
O feriado prolongado da Semana Santa n�o foi capaz de arrefecer a campanha contra a presen�a do deputado federal e pastor Marco Feliciano (PSC-SP) na presid�ncia da Comiss�o de Direitos Humanos da C�mara. E o tom dos debates subiu dos dois lados. Nas redes sociais, espalham-se mensagens de internautas para que n�o se desista de lutar pela ren�ncia do pastor, enquanto nas ruas os protestos se multiplicam a cada participa��o de Feliciano em cultos. Por outro lado, o parlamentar, como se estivesse numa guerra santa, convocou seus seguidores e adeptos de sua Igreja Templo do Avivamento a tamb�m ocuparem as ruas em sua defesa. A verdade � que, mais uma vez, na abertura dos trabalhos parlamentares, amanh�, em Bras�lia, Feliciano tem uma faca sobre sua cabe�a. Est� marcada para amanh� uma reuni�o de l�deres, em que o PPS vai propor a ren�ncia coletiva dos integrantes da comiss�o para for�ar uma nova elei��o.
A reuni�o � uma esp�cie de terceiro tempo da disputa travada em torno da perman�ncia de Feliciano na comiss�o. No primeiro, em 20 de mar�o, sob press�o de sucessivas manifesta��es contra o pastor, o presidente da C�mara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), pediu ao PSC que negociasse a ren�ncia do deputado ao comando do colegiado, mas ele n�o arredou p�. Na semana seguinte, em 26 de mar�o, Feliciano saiu vitorioso no segundo tempo da disputa: depois de uma longa reuni�o, o partido decidiu apoiar sua decis�o de ficar no cargo.
Ontem, Marco Feliciano participou de uma reuni�o de pastores e lideran�as evang�licas em Rond�nia, onde os discursos se multiplicaram em defesa de sua perman�ncia no cargo, o que transformou o encontro em mais um ato pol�tico. Revezaram-se no microfone os deputados estadual Maur�o de Carvalho (PP) e o federal Nilton Capixaba (PTB-RO), que sustentaram a import�ncia da perman�ncia do pastor no atual posto. A reuni�o foi transmitida quase que de minuto a minuto pela assessoria do pastor por meio do microblog Twitter, que inclu�a ainda outras mensagens de apoio, como a do pastor Erick Coelho, que culpa o PT pelo desgaste do parlamentar evang�lico. “Meu sonho � que V. Exa. saia da base do governo, sem sair da CDHM. Te ver livre dessa corja petista que d� com uma m�o e tira com outra”, disse Coelho no microblog. Tamb�m no Twitter, Feliciano publicou mensagem a um amigo para tentar se afastar da pecha de homof�bico: “Alu�sio. Homossexual assumido o qual respeito, frequenta minha casa e � amigo da minha fam�lia. Obrigado pelo apoio.”
Estrat�gia
Apesar das manifesta��es de apoio de algumas igrejas evang�licas, os frequentes embates de Feliciano com militantes dos direitos humanos – que culminaram com a pris�o de um manifestante na semana passada, durante reuni�o da comiss�o – deixaram o deputado com a imagem arranhada mesmo entre evang�licos. Parte deles acredita que a postura assumida pelo parlamentar faz com que se aprofunde o preconceito contra a religi�o. Entre eles est� o pastor Ricardo Gondim, te�logo, mestre em ci�ncias da religi�o e l�der da Igreja Betesda (lugar misericordioso de Deus), que critica as declara��es do pastor de que a �frica e seus habitantes seriam amaldi�oados por Deus. Tal tipo de teologia, segundo Gondim, � racista e fundamentalista na sua ess�ncia. Ele tem dito que o Deus da B�blia n�o deve ser visto como um s�dico que se compraz em amaldi�oar os homens, mas sim como parceiro deles.
Mesmo diante de algum desconforto, a bancada evang�lica tem demonstrado sua for�a no Congresso, revelada no epis�dio de Marco Feliciano. Para n�o ter que enfrentar uma queda de bra�o com seus representantes, o presidente da C�mara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), tem buscado o di�logo, para evitar um confronto. Amanh�, ser� a segunda vez que ele se re�ne com l�deres para debater a situa��o do pastor, que ele considera “insustent�vel” no cargo. Tudo isso para evitar que a quest�o chegue � corregedoria da Casa ou mesmo � sua Comiss�o de �tica. Para isso, o argumento seria o inqu�rito a que Marco Feliciano responde no Supremo Tribunal Federal, depois de ser denunciado por racismo pela Procuradoria da Rep�blica, e tamb�m ao processo por estelionato.
Cronologia de uma crise
27 de fevereiro
L�deres dos partidos se re�nem para discutir a distribui��o das comiss�es e, por acordo, a de Direitos Humanos e Minorias � destinada ao PSC. O PT, que tradicionalmente liderou esse colegiado, abriu m�o
da vaga para beneficiar a legenda, que est� na base de apoio do governo Dilma.
28 de fevereiro
O PSC anuncia a indica��o do deputado e pastor Marco Feliciano, de S�o Paulo. Movimentos de defesa dos direitos humanos e a imprensa mostram que o pastor estava ligado a uma grande pol�mica desde 2011, quando
escreveu em uma rede
social que o amor entre
pessoas do mesmo sexo
levava “ao �dio, ao crime e � rejei��o” e que os descendentes de africanos seriam “amaldi�oados”.
7 de mar�o
Marco Feliciano � eleito para a presid�ncia da Comiss�o de Direitos Humanos. Ao todo, 12 deputados participaram da sess�o e o pastor obteve 11 votos –o restante foi em branco. Seis parlamentares do PT, PSOL e PSB abandonaram a sess�o em protesto e n�o participaram da vota��o. O deputado Domingos Dutra (PT-MA), que at� ent�o presidia a comiss�o, renunciou ao cargo e abandonou a reuni�o.
9 de mar�o
Protestos contra Feliciano ocorrem em todo o pa�s. Militantes de Belo Horizonte, Bras�lia, Rio de Janeiro, Salvador, Fortaleza, Porto Alegre, Curitiba e Florian�polis fazem manifesta��es para mostrar descontentamento com a elei��o de Feliciano.
13 de mar�o
Feliciano preside sua primeira sess�o na Comiss�o de Direitos Humanos em meio a muitos protestos no Congresso. Centenas de militantes foram ao plen�rio da comiss�o para tentar participar da reuni�o, mas muitos foram barrados.
Os que conseguiram entrar no colegiado fizeram muito barulho, atrapalhando o andamento da sess�o. Parlamentares contr�rios a Feliciano mais uma vez abandonaram a reuni�o e alguns quase sa�ram no tapa.
20 de mar�o
Em sua segunda sess�o na Comiss�o de Direitos Humanos, Feliciano abandona a reuni�o depois de apenas oito minutos. Mais uma vez, militantes gritam palavras de ordem contra o pastor e pedem a sua ren�ncia. Deputados criam a Frente Parlamentar dos Direitos Humanos, para tentar atuar paralelamente ao colegiado oficial. O presidente da C�mara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), pede ao PSC uma sa�da para o impasse e representantes do partido prometem uma solu��o em poucos dias.
21 de mar�o
O presidente da C�mara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), d� um ultimato ao PSC para que definisse at� ontem a situa��o de Feliciano na comiss�o.
26 de mar�o
O PSC decide manter Feliciano na presid�ncia da comiss�o
Um pastor e suas muitas empresas
Enquanto a pol�mica sobre a atua��o na C�mara de Marco Feliciano, dubl� de pastor e deputado federal, se multiplicam, seu patrim�nio tamb�m tem crescido. Quando assumiu a cadeira no Parlamento, h� dois anos, Feliciano declarou ter 50% das cotas de tr�s empresas – Kakeka Com�rcio Varejista de Brinquedos e Artigos do Vestu�rio Ltda, no valor de R$ 2,5 mil, Marco Feliciano Empreendimentos Culturais e Eventos, no valor de R$ 5 mil, e do Tempo de Avivamento Emprrendimentos Ltda. No entanto, hoje, registrados em nome do pastor, estariam ainda outras tr�s empresas, das quais teria participa��o desde 2008, ou seja, antes da elei��o.
Na lista de participa��es societ�rias do pastor est� inclu�do at� mesmo um cons�rcio de bens e direitos, a GMF – Administra��o e Representa��o Comercial de Cons�rcios de Bens e Direitos Ltda., da qual participa desde 2007 e tem 51% das a��es. Al�m dela, Feliciano seria s�cio tamb�m da Associa��o Cultural e Educacional Vida e Paz, em sociedade com sua mulher, Edileusa de Castro Silva Feliciano, e da Cinese – Centro de Intelig�ncia Espiritual e Emocional – Cursos Ltda. Na verdade, Edileusa, al�m de casada com o pastor, divide com ele a maioria de seus neg�cios.
As empresas, entretanto, s�o apenas parte do patrim�nio do menino pobre de Orl�ndia (SP), que se transformou em pastor bem-sucedido e pol�tico. Na declara��o dada ao Tribunal Superior Eleitoral, Feliciano admitiu ser dono de dois pr�dios residenciais, duas casas, v�rios terrenos, al�m de quatro carros, entre eles uma BMW. Feliciano teria se tornado evang�lico ainda aos 14 anos e, desde ent�o, passou a se dedicar � igreja. Em 1999, fez a sua primeira prega��o no congresso dos Gide�es Mission�rios, em Cambori� (SC), que reuniu cerca de 100 mil pessoas. O Estado de Minas tenta desde quinta-feira falar com o pastor Feliciano, mas sem sucesso. Nenhum dos nove n�meros de celular registrados em nome do pastor atendeu.
O que nos interessa - Influ�ncia as vota��es
A perman�ncia do pastor Feliciano na presid�ncia da Comiss�o de Direitos Humanos ter� influ�ncia determinante na vota��o de projetos como a criminaliza��o da homofobia, o casamento gay e a regulamenta��o da prostitui��o, que enfrentar�o ainda mais resist�ncia. O principal objetivo do grupo ligado a Feliciano � barrar essas propostas e aprovar projetos que v�o na contram�o das proposi��es de perfil liberal, como os apresentados por deputados evang�licos que descriminalizam a homofobia ou que tentam anular a decis�o do STF validando a uni�o civil entre pessoas do mesmo sexo.