Bertha Maakaroun
O pa�s est� dividido. Em repeti��o a um padr�o que se intensifica desde as elei��es de 2006, petistas e tucanos – que h� 20 anos polarizam a disputa pol�tica – voltam a pintar de vermelho e azul o mapa da distribui��o de votos do pa�s, segundo o impacto local dos programas de transfer�ncia de renda nas diferentes regi�es do pa�s. “Embora Dilma Rousseff (PT) e A�cio Neves (PSDB) sejam votados em todas as regi�es, o melhor desempenho eleitoral de cada um, ou seja, aquele que est� acima da m�dia de votos que cada um tem no pa�s, divide o territ�rio em redutos”, avalia a cientista pol�tica e pesquisadora S�nia Terron, coordenadora do grupo de An�lise Espacial da Am�rica Latina (Alacip). As regi�es Nordeste e Norte, inclusive Norte de Minas e o estado do Rio de Janeiro, s�o vermelhas. As regi�es Sudeste e Sul, inclusive Sul de Minas e o estado de Goi�s, s�o azuis. E h�, no Centro-Oeste do pa�s, uma zona neutra, onde a vota��o dos dois advers�rios se aproxima e as diferen�as encolhem.

A partir das elei��es presidenciais de 2006 verifica-se esse padr�o na geografia do voto, que pouco se alterou com a entrada de Marina Silva (PSB) nas disputas de 2010 e de 2014. “A Marina apresentou uma vota��o maior do que tucanos e petistas apenas nos estados de Pernambuco e do Acre. Em todos os outros estados manteve-se o padr�o da polariza��o entre o PSDB e o PT”, afirma Terron, acrescentando que, particularmente no caso de Pernambuco, esse desempenho deveu-se mais a um fator conjuntural: � a terra natal do ex-governador Eduardo Campos (PSB), morto em tr�gico acidente, a quem Marina Silva sucedeu na disputa presidencial.
Al�m dos territ�rios divididos, a dicotomia entre as classes mais “pobres” e mais “ricas” emerge na an�lise das pesquisas, quando o voto em Dilma e em A�cio � distribu�do segundo as categorias de renda familiar, de escolaridade e de acesso aos itens de conforto dom�stico. “A posi��o do eleitor na escala socioecon�mica entrou claramente no processo pol�tico-eleitoral e passou a expressar, com muita clareza, a desigualdade social”, afirma o cientista pol�tico e professor em�rito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) F�bio Wanderley Reis. “Entre 2002 e 2014, a representa��o gr�fica da distribui��o da renda no pa�s se transformou de uma pir�mide para uma esp�cie de ovo deitado. Ou seja, agora, o eleitorado � predominante da chamada classe m�dia”, considera o cientista.
Nesse sentido, � alta a correla��o entre inten��o de voto e a posi��o socioecon�mica: o apoio a Dilma cresce nas classes mais baixas; o inverso � verdadeiro para A�cio Neves, que tem melhor desempenho nas classes mais altas. A partir do segundo turno, a disputa entre ambos foi pela nova classe m�dia – m�dia baixa – e a classe m�dia intermedi�ria. “Essa quest�o da divis�o da prefer�ncia dos eleitores pela classe socioecon�mica tem proje��o regional, que contrap�e Nordeste/Norte ao Sul/Sudeste. H� portanto um enfrentamento entre eleitores de estratos socioecon�micos baixo e alto, que se reproduz pa�s afora”, afirma o cientista.
Reforma A polariza��o entre Nordeste/Norte e Sul/Sudeste, pobres e ricos, personificada nas candidaturas de Dilma Rousseff e de A�cio Neves, tem, para o cientista pol�tico, um aspecto positivo para a estrutura partid�ria brasileira. Extremamente fragmentada, h� hoje 33 legendas registradas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em condi��es de concorrer aos cargos eletivos, entre os quais 28 conquistaram cadeiras na C�mara dos Deputados. “No eixo PT-PSDB que se mant�m a partir de 1994 para as elei��es presidenciais est� a promessa de simplifica��o do sistema partid�rio brasileiro”, afirma F�bio Wanderley Reis. “No in�cio desta elei��o, indagava-se at� que ponto essa polariza��o, que nasceu no lulismo, se projetaria em termos partid�rios e se manteria com a Dilma”, avalia o cientista.
Ao transportar para o Congresso Nacional a polariza��o entre tucanos e petistas que se manteve nestas elei��es ao Pal�cio do Planalto, as duas legendas – ganhe quem ganhar – ser�o os n�cleos da situa��o e da oposi��o, t�m potencial para reduzir o que F�bio Wanderley Reis chama de “componente excessivamente pragm�tico e corruptor” , segundo ele encarnado no PMDB e pelas legendas de pequeno e m�dio partes que negociam e exigem cargos na m�quina administrativa em troca de apoio pol�tico. “Em todos os governos, o PMDB e muitas dessas legendas menores sem plataforma jogam o presidencialismo de coaliz�o fazendo chantagem e exigindo cargos. Com o fortalecimento do PT e do PSDB pode-se imaginar uma reforma pol�tica que simplifique a estrutura partid�ria brasileira.”
Entre os 513 deputados eleitos, 304 s�o de partidos que formalizaram a coliga��o com Dilma Rousseff: PT (70), PMDB (66), PSD (37), PP (36), PR (34), PRB (21), PDT (19), PROS (11) e PCdoB (10). O alinhamento destes parlamentares n�o � autom�tico, j� que o fato de terem se coligado formalmente n�o significa que nos estados aderiram � candidatura petista. Em Minas, isso � particularmente verdade para o PSD, o PP, o PDT e o PR. Os partidos que formalizaram coliga��o com A�cio Neves, que s�o o PSDB, o PMN, o SD, o DEM, o PEN, o PTN, o PTB, o PTC e o PTdoB, somam 161 deputados federais eleitos. H� ainda o PSB, que elegeu 34 deputados federais e formalizou apoio ao tucano no segundo turno, o que em princ�pio eleva a base a 195 parlamentares.
Na pr�tica, esses s�o os n�meros de partida para a composi��o do apoio no Congresso Nacional. Ningu�m duvida de que em nosso presidencialismo de coaliz�o, ganhe quem ganhar, poder� contar apenas que nas duas casas legislativas estar�o petistas de um lado e tucanos do outro.