Prestes a ser deflagrado, o pol�mico julgamento da a��o penal do mensal�o reacendeu no meio jur�dico a discuss�o sobre o foro privilegiado e a voca��o constitucional do Supremo Tribunal Federal. Alguns defensores dos 38 acusados planejam questionar a compet�ncia da inst�ncia m�xima do Judici�rio para julgar r�us sem prerrogativa de foro. � uma estrat�gia que pode retardar o in�cio da jornada ou acabar fulminada pela Corte.
Apenas tr�s dos 38 r�us do processo aberto para julgar o maior esc�ndalo da era Lula t�m foro privilegiado: os deputados federais Jo�o Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT).
Por causa deles a famosa a��o penal 470 ficou sob a tutela do STF. Os outros 35 acusados, tivesse havido a separa��o, estariam agora sob o crivo da primeira inst�ncia judicial.
Na abertura do julgamento, marcada para o dia 2, advogados dever�o levantar quest�o de ordem para que os ministros do STF decidam se ainda cabe o deslocamento e a divis�o dos autos.
� remota a possibilidade de o STF acolher, a essa altura, manifesta��o de tal natureza - at� porque a Corte j� decidiu anteriormente conduzir todo o processo sob alega��o de que os fatos s�o os mesmos, da� n�o haveria como cindir o julgamento.
Mas o tema ainda provoca controv�rsia na Corte. "O Supremo Tribunal Federal n�o pode ficar variando. Em alguns inqu�ritos desmembra, em outros n�o, em algumas a��es penais desmembra, em outras n�o", argumenta o ministro Marco Aur�lio Mello, que defendeu o desmembramento do mensal�o quando ele ainda era um inqu�rito.
Marco Aur�lio foi voto vencido. Seus pares cravaram que a compet�ncia sobre o mensal�o, e todos os seus r�us, � do STF. "O desmembramento do processo j� foi discutido e o tribunal, acertadamente, repeliu a ideia, pois o fato n�o pode ter julgamentos distintos", anota o criminalista Alberto Zacharias Toron, que defende Jo�o Paulo Cunha. "O mesmo fato n�o pode ter julgamentos distintos por ju�zes diferentes."
N�o � o que pensam advogados de outros r�us. Marcelo Leonardo, que defende Marcos Val�rio, j� adiantou que vai provocar o STF para que os ministros novamente apreciem essa quest�o.
Voca��o
Para o coordenador da Promotoria de Defesa do Patrim�nio P�blico de Belo Horizonte, Jo�o Medeiros, que conduz a acusa��o no julgamento do chamado mensal�o mineiro - suposto esquema de desvio de recursos p�blicos durante a campanha � reelei��o do ent�o governador de Minas, Eduardo Azeredo (PSDB), em 1998 -, a manuten��o do processo no STF fere a voca��o da Corte.
"� um julgamento numa inst�ncia �nica. Isso no limite acaba prejudicando as duas partes. N�o vai ter recurso. Se forem absolvidos n�o h� a quem recorrer e, se forem condenados, a mesma coisa", destaca. "Esse problema � fruto da exist�ncia do foro privilegiado, que transforma o Supremo em inst�ncia origin�ria e �nica, quando na verdade ele n�o deveria cuidar disso. A voca��o do Supremo � de ordem constitucional, de defesa da Constitui��o."
Por possuir foro privilegiado, a a��o penal contra Azeredo foi aberta no STF. Em maio de 2009, o relator, ministro Joaquim Barbosa, ordenou o desmembramento do processo, determinando que todos, exceto Azeredo, respondessem aos crimes na Justi�a Federal, que, por sua vez, remeteu os autos para a Justi�a Estadual. Outro r�u parlamentar e com processo desmembrado � o senador Cl�sio Andrade (PMDB), que assumiu a cadeira de Eliseu Resende (DEM), morto no in�cio do ano passado. O julgamento na 9.ª Vara Criminal de Belo Horizonte est� em fase de instru��o - j� foram ouvidas as testemunhas de acusa��o e de defesa de tr�s dos dez r�us. Na opini�o de Medeiros, h� risco de uma decis�o contradit�ria. "Esse processo (mensal�o mineiro) foi desmembrado e o outro n�o."
'Tolice'
Segundo o ex-ministro e ex-presidente do STF Carlos Velloso, a desconex�o tornar �gil o julgamento. "Por�m, no caso espec�fico do processo do mensal�o, seria muito dif�cil fazer a separa��o porque as a��es est�o muito entrela�adas. No caso do mensal�o n�o seria poss�vel o desmembramento pelas circunst�ncias, pelas condutas que se entrela�am, tidas delituosas", afirma. "Imaginemos que poderia haver condena��o de primeiro grau e absolvi��o no Supremo, ou vice versa."
Para Velloso, o que n�o deveria existir � mesmo o foro privilegiado, salvo raras exce��es. "A Emenda Constitucional 01, outorgada pela Junta Militar, conferiu esse foro privilegiado aos parlamentares. A emenda 01 � que fez essa tolice", reclama. "Os tribunais n�o t�m voca��o de fazer as vezes de juiz de primeiro grau, de fazer instru��o. Ju�zes t�m sido convocados para auxiliar os ministros do Supremo o que � absolutamente irregular. A atividade jurisdicional � indeleg�vel, ministro n�o pode delegar essa atribui��o."
Na avalia��o de Velloso, os ministros do STF est�o em situa��o dif�cil. "Um tribunal que tem voca��o para julgar recursos e a��es de constitucionalidade se v� com a atribui��o de juiz de primeiro grau, tendo que ouvir testemunhas, fazer interrogat�rios. � incab�vel, inconceb�vel. A cada dia aumenta mais o n�mero de privilegiados. Leva ao descr�dito da fun��o jurisdicional."