles recebem o maior benef�cio — s� n�o se equipara ao valor pago aos ministros. O Correio levantou que 51 secret�rios, 28% dos 180 existentes na estrutura do primeiro escal�o, receberam aux�lio-moradia nos seis primeiros meses do ano. O total pago � de R$ 566 mil. Outros dez titulares receberam reembolsos de aluguel, somente neste ano, que somam R$ 109 mil.
H� ainda uma terceira op��o para os altos funcion�rios do Executivo: os apartamentos funcionais, pertencentes � Uni�o. As destina��es dos im�veis se intensificaram neste in�cio de governo, com maior quantidade de concess�es dos apartamentos aos servidores p�blicos. Uma consulta �s publica��es das outorgas no Di�rio Oficial da Uni�o mostra que 80 im�veis passaram a contar com novos inquilinos neste ano. Dez s�o ocupados por secret�rios dos minist�rios que chegaram a Bras�lia e fizeram op��o pelo apartamento funcional.
Controle
A concess�o de regalias ao alto escal�o do Executivo � feita com pouca transpar�ncia ou controle. O Minist�rio do Planejamento, por exemplo, n�o sabe dizer com exatid�o quantos s�o os apartamentos funcionais ocupados pelos secret�rios dos minist�rios. O controle � feito pela Secretaria do Patrim�nio da Uni�o (SPU), ligada ao minist�rio, mas alguns apartamentos s�o concedidos pelo pr�prio �rg�o onde est� lotado o funcion�rio. � o caso do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renov�veis (Ibama) e da Casa Civil, que fizeram concess�es de im�veis sem passar pela SPU. N�o existe ainda qualquer controle sobre a frota de ve�culos oficiais: o levantamento e a administra��o desse patrim�nio s�o feitos em cada minist�rio. Os crit�rios adotados s�o diferentes de uma pasta para outra. Em comum, a grande quantidade de terceiriza��es do servi�o de transporte oficial.
As regalias a um servidor como um secret�rio v�o desde o momento em que ele sai de casa at� as horas passadas no local de trabalho. O carro oficial, que deve ser obrigatoriamente escuro, conforme instru��o normativa do Minist�rio do Planejamento, pode transportar o funcion�rio at� o minist�rio ou ao local de embarque e desembarque, no caso de uma viagem. Um decreto presidencial de 2009 permite o custeio das despesas deste �ltimo deslocamento.
Se o funcion�rio fizer op��o por receber esse dinheiro, deve abrir m�o do carro oficial. N�o h� rigor no controle do pagamento dessa indeniza��o nem do uso do carro preto � disposi��o dos secret�rios, chefes de gabinete e ocupantes de cargos de natureza especial.
Dentro dos minist�rios, uma estrutura montada garante a continuidade das regalias. O Pal�cio do Planalto e a maioria das pastas na Esplanada t�m uma copa por andar, com diversos gar�ons uniformizados para atender os servidores, em especial os mais graduados. Elevadores privativos s�o destinados �s autoridades.
“Esse neg�cio de ter carro, motorista e regalias paralelas � tipicamente latino. E n�o � apenas para compensar os sal�rios pagos no setor p�blico. Quem ocupa esses cargos quer ser distinguido como ocupante de um cargo de nobreza, com s�mbolos exteriores de prest�gio”, afirma Cl�udio Abramo, diretor da organiza��o n�o governamental Transpar�ncia Brasil. “Qualquer funcion�rio de minist�rio quer ser chamado de doutor”, completa.
Funcionais x aux�lios
Os im�veis funcionais n�o s�o a principal op��o dos secret�rios, que preferem receber o aux�lio-moradia. Uma das raz�es � que, para morar num desses apartamentos, � preciso pagar uma taxa de ocupa��o de
R$ 500, em m�dia, mais condom�nio de R$ 800. “Quem pega um apartamento funcional, geralmente, � o funcion�rio que tem fam�lia”, diz um servidor ouvido pelo Correio.
Compensa��o criticada
O sal�rio do DAS-6, correspondente ao cargo de secret�rio de minist�rio, � de R$ 11,1 mil, bem abaixo da remunera��o de um ministro, de R$ 26 mil. Com os sal�rios de presidente, vice-presidente e ministros equiparados aos ganhos de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), o teto do funcionalismo p�blico, a remunera��o dos secret�rios ficou defasada. As regalias s�o consentidas como forma de compensar essa diferen�a. Um equ�voco, na opini�o de Cl�udio Abramo. “Na Europa, os altos funcion�rios de minist�rios t�m bons sal�rios. E em pa�ses como Gr�-Bretanha, Alemanha e Su�cia n�o h� regalias como carros oficiais.”
"Esse neg�cio de ter carro, motorista e regalias paralelas � tipicamente latino. E n�o � apenas para compensar os sal�rios pagos no setor p�blico. Qualquer funcion�rio de minist�rio quer ser chamado de doutor”