S�o Paulo - Ele saiu do Brasil com um passaporte falso, uma identidade roubada e, acima de tudo, sem ser notado ao fazer um trajeto por v�rios pa�ses para chegar at� seu suposto ref�gio, na It�lia. Mas o passageiro do lugar 40 A do voo entre Mil�o e S�o Paulo retornou ao Pa�s reconhecido por praticamente todos os demais passageiros do avi�o, sob escolta policial e como s�mbolo de uma fuga espetacular que acabou fracassando.
O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil e condenado a 12 anos e sete meses de pris�o no caso do mensal�o protagonizou uma batalha jur�dica de 20 meses desde sua captura em Maranello, na casa de um sobrinho.
�s 11 horas e 30 minutos de voo entre a It�lia e o Brasil foram o desfecho de uma novela que come�ou com a certeza de que a It�lia jamais extraditaria um de seus cidad�os. Mas a coopera��o bilateral e a disposi��o de Roma em mostrar que n�o iria acolher condenados abriu um novo cap�tulo entre os dois pa�ses.
Pizzolato foi o primeiro a entrar no avi�o, na noite de ontem, sendo locado no �ltimo lugar, ao lado do banheiro. Ao seu lado, um agente da PF. Nos dois bancos da frente, mais um agente e uma m�dica. Do outro lado do corredor, mais um delegado. Ele n�o precisou fazer o check-in e nem passou pelo controle de passaportes. Sua mala foi despachada junto com a dos delegados que conduziram a opera��o.
A blindagem foi organizada para que nenhuma situa��o de crise pudesse ser gerada. No avi�o, dez assentos tiveram suas poltronas retiradas ao lado do brasileiro, criando uma esp�cie de escudo contra qualquer um que tentasse sentar perto.
A reportagem do jornal O Estado de S. Paulo e a de uma televis�o brasileira - os dois �nicos ve�culos de comunica��o dentro do avi�o - tiveram seus locais modificados por ordens da PF para justamente viajar distante de Pizzolato. A justificativa para afastar a imprensa era de que a situa��o poderia gerar riscos para a seguran�a de um voo.
Pizzolato tamb�m adotou sua pr�pria maneira de ser evitado. Ao se instalar em seu lugar, rapidamente colocou um fone de ouvido na cabe�a e tentava se esconder atr�s da poltrona. Durante a viagem, ainda girava o rosto para a janela para n�o ser fotografado.
Enquanto os demais passageiros entravam, os coment�rios eram direcionados ao condenado. "Onde ele est�? Ele entrou mesmo?", dizia uma senhora, enquanto as aeromo�as tentavam fazer as pessoas se sentarem para o avi�o decolar. Antes do embarque, alguns passageiros se mostraram irritados com a presen�a do ex-diretor do BB e ensaiavam um protesto.
Mas, dentro do avi�o, o clima foi de tranquilidade. Uma das poucas rea��es foi uma salva de aplausos aos agentes da PF que, durante o voo, ainda eram cumprimentados pelos passageiros.
Pizzolato conversou muito pouco com o agente que lhe acompanhava e n�o tomou nenhum rem�dio para ajudar a dormir. Consultava revistas que foram oferecidas e, quase seis horas depois da decolagem e, em pleno mar Atl�ntico, Pizzolato continuava acordado. Olhava pela janela com insist�ncia, acendia e apagava sua luz individual, enquanto o restante do avi�o permanecia em um sil�ncio e escuro quase total.
Pizzolato n�o usou algemas durante o voo e nem no aeroporto de Mil�o quando foi transferido da cust�dia dos italianos ao Brasil. Em seu lugar, assistiu a um filme, com cenas de luta em um ringue. Mais tarde, escolheria um outro filme, o Calv�rio. O filme conta como um padre se depara com um membro misterioso de sua par�quia. Pela sele��o proposta pela TAM, poderia ainda ter escolhido O Fugitivo, com Harrison Ford, ou mesmo Agarre-me se Puder, com Leonardo Di Caprio. Mas n�o o fez.
A cada tentativa da reportagem em se aproximar, Pizzolato olhava de forma desconfiada. Ele n�o abria a boca enquanto a imprensa se aproximava. Quem o sempre questionava era a m�dica, levada do Brasil para garantir a "integridade" do prisioneiro. Ainda em Mil�o, um exame m�dico foi realizado e se constatou que Pizzolato n�o sofria de qualquer problema de sa�de.
B�blia
Faltando duas horas para o pouso, Pizzolato acordou para o caf� da manh� e recebeu uma vez mais a aten��o m�dica. Ele teve sua press�o colhida e a profissional levada pela PF o questionou como ele se sentia.
Evitando se levantar e at� mesmo ir ao banheiro, o brasileiro passou as �ltimas horas do voo lendo uma B�blia, visivelmente repleta de marca��es. Na pris�o, ele acabou se aproximando de um padre que o visitava e, em um encontro numa igreja, chegou a dizer que Deus havia sido seu advogado.
Mais gordo que h� 20 meses, Pizzolato n�o escondia o abatimento. Mesmo assim, manteve a calma. Nai�, uma das comiss�rias de bordo, dizia estar "surpreendida" com a tranquilidade do brasileiro. "Eu tamb�m fiz o voo de Cacciola e ali foi bem diferente", contou.
Num gesto que chegou a comover a m�dica, Pizzolato fez com folhas de guardanapos uma flor e a entregou antes do pouso.
O ex-diretor do BB, ainda em um esquema especial, foi retirado do avi�o pela porta traseira. Assim, n�o cruzaria com os demais passageiros e evitaria as alas p�blicas do aeroporto. De S�o Paulo, ele ser� levado hoje em um jato da PF para Bras�lia e cumprir� pena de pris�o no complexo da Papuda.
Essa era a terceira vez que a PF se organiza para buscar o brasileiro. Pizzolato deveria ter sido extraditado no dia 7 de outubro. Mas, pressionado politicamente pela base de seu partido, o ministro da Justi�a italiano, Andrea Orlando, adiou a volta do mensaleiro ao Pa�s.
A mudan�a na programa��o ocorreu no dia 6, na mesma data que a Corte Europeia de Direitos Humanos na Fran�a negou o �ltimo recurso apresentado pela defesa de Pizzolato.
Desde fevereiro de 2014, quando foi preso, Pizzolato se encontrava na penitenci�ria Sant'Anna, de Modena, aguardando uma defini��o sobre seu caso. Neste per�odo, oito decis�es judiciais e pol�ticas foram tomadas.
Mas o suspense sobre a viagem perdurou at� o fim. Uma pe�a do jato da TAM teve um problema e teria de ser trocada. O voo apenas foi mantido por que o aeroporto contava com um servi�o da Lufthansa de fornecimento de pe�as. Com uma hora e meia de atraso, o voo decolou.
Custo
Quantos aos valores do resgate do condenado, as autoridades brasileiras admitem que ainda n�o conhecem os custos. O Minist�rio P�blico Federal indica que gastou R$ 140 mil no processo judicial na It�lia, com a contrata��o de advogados e a tradu��o dos documentos oficiais do processo.
Mas ainda falta estimar os valores gastos pela AGU e pela pr�pria Pol�cia Federal, que s� em passagens gastou mais de R$ 70 mil nas duas viagens que fez at� a It�lia e que n�o resultaram na extradi��o do brasileiro.