
A presidente Dilma Rousseff j� n�o governa — apenas promove atos de repercuss�o para agitar a bandeira do golpe contra ela — e toda a expectativa de poder deslocou-se do Pal�cio do Planalto para o Pal�cio do Jaburu, onde o vice-presidente Michel Temer articula com seus aliados a montagem de seu minist�rio. Qual ser� o car�ter do governo Temer, cuja instala��o pode ocorrer na segunda semana de maio? Essa � a grande interroga��o pol�tica do momento, uma vez que a aprova��o do afastamento de Dilma Rousseff pelo Senado j� s�o favas contadas at� para ela pr�pria.
Talvez as circunst�ncias obriguem o pa�s viver a experi�ncia de um governo liberal, como aquele que o presidente Tancredo Neves chegou a anunciar, mas foi abortado por sua morte antes de tomar posse. Nenhum governo ap�s o regime militar teve esse car�ter, nem mesmo o de Fernando Collor de Mello, que havia anunciado um programa liberal, cuja execu��o acabou limitada � abertura da economia para o com�rcio exterior devido ao impeachment.
Mesmo com as privatiza��es, o governo de Fernando Henrique Cardoso, cuja pol�tica econ�mica foi resultado de uma disputa entre social liberais e desenvolvimentistas, n�o teve essas caracter�sticas, embora sofra com a pecha de neoliberal. Sua principal tarefa foi estabilizar a economia e restabelecer a ordem fiscal. Antes dele, Itamar Franco, com seu mandato tamp�o, bem que ensaiou uma estrat�gia desenvolvimentista, mas rendeu-se � realidade e bancou o Plano Real, fechando com chave de ouro sua curta passagem pelo poder.
Nesse balan�o das experi�ncias de governo, h� que se registrar que o governo Sarney cumpriu a miss�o de operar a transi��o � democracia e registrou avan�os em todos os indicadores sociais, al�m de nos legar a atual Constitui��o, mas foi uma sucess�o de fracassos econ�micos, que resultaram na hiperinfla��o. O ex-presidente Luiz In�cio Lula da Silva, no primeiro mandato, surfou as ondas do crescimento chin�s e do chamado b�nus demogr�fico (a redu��o da popula��o inativa em rela��o � economicamente ativa), o que possibilitou a expans�o da economia e eleva��o da renda das fam�lias, mas seu modelo de capitalismo de Estado descambou para o populismo.
O balan�o do governo Dilma Rousseff dispensa apresenta��es: recess�o, infla��o e desemprego, com um rombo nas contas p�blicas cujo verdadeiro tamanho ningu�m sabe — talvez chegue a R$ 3 trilh�es. O Pal�cio do Planalto ainda tenta responsabilizar a oposi��o no Congresso por essa situa��o, j� que o argumento da crise mundial j� n�o cola mais. Michel Temer assumir� o poder num cen�rio de terra arrasada, cujas consequ�ncias sociais ser�o agravadas e atribu�das ao novo governo por seus verdadeiros respons�veis, Lula, Dilma e o PT.
Blindagem
Voltamos ao tema de in�cio. Diante desse cen�rio, a principal tarefa do governo Temer talvez seja apartar a gest�o do Estado e da economia dos neg�cios privados (desonera��es fiscais seletivas, empr�stimos camaradas para os campe�es nacionais), da� o seu car�ter liberal. Essa tarefa decorre tamb�m da crise �tica, cuja principal vari�vel n�o estar� sob seu controle: a Opera��o Lava-Jato. � preciso desmontar os mecanismos perversos que possibilitaram a fus�o das pol�ticas p�blicas com os grandes neg�cios privados, numa ciranda de acumula��o de capital, desvios de recursos p�blicos, corrup��o de servidores e executivos de estatais, enriquecimento il�cito de empres�rios e lobistas, financiamentos de campanha e forma��o de patrim�nio de pol�ticos.
H� temores quanto �s pol�ticas nas �reas sociais, supostamente amea�adas com a mudan�a de governo. Ora, as pol�ticas universalistas foram sequestradas por grandes interesses privados, para onde quer que se olhe: sa�de, educa��o, seguran�a, transportes, habita��o. Tamb�m nessa �rea � preciso apartar esses interesses dos centros de decis�o. De igual maneira, as pol�ticas de transfer�ncia de renda, que nada mais s�o do que a concentra��o dos gastos sociais nas parcelas mais pobres da popula��o, uma pr�tica social liberal, precisar�o ser revistas. H� que se ter uma porta de sa�da para seus benefici�rios, para que as prioridades sejam as pol�ticas universalistas.
A discuss�o de nomes para o futuro governo, � qual o vice Michel Temer tem se dedicado, visa garantir sustenta��o no Congresso, compet�ncia t�cnica e credibilidade perante a sociedade para a nova equipe de governo. O primeiro quesito sup�e acordos partid�rios; o segundo, a sele��o de nomes qualificados para cada posi��o; e o terceiro, com toda certeza, um atestado de idoneidade da Opera��o Lava-Jato. Ningu�m escapar� desses tr�s crit�rios, a come�ar pela �rea do governo que precisa de blindagem �tica e pol�tica para dar certo: a economia.
