�poca de mesas fartas, o Natal foi indigesto para uma parcela dos servidores p�blicos do Executivo e do Judici�rio, incluindo ju�zes e ministros de tribunais superiores. Eles viram ir para o ralo a esperan�a de receber do governo um bom aumento salarial em 2012, ap�s a aprova��o do Or�amento Geral da Uni�o em dezembro. Entretanto, a guilhotina nas emendas de parlamentares prevendo recursos para os reajustes e a economia de gastos p�blicos nem passaram perto das remunera��es e benesses recebidas pelas cabe�as coroadas da equipe econ�mica, que viraram o ano liderando o bloco de uma turma seleta do funcionalismo que embolsa supersal�rios acima do limite constitucional de R$ 26,7 mil pagos a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Donas das chaves dos cofres p�blicos, essas autoridades est�o recebendo entre R$ 32 mil e R$ 41,1 mil por m�s.
Ocupantes do primeiro e do segundo escal�o na Esplanada est�o engordando os altos sal�rios com participa��es, tamb�m conhecidas como jetons, em conselhos administrativos e fiscais de empresas estatais e at� privadas. Os extras para comparecer, em geral, a cada dois meses �s reuni�es dessas companhias v�o de R$ 2,1 mil a R$ 23 mil por m�s. Os ministros da Fazenda, Guido Mantega, e do Planejamento, Miriam Belchior, participam dos conselhos da Petrobras e da BR Distribuidora, que rendem, cada um, R$ 7 mil mensais, em m�dia. Com tudo somado, o chefe da equipe econ�mica e sua colega v�m embolsando, atualmente, R$ 40,9 mil brutos todo m�s.
Miriam ainda tem assento no conselho do Banco Nacional de Desenvolvimento Econ�mico e Social (BNDES), mas n�o recebe o jeton de R$ 5,5 mil da institui��o. O decreto presidencial pro�be que membros do governo sejam remunerados por mais de dois conselhos.
O secret�rio executivo de Mantega, Nelson Barbosa, n�o tem o sal�rio de R$ 26,7 mil pago a ministros de Estado. Ele recebe em torno de R$ 14 mil, correspondentes ao vencimento de professor cedido da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mais a gratifica��o pelo cargo, de R$ 6,8 mil. � um valor pr�ximo da remunera��o de qualquer servidor da elite do Executivo em in�cio de carreira. Mas Barbosa tamb�m abocanhou um assento nos dois dos melhores conselhos existentes: o da mineradora privada Vale e o do Banco do Brasil, que lhe pagam mais R$ 27,1 mil mensais, elevando seus ganhos para R$ 41,1 mil.
Felizardo
Na mineradora, o n�mero dois do Minist�rio da Fazenda entrou em nome do governo de uma forma enviesada, como representante dos fundos de pens�o de estatais — s�cios de fato da companhia. Mas � o conselho que melhor remunera. Barbosa recebe R$ 23 mil por m�s da empresa. Depois do cargo da Vale, o destaque � para o da Hidrel�trica Itaipu, que paga, em m�dia, R$ 19 mil mensais. O ministro felizardo � o da Defesa, Celso Amorim, com renda total de R$ 45,7 mil.
Nem a Fazenda nem o Planejamento comentaram o fato de os jetons n�o integrarem as remunera��es sujeitas ao limite constitucional e n�o sofrerem o chamado abate-teto, como ocorre com os rendimentos de diversos outros servidores do Executivo e de parte do Judici�rio. J� o Planejamento informou apenas que o recebimento de verbas por participa��o nesses conselhos est� previsto na Lei nº 8.112, de 1990, e que foi considerado constitucional pelo STF.
Conflito
Com tantas autoridades recebendo acima do limite constitucional e com os principais assentos nos conselhos j� ocupados por quem est� em minist�rios vinculados �s estatais, o ministro-chefe da Advocacia-Geral da Uni�o (AGU), Lu�s In�cio Adams, foi agraciado com dois jetons de empresas privadas para engordar ainda mais seus rendimentos. Ele integra o conselho administrativo da Brasilprev Seguros e Previd�ncia e o da Brasilcap. A primeira � controlada pelo grupo norte-americano Principal Financial Group, com 50,1% do capital. A segunda tem como s�cias majorit�rias as companhias Icatu Hartford, Sul Am�rica e Alian�a do Brasil. O Banco do Brasil det�m 49,9% do capital das duas, por isso, tem direito a indicar metade dos membros dos respectivos conselhos.
Com os dois extras, os rendimentos de Adams est�o na casa dos R$ 38,7 mil brutos. Na AGU, ele, que � procurador da Fazenda Nacional de carreira, � respons�vel por todas as a��es judiciais da Uni�o contra empresas privadas, principalmente aquelas que cobram impostos de devedores. Ao contr�rio das estatais e das demais autoridades, o advogado-geral da Uni�o e as duas companhias se recusaram a informar o valor mensal pago para que o titular da AGU d� palpites na administra��o dos dois grupos privados. Pelas informa��es obtidas pelo Correio, essa quantia � de pelo menos R$ 6 mil, em m�dia, por conselho.
Em nota, a assessoria de imprensa da AGU afirmou que o valor “s� pode ser obtido com o ministro, que se encontra em per�odo de f�rias”. O �rg�o negou a exist�ncia de incompatibilidade, alegando que Adams “j� declarou � Comiss�o de �tica da Presid�ncia da Rep�blica seu impedimento de atuar quando presente eventual conflito de interesses”, cabendo, a�, ao seu substituto agir no caso. A dire��o da AGU sustentou ainda que a rotina de Adams n�o chega a ficar comprometida pela atividade nos conselhos, que inclui viagens a S�o Paulo e ao Rio de Janeiro para a participa��o em reuni�es que duram um dia inteiro.
Economista da Tend�ncias Consultoria e especialista em finan�as p�blicas, Felipe Salto avalia que os supersal�rios recebidos pelos ministros e secret�rios representam um entrave para o corte de gastos anunciado pelo governo. “Esses valores servem como um mau exemplo e s�o prejudiciais para a constitui��o de uma estrat�gia fiscal de maior austeridade. Os funcion�rios que est�o na base das carreiras sempre v�o usar os que est�o no topo como refer�ncia para pedir reajustes”, afirma.
Para o cientista pol�tico Rafael Cortez, da Tend�ncias Consultoria, al�m dos altos sal�rios dos ministros de Estado, a atua��o de Adams em empresas privadas � grave. “A AGU, em tese, defende os interesses da Uni�o. Na medida em que o advogado-geral est� em um conselho de capital majoritariamente privado e tem acesso a informa��es privilegiadas, h� uma confus�o entre o p�blico e o privado”, sustenta.