
No calor do debate em torno da Proposta de Emenda � Constitui��o (PEC) 37 que coloca em campos opostos o Minist�rio P�blico e as pol�cias Civil e Federal, que deveriam ser complementares, todos concordam com um ponto essencial: a a��o do Minist�rio P�blico � n�o s� bem-vinda, mas tamb�m indispens�vel para o combate ao crime. Os dois lados afastam a possibilidade de a queda de bra�o estar sendo conduzida por raz�es corporativas, defendem a colabora��o entre o MP e as pol�cias, mas est�o longe de um consenso sobre se deve haver e quais devem ser os limites de atua��o do �rg�o na investiga��o criminal – vetada pela PEC.
O procurador de Justi�a Andr� Estev�o Ubaldino Pereira, coordenador das Promotorias de Combate ao Crime Organizado, invoca o artigo 5º da Constitui��o, que trata dos direitos fundamentais do cidad�o, para defender a atua��o do Minist�rio P�blico em investiga��es criminais. Referindo-se ao direito do cidad�o de receber prote��o concreta do Estado, o procurador argumenta que retirar o poder de investiga��o de um �rg�o corresponde a cassar parte da cidadania, numa realidade como a brasileira, em que as pol�cias judici�rias apresentam uma cr�nica falta de estrutura. “Em um cen�rio ideal, a pol�cia faria tudo sozinha. E deve fazer tudo, recebendo apenas a contribui��o do Minist�rio P�blico. Mas, at� que haja o fortalecimento da institui��o policial, o cidad�o n�o pode suportar o �nus da pol�cia desaparelhada. Assim a investiga��o pelo MP � uma alternativa”, defende Ubaldino Pereira, autor de uma tese sobre o tema.
O argumento do procurador encontra respaldo na opini�o do promotor de Justi�a de Bras�lia Ant�nio Suxburger, que v� com desconfian�a at� mesmo a proposi��o de uma PEC pela C�mara para tratar do tema num momento em que o Supremo Tribunal Federal (STF) se prepara para se pronunciar sobre a atua��o do Minist�rio P�blico. “A proposta �, no m�nimo, inoportuna e afronta o STF, a inst�ncia suprema para interpreta��o da Constitui��o. Al�m disso, cassar o direito de investiga��o do MP � ir na contram�o da efetividade e aprimoramento do combate ao crime”, diz. Suxburger lembra que em apenas tr�s pa�ses do mundo – Uganda, Indon�sia e Qu�nia – o MP n�o pode apurar crimes.
Adotando um tom conciliador, mas na defesa da investiga��o criminal como tarefa exclusiva das pol�cias, o presidente da Associa��o dos Delegados de Pol�cia Federal (ADPF), Marcos Le�ncio, afirma que a edi��o da PEC 37 � importante para impor regras para as apura��es no pa�s. “N�s n�o questionamos o poder de investiga��o do Minist�rio P�blico, o que buscamos � uma investiga��o colaborativa, com os representantes do MP atuando diretamente com a pol�cia. O que n�o pode haver s�o apura��es aut�nomas e paralelas pela institui��o, como ocorre hoje. O MP exerce esse poder sem respaldo legal”, afirma.
De acordo com Le�ncio, atualmente o Minist�rio P�blico investiga como as pol�cias judici�rias, mas sem qualquer controle. “Qual o procedimento a ser adotado, qual a forma, como deve ser feito? Atualmente n�o h� respostas para essas perguntas”, diz ele, que engrossa a lista daqueles que invocam os direitos constitucionais do cidad�o nos dois polos do debate: “A investiga��o sem controle � uma viola��o”, afirma.
Com esse argumento, a Pol�cia Federal ganha um aliado de peso na defesa da PEC: a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). O professor de direito e desembargador aposentado Edson Smaniotto, que participou da audi�ncia p�blica sobre a proposta de emenda � Constitui��o como representante da entidade, diz que � inaceit�vel que a autoridade que tem a fun��o de acusar seja a mesma a colher a prova do crime. Para ele, quando promove uma investiga��o, o Minist�rio P�blico n�o tem como preocupa��o de base o que de fato aconteceu, mas trabalha com “uma l�gica constru�da”, para provar o que lhe interessa. “Nas investiga��es do MP n�o existem garantias para o investigado. O andamento das apura��es � sigiloso, n�o h� transpar�ncia”, afirma. “O inqu�rito de tese merece rep�dio porque fere a cidadania”, defende o professor.
O MP garante que existem, sim, regras para as investiga��es criminais feitas pelo �rg�o, estabelecidas pela Resolu��o 13 do Conselho Nacional do Minist�rio P�blico (CNMP), que define os prazos e a conduta correta no processo de apura��o. A exist�ncia dessas normas, entretanto, n�o convence o outro lado. “O CNMP n�o tem compet�ncia para elaborar norma, s� o Congresso pode legislar. Os crit�rios apresentados pela resolu��o s�o da institui��o e n�o do cidad�o”, rebate Smaniotto.
Cabo de guerra
Os argumentos de cada um dos grupos sobre a PEC 37
Contr�rios
» O grupo, que chama a proposta de PEC da Impunidade, afirma que ela impedir�, somente no �mbito do Minist�rio P�blico Federal, que mais de 1 mil procuradores da Rep�blica trabalhem no combate ao desvio de dinheiro p�blico e � corrup��o.
» A proposta reduz o n�mero de �rg�os empenhados na fiscaliza��o.
» A PEC gera inseguran�a jur�dica e desorganiza o sistema de investiga��o criminal, j� que permitir� que os r�us em in�meros procedimentos criminais suscitem novos questionamentos processuais sobre supostas nulidades.
» A proposta vai na contram�o de tratados internacionais assinados pelo Brasil, entre eles a Conven��o de Palermo (que trata do combate ao crime organizado), a Conven��o de M�rida (corrup��o) e a Conven��o das Na��es Unidas contra o Crime Organizado Transnacional. Todas determinam a ampla participa��o do Minist�rio P�blico nas investiga��es.
Favor�veis
» Esse grupo denomina a proposta de PEC da Legalidade sob o argumento de que o Minist�rio P�blico exerce hoje poder de investiga��o sem respaldo legal.
» No Minist�rio P�blico, aquele que tem a fun��o de acusar � a mesma autoridade respons�vel pela coleta de prova, o que significa a imposi��o de uma “l�gica constru�da”.
» N�o existem garantias ao investigado, j� que o procedimento no MP tem andamento sigiloso e n�o existe previs�o legal
para acesso �s partes.
» O inqu�rito policial obedece a regras, exige transpar�ncia e tem prazos estabelecidos. Se houver neglig�ncia das pol�cias, o Minist�rio P�blico pode intervir e solicitar dilig�ncias para conclus�o do inqu�rito. No caso das investiga��es do MP, as regras foram criadas pela pr�pria institui��o.