Bras�lia, 19 - A decis�o do Supremo Tribunal Federal que autoriza a pris�o de r�us j� em segunda inst�ncia judicial - sem aguardar o tr�nsito final da senten�a e o esgotamento de todos os recursos - acirrou um embate hist�rico entre defesa e acusa��o.
De um lado, procuradores da Rep�blica e delegados de Pol�cia Federal apontam "avan�o" no combate � criminalidade. De outro, advogados e juristas veem "retrocesso" e alertam para "danos irrepar�veis" no rastro do novo entendimento da Corte m�xima.
O juiz federal S�rgio Moro, da Opera��o Lava Jato, refor�ou sua posi��o a favor da decis�o. "Fechou uma janela da impunidade". Para ele, "n�o h� viola��o da presun��o de inoc�ncia j� que a pris�o opera somente ap�s um julgamento condenat�rio, no qual todas as provas foram avaliadas, e ainda por um Tribunal de Apela��o".
A decis�o do Supremo foi tomada no julgamento de habeas corpus anteontem para um acusado de roubo em S�o Paulo. Por sete votos a quatro, os ministros conclu�ram que a pris�o do acusado pode ser executada j� em n�vel de segundo grau.
O decano do Supremo Tribunal Federal, ministro Celso de Mello, declarou que a decis�o � uma "inflex�o conservadora". "A quest�o do erro Judici�rio lamentavelmente � sempre poss�vel. De qualquer maneira, houve uma inflex�o conservadora do Supremo na restri��o do postulado constitucional de estado de inoc�ncia", afirmou.
De acordo com o ministro, apesar de a decis�o ter sido tomada em um habeas corpus e, portanto, ser restrita ao caso analisado, o STF firmou um "novo paradigma". Celso de Mello voltou a defender que as penas n�o podem ser executadas antes do tr�nsito em julgado da senten�a. "Jamais poderemos abdicar, desconsiderar ou transgredir direitos e garantias fundamentais. E a lei de execu��o penal � clar�ssima, fiel � Constitui��o, ao dizer que n�o se executa no Pa�s, no Brasil, nenhuma pena, seja ela privativa de liberdade, seja ela restritiva de direitos, sem que tenha havido previamente o tr�nsito em julgado da condena��o penal".
J� o ministro Gilmar Mendes expressou, dessa vez, voto favor�vel. Ele disse � R�dio Estad�o que o sistema criminal brasileiro � "surreal" e que entendeu ser necess�rio mudar sua posi��o - antes ele era contr�rio ao cumprimento da pena de condenados j� em segunda inst�ncia. "O Brasil � um Pa�s um tanto surreal no que diz respeito ao sistema criminal, prende muita gente provisoriamente e depois quando se trata da condena��o definitiva n�o consegue executar."
Diverg�ncia
Fora da Corte Suprema, as opini�es tamb�m se dividem. Ordem dos Advogados do Brasil reagiu enfaticamente contra a decis�o e alertou, em nota, para os "danos irrepar�veis" no rastro da decis�o do Supremo. A entidade alega que o princ�pio constitucional n�o permite a pris�o enquanto houver direito a recurso. "A execu��o provis�ria da pena � preocupante em raz�o do postulado constitucional e da natureza da decis�o executada, uma vez que eventualmente reformada, produzir� danos irrepar�veis na vida das pessoas que forem encarceradas injustamente."
O criminalista F�bio Tofic Simantob pronunciou que "respeita a decis�o do Supremo", mas considera que ela "invade a compet�ncia do constituinte origin�rio, que estabelece como cl�usula p�trea a presun��o de inoc�ncia at� o tr�nsito em julgado". "Montesquieu (fil�sofo franc�s que viveu de 1689 a 1755) deve ter ficado aborrecido."
Para o criminalista e ex-presidente nacional da OAB Jos� Roberto Batochio, a decis�o do Supremo atenta contra "as liberdades constitucionais". "A surpreendente decis�o do STF implica ruptura da ordem constitucional. Agora, uma outra ordem constitucional foi institu�da, n�o positivada em texto que emana da soberania da Na��o, expressa em assembleia nacional constituinte, mas nascida da idiossincrasia da maioria dos membros que comp�e a Corte Suprema", comentou. O criminalista Pierpaolo Bottini disse que o Pa�s corre o risco de ver suas pris�es superlotadas.
Conson�ncia
Na outra ponta, os delegados de Pol�cia Federal consideram que a decis�o representa "um importante passo para o fim da impunidade em nosso Pa�s". "Recursos protelat�rios para o STJ (Superior Tribunal de Justi�a) ou STF n�o ter�o mais o efeito de impedir a aplica��o da lei", afirmou o delegado Carlos Eduardo Miguel Sobral, presidente da Associa��o Nacional dos Delegados da PF.
O presidente da Associa��o dos Ju�zes Federais (Ajufe), Ant�nio C�sar Bochenek, disse que a decis�o "marca um avan�o no processo penal brasileiro". Os procuradores da Rep�blica comemoram. "Garantir� maior efici�ncia e celeridade � presta��o jurisdicional", destacou Jos� Robalinho Cavalcanti, presidente da Associa��o Nacional dos Procuradores da Rep�blica.