Quarenta e tr�s deputados estaduais mineiros gastaram ao longo de 2011 exatos R$ 1.422.913,47 da verba indenizat�ria com a contrata��o de advogados. O valor seria apenas mais uma despesa para o bolso do contribuinte se a maior parte do dinheiro – R$ 854.598,00, gastos por 23 parlamentares – n�o fosse usada para contratar como consultores jur�dicos profissionais que tamb�m os defenderam ou ainda os defendem em a��es c�veis, criminais e eleitorais sem qualquer rela��o com o mandato.
Os recursos sa�ram dos cofres p�blicos a t�tulo de “consultoria, assessoria e pesquisa”, um dos itens permitidos para uso da verba indenizat�ria de R$ 20 mil a que eles t�m direito todos os meses. A justificativa � sempre a mesma: orienta��o jur�dica na elabora��o de projetos de lei e pareceres t�cnicos para as comiss�es tem�ticas. Curiosamente, o gasto � efetuado quase mensalmente, mesmo os parlamentares tendo � sua disposi��o 85 consultores de 10 �reas custeados pela Assembleia Legislativa. No ano passado, o grupo realizou 7.011 consultorias, entre minutas de proposi��es ou pareceres sobre mat�rias em tramita��o – mesmo tipo de servi�o prestado pelos advogados contratados pelos gabinetes.
A Delibera��o 2.446/2009 da Assembleia Legislativa permite o gasto de verba indenizat�ria com escrit�rios de advogados, desde que o servi�o prestado tenha rela��o com “atividade inerente ao exerc�cio do mandato parlamentar”. Para a indeniza��o � exigido do deputado apenas o curr�culo do profissional contratado, e em caso de pessoa f�sica o comprovante do recolhimento mensal do Imposto de Renda (IR) sobre o respectivo servi�o. O limite com consultoria � R$ 5 mil mensais. Os parlamentares n�o costumam economizar nesse gasto.
A deputada Ana Maria Resende (PSDB) � um exemplo disso. Entre mar�o e novembro do ano passado ela destinou R$ 5 mil mensais para o escrit�rio Menezes Consultores e Advogados Associados, somando uma despesa de R$ 45 mil. Os profissionais do grupo defenderam o marido dela, o deputado federal Jairo Ata�de Vieira (DEM), em mandado de seguran�a no Supremo Tribunal Federal (STF) em que alegava ter o direito de ocupar uma cadeira na C�mara dos Deputados como primeiro suplente da coliga��o que o elegeu. Na ocasi�o foi discutido se a ordem de convoca��o de suplentes seria pelo partido ou pelo grupo que disputou as elei��es.
O deputado Sargento Rodrigues (PDT) parece muito satisfeito com a defesa feita pelo advogado Ant�nio Vicente Coelho Campos em dois processos que ele entrou, um no Tribunal de Justi�a de Minas Gerais (j� encerrado) e um recurso que est� no Superior Tribunal de Justi�a (STJ), envolvendo a��o penal movida no Tribunal de Justi�a Militar (TJM). Tanto que o parlamentar manteve contrato de consultoria com o advogado entre fevereiro e dezembro de 2011, totalizando um custo de R$ R$ 55 mil. Impress�o semelhante deve ter o colega de plen�rio Jayro Lessa (DEM). O mesmo escrit�rio que o defende em uma a��o civil p�blica ajuizada pelo Minist�rio P�blico no Tribunal de Justi�a e o representa em processos tribut�rios em tramita��o na Justi�a Federal foi o escolhido para prestar servi�os ao seu gabinete ao custo de R$ 35 mil: o Cursage & Molisani Advogados Associados.
Um pouco mais, R$ 55 mil, gastou Ant�nio Genaro (PSC) para a consultoria do escrit�rio Moreira Alves Advogados Associados, o mesmo que contratou para represent�-lo em a��o trabalhista no Tribunal Superior do Trabalho (TST), em a��o de presta��o de contas da campanha de 2010 na Justi�a Eleitoral e uma apela��o c�vel no TRF.
Os petistas Durval �ngelo e Elismar Prado optaram por contratar como consultor o escrit�rio Lobo Leite Sociedade de Advogados. Em 2011 eles gastaram R$ 90 mil com profissionais que auxiliam o PT em a��es judiciais e que tamb�m advogam para eles. Durval �ngelo responde a uma a��o c�vel no TJMG, e Elismar Prado a uma a��o de presta��o de contas de campanha, iniciada no Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MG) e que agora tramita no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
H� ainda deputados que contrataram o mesmo escrit�rio. Um deles, o Mateddi Maziero Advogados Associados presta servi�os para cinco parlamentares: S�vio Souza Cruz (PMDB), Tadeuzinho Leite (PMDB), Ant�nio J�lio (PMDB), Ivair Nogueira (PMDB) e Paulo Lamac (PT). Profissionais do escrit�rio advogam em v�rias a��es judiciais que t�m entre as partes o PMDB, partido de quatro de seus clientes na Assembleia Legislativa. Somente com eles os advogados receberam em 2011 R$ 142, 2 mil. Do petista, a quem defendem em a��o em que � acusado de usar indevidamente a verba indenizat�ria recebida enquanto era vereador em Belo Horizonte, foram outros R$ 40 mil.
Consultores chamados de incompetentes
A culpa � da Assembleia. Essa � a vis�o dos deputados ouvidos pela reportagem, que justificaram o gasto da verba indenizat�ria com advogados alegando incompet�ncia ou insufici�ncia dos consultores disponibilizados pela Casa. Outra alega��o � de que precisam de um servi�o personalizado. E sobre a “coincid�ncia” das contrata��es de profissionais que os defendem judicialmente, a justificativa � de que s�o competentes para ambas as fun��es.
� o caso do deputado Sargento Rodrigues, que contrata o advogado Ant�nio Vicente Coelho Campos para consultoria e sua defesa. O parlamentar afirmou que a consultoria do Legislativo “n�o atende � altura”. Segundo ele, os t�cnicos da Casa s�o insuficientes e sobrecarregados de trabalho. “Tem projeto que pe�o parecer como relator em comiss�o e demoram a liberar. J� reclamei isso”, acrescentou. Questionado sobre a contrata��o para fins judiciais, Rodrigues respondeu, irritado, que a pergunta era desrespeitosa, e garantiu que o pagamento para a��es n�o vem da verba indenizat�ria, mas de sua conta particular. “Por que voc�s n�o questionam as verbas do Minist�rio P�blico ou do Judici�rio?”, rebateu.
O deputado Jayro Lessa (DEM) argumentou que um profissional contratado por ele “n�o � a mesma coisa” que os consultores da Assembleia que, segundo ele, n�o s�o advogados. Neste caso, parece desconhecer que para o cargo de consultor � exigido diploma de bacharel em direito e inscri��o na Ordem dos Advogados do Brasil. “O Jos� Geraldo n�o � advogado, � formado em inform�tica”, afirmou, se referindo ao secret�rio-geral da mesa que, al�m de n�o ser consultor, � tamb�m formado em direito. Questionado em seguida se os funcion�rios da Casa n�o serviriam, minimizou: “Servem, dependendo do caso”. Lessa disse que os advogados s�o contratados pelo seu grupo de empresas e pagos por elas. “Contratei porque considero bons, trabalham comigo h� muitos anos”, disse.
O petista Elismar Prado alegou precisar do apoio adicional por ter uma “demanda gigantesca” e a Casa n�o oferecer o servi�o em todas as �reas necess�rias. “Tenho uma atividade intensa, sou o deputado que mais tem projetos, talvez por isso precise de uma consultoria maior”, afirmou. A advogada Edilene Lobo tamb�m atua em seu processo de presta��o de contas na Justi�a Eleitoral. Segundo Elismar, ela trabalha para v�rios partidos no per�odo eleitoral, inclusive para o PT, e � paga de outra forma. “Muitas vezes ela presta servi�o para o partido e faz o trabalho para todos da agremia��o. Ela tem seu escrit�rio e o direito de prestar esse outro servi�o”, disse.
O deputado Ivair Nogueira (PMDB) alegou que o escrit�rio contratado por ele presta servi�os de an�lise e acompanhamento de projetos. “Voc� pode ter uma consultoria jur�dica com uma an�lise diferenciada dos consultores da Assembleia.” Ele diz ter optado por esses profissionais por eles j� fazerem trabalhos para o PMDB e o defenderem em uma a��o eleitoral. “S�o muito bons”, atesta. Ivair garante que tirou do pr�prio bolso os honor�rios pagos pela a��o judicial, mas se negou a revelar o valor. Procurados, os deputados Ana Maria Resende (PSDB) e Ant�nio Genaro (PSC) n�o foram encontrados.
"An�lise � subjetiva"
O diretor de Processo Legislativo da Assembleia, Sabino Fleury, rebateu as afirma��es dos parlamentares: segundo ele, a “incompet�ncia” dos consultores � uma an�lise “subjetiva”. “H� trabalhadores de pior e melhor qualidade, como existem em qualquer �rea e lugar do mundo”, disse. Mas Sabino lembrou que os profissionais foram todos aprovados em um concorrido concurso p�blico e a maior parte tem especializa��o, mestrado ou doutorado na �rea em que atuam. Uma exig�ncia aos consultores jur�dicos � a forma��o em direito. Em rela��o � insufici�ncia do n�mero de consultores, o diretor reconheceu que a demanda vem crescendo a cada ano e o quadro de contratados n�o vem acompanhando esse ritmo.
Honor�rios
Ao longo de 2011, os deputados estaduais gastaram R$ 1.422.913,47 com consultoria prestada por advogados.
A maior parte do valor (R$ 854.598) remunerou profissionais que j� os defenderam ou defendem em a��es judiciais.