O maranhense Jos� Augusto Carvalho, 45 anos, mal sabe o que � privatiza��o. Ainda que busque pela mem�ria, o pintor de paredes, daqueles que se preocupam com cada detalhe do trabalho a ser entregue a seus clientes, n�o se lembra do nome de nenhuma das empresas que, nas �ltimas duas d�cadas, foram vendidas pelo governo ao setor privado. Mas h� um ponto sobre o qual Carvalho � enf�tico e faz quest�o de opinar: a qualidade das estradas brasileiras. “S�o ruins demais. Se o governo n�o d� conta de mant�-las em bom estado, que transfira essa responsabilidade para algu�m. O que n�o pode � continuarmos com essa situa��o. Tantos buracos, que provocam tantos acidentes fatais”, diz.
O pintor tem raz�es de sobra para reclamar, mesmo estando longe de entender como funciona o sistema de concess�o de estradas e rodovias � iniciativa privada. Chova ou fa�a sol, l� est� ele, toda manh�, pegando o seu carro para ir ao trabalho e garantir o sustento da mulher, Adriana, 35, e da filha, J�lia, 6. “Sou totalmente dependente do meu autom�vel. Preciso me deslocar por todo o Distrito Federal e por Goi�s”, relata o morador da Vila Estrutural, um dos bairros mais pobres da capital do pa�s. A preocupa��o de Carvalho cresce porque ele ainda est� pagando as 30 presta��es do seu sonho sobre rodas. Quebr�-lo em uma vala qualquer lhe custar� muito caro.
As vendas recordes de carros novos em 2011 n�o s� agigantam as percep��es do pintor de paredes como tornam urgente o desafio da infraestrutura rodovi�ria do Brasil, que, at� 2020, dever� ser o terceiro maior produtor de autom�veis do mundo. Menos de 20% das estradas s�o pavimentadas e, pelos c�lculos da Confedera��o Nacional do Transporte (CNT), 24,9 mil quil�metros (ou 27% do total asfaltado) est�o em situa��o cr�tica.
Mudar essa realidade s� depende de vontade pol�tica e da maior efici�ncia do governo. “At� a China est� disposta a investir bilh�es de d�lares na log�stica do Brasil. O problema � que os investidores n�o enxergam regras seguras para isso”, afirma o diretor executivo da entidade, Bruno Batista. “Os projetos previstos para os pr�ximos 10 anos ser�o, por�m, cruciais para o pa�s avan�ar sem sustos”, acrescenta Guilherme Floriani, analista de infraestrutura do Minist�rio de Minas e Energia.
O consenso � claro: a tarefa de reduzir custos de transporte e riscos � vida � do Estado, que h� cinco anos tenta recolocar nos trilhos a agenda perdida dos investimentos em infraestrutura. A meta � superar os constrangimentos trazidos pelo crescimento econ�mico. E gra�as �s concess�es de rodovias, ferrovias e aeroportos previstas para este ano, al�m de leil�es do sistema el�trico, a expectativa � de que 2012 seja o marco da retomada das privatiza��es que o maranhense Jos� Augusto Carvalho n�o sabe o que significam, mas n�o tem d�vidas do quanto elas s�o importantes para o pa�s.
O economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central, defende para a log�stica uma abertura igual � que teve a telefonia, privatizada nos anos 1990. “O ran�o ideol�gico do governo n�o d� chance de o investimento privado imprimir a velocidade exigida pelo momento”, critica. Os n�meros da telefonia celular impressionam. O Brasil fechou 2011 com recorde de habilita��es, 39,3 milh�es, alta de 19,36% sobre 2010. S�o 242,2 milh�es de celulares ativos.
As telecomunica��es colecionam progressos que se aceleram com o aumento da renda. O lar da dona de casa Cristina Raquel Dinis Lopes, 43 anos, � um dos 12,74 milh�es com tev� por assinatura. A televis�o LCD de 32 polegadas que ganhou do marido no Dia das M�es � a divers�o dos filhos Marcos Kevin, 10, e Bianca Caroline, 9. “Eles adoram os desenhos”, conta Cristina. N�meros da Ag�ncia Nacional de Telecomunica��es (Anatel) mostram que a tev� paga registrou, em 2011, o maior crescimento dos �ltimos seis anos — 30,45% ou 2,97 milh�es de novos assinantes.
Como planejador e indutor, o Estado tem papel estrat�gico. Prova disso foi o sucesso, reconhecido no exterior, da pol�tica brasileira para enfrentar as recentes crises mundiais, anota o economista Claudio Porto, presidente da consultoria Macroplan. Os bancos p�blicos, em particular, tiveram papel decisivo para manter os n�veis de cr�dito ao consumo e � produ��o. � infraestrutura, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econ�mico e Social (BNDES) prev� desembolso de R$ 52 bilh�es ao longo deste ano.
“Apesar das in�meras oportunidades, s�o grandes as chances de atrasos em v�rios projetos”, pondera Hugo Tadeu, professor de log�stica da Funda��o Dom Cabral (FDC). Ele ressalta que o Estado n�o s� regula a atividade econ�mica, mas tamb�m � dono de grandes e pequenos neg�cios, sem falar da influ�ncia sobre fundos de pens�o de estatais, principais investidores do mercado de capitais.
Com isso, o capitalismo � brasileira interfere at� na gest�o privada. Cerca de 680 empresas de todos os setores t�m alguma participa��o ou influ�ncia do Pal�cio do Planalto. O apetite do Estado-empres�rio ganhou for�a no governo Lula e continua com Dilma Rousseff. Nos nove anos da gest�o petista, foram criadas v�rias estatais e recriadas outras, como a Telebr�s.