
Um dos ministros mais experientes do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes acredita que a Corte j� tomou todas as decis�es poss�veis com rela��o � perman�ncia do presidente afastado da C�mara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), no cargo.
Ap�s o Supremo determinar, na quinta-feira, o afastamento cautelar do deputado, Mendes espera que o pr�prio Congresso resolva quais ser�o os pr�ximos passos com rela��o ao futuro do parlamentar. “Tenho a impress�o de que esse � um assunto que o Judici�rio n�o deve se meter”, afirmou. Nesse contexto, ele defendeu a autonomia dos Poderes e afirmou que o STF n�o pode funcionar como “tutor-geral” da na��o.
Em entrevista ao programa CB.Poder, da TV Bras�lia, Mendes, que assume a presid�ncia do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na pr�xima quinta-feira, falou ainda sobre o julgamento da chapa da presidente Dilma Rousseff e do vice, Michel Temer, alvo de investiga��o por supostas irregularidades eleitorais. Confira os principais trechos da entrevista:
Eduardo Cunha foi afastado do cargo pelo STF. Como fica a situa��o dele agora?
Eu tamb�m n�o sei e espero n�o saber. A mim, parece que essa � uma tarefa da pol�tica e dos pol�ticos, encontrar uma solu��o. Acredito que o Supremo j� foi ao limite. E agora isso de esperar que o Supremo diga: “Declaro a vac�ncia do cargo”, isso tudo tem implica��es. A partir da�, n�o estamos estimulando uma linha de independ�ncia de Poderes. Estaremos assumindo um papel de tutoria geral da na��o. O que n�o � bom. O STF tem que tomar cuidado para n�o assumir um protagonismo excessivo. Essas interven��es cir�rgicas devem ser bastante cuidadosas. A gente pode ter ju�zos divergentes sobre tudo na pol�tica, mas a gente n�o pode negar a compet�ncia dos pol�ticos brasileiros.
O senhor n�o est� sendo otimista demais? Nos �ltimos anos, o Congresso piorou muito...
Paci�ncia. � o que se tem. Talvez eles tenham perdido o protagonismo por raz�es que eu n�o vou especificar. Mas, certamente, h� 40 ou 50 parlamentares extremamente representativos na C�mara.
Houve tentativa de dizer que, a partir do afastamento de Cunha, as decis�es dele, incluindo a abertura do impeachment, deveriam ser invalidadas. Existe chance de o impeachment ser anulado?
Entendo que n�o. Imagina o que isso significaria em termos de emenda constitucional, de leis que foram votadas e mais, do or�amento, tudo isso estaria contaminado? N�o faz nenhum sentido. Eu tenho a impress�o de que tem um pouco de limite para essa judicializa��o, n�s temos que ter um pouco de responsabilidade institucional para com o pa�s. A interven��o do Judici�rio — acho que o Supremo percebe isso —, em geral, n�o resolve a quest�o. Quando quiseram a opini�o do Supremo sobre a ordem da vota��o do impeachment na C�mara, eu disse: quando o problema � falta de votos, o Supremo n�o � a casa adequada para isso.
Quando o ministro Teori Zavascki apresentou o voto pelo afastamento de Cunha, disse que era uma situa��o excepcional. E no caso de o presidente do Senado, Renan Calheiros, virar r�u, � um precedente?
� uma quest�o que vai ser colocada, pelo menos no que diz respeito � substitui��o do presidente (em caso de viagem). Mas ele ainda n�o � r�u.
O senhor vai assumir o TSE e tem um processo que pede a cassa��o da chapa Dilma-Temer. A ministra-relatora est� saindo da Corte. � poss�vel julgar o processo ainda este ano?
Acho que temos que chegar a junho para saber em que est�gio n�s estamos. Quanto das provas pedidas j� foram realizadas? A�, a gente consegue fazer um progn�stico seguro se conseguir�amos julgar no segundo semestre.
Mas tem um complicador. Se n�o houver o julgamento at� o fim do ano, a decis�o (em caso da cassa��o da chapa) passa a ser indireta, o que remete �s decis�es da ditadura.
A gente vai ter que caminhar, discutir isso. Al�m do que o resultado inevit�vel n�o tem que ser a cassa��o. Temos que fazer uma an�lise. Primeiro precisa julgar, para depois condenar, como diz a m�sica popular.
O vice-presidente entrou com a��o tentando desvincular a chapa de Dilma. H� alguma possibilidade?
At� aqui, n�o tivemos nenhum ju�zo com respeito � possibilidade de cis�o. Entende-se que, como a vota��o � conjunta, n�o concorrem em chapa separada, embora o TSE entenda que a responsabilidade que leva � inelegibilidade � do titular da chapa, n�o do vice.
Isso seria favor�vel a ele?
J� � uma abordagem. E temos o precedente do ex-governador de Roraima Ottomar Pinto, que a a��o eleitoral era contra ele, mas ele veio a falecer no curso do mandato e da impugna��o. O vice n�o foi impugnado e h� anota��es no TSE que dizem que a responsabilidade do vice � atenuada, que a responsabilidade pelos malfeitos era do titular. Claro que o tribunal tem uma vis�o pol�tica e sabe da instabilidade institucional que o afastamento gera. Tudo isso o TSE tem que levar em conta em um momento oportuno.
Dilma est� sendo afastada pelas pedaladas e decretos or�ament�rios n�o autorizados. H� decretos semelhantes assinados por Temer. Como fica a situa��o dele?
� um debate a ser feito no �mbito do Congresso. O que a gente sabe — e que � �bvio — � que vice n�o governa, a n�o ser em situa��es excepcionais. No m�ximo, ele traz um assessor que carrega pastas. Nem o gar�om da Presid�ncia muda. N�o � ele que toma diretrizes. Estou falando em termos institucionais, pr�ticos. Vamos pegar uma coisa fora do contexto. Imagine que temos uma vaga do STJ para ser provida enquanto o presidente viaja. Nenhuma d�vida de que se o vice assinar o ato � por determina��o do presidente, por orienta��o dele. Ele n�o vai dizer que gosta mais de C ou de D e aproveitar a Presid�ncia dele. Isso � inimagin�vel. Nas rela��es, por mais harm�nicas ou desarm�nicas que sejam, ele n�o vai deixar de editar um decreto ou uma medida porque as diretrizes j� est�o estabelecidas. E nem � de se imaginar que o vice traga um staff para fazer exame de atos. Esse debate precisa ser contextualizado.
Caso Temer assuma interinamente, o pa�s tem expectativa que algo vai mudar. Temer tem condi��es de conduzir a na��o?
N�o � tarefa s� dele. � preciso que haja uma soma de esfor�os por parte do estamento pol�tico, todos que t�m responsabilidade institucional nesse sentido. � preciso que se indique uma sa�da, que se lidere nesse sentido. Conhe�o bem Temer, temos conviv�ncia de longos anos. A gente percebe que ele � um homem extremamente cort�s, mas, ao mesmo tempo, tem posi��es muito firmes e tem condi��es de liderar. Tamb�m � um homem de di�logo. Temos um deficit dessa habilidade que marcou a pol�tica e os pol�ticos brasileiros. Ele ser� certamente bafejado pelo vento positivo do novo. Tenho um pouco essa expectativa, mas a realidade � desafiadora: 11 milh�es de desempregados, falta de recursos, queda de receita. N�o ser� um processo f�cil.
O procurador-geral da Rep�blica, Rodrigo Janot, afirmou, em parecer ao STF, que o ato de nomea��o do ex-presidente Lula para a Casa Civil era para driblar a for�a-tarefa da Lava-Jato. Ao dizer isso, ele n�o est� afirmando que a presidente cometeu ato de improbidade?
H� pelo menos elementos indici�rios de que n�o seria uma pr�tica de todo ortodoxa. Houve muita discuss�o sobre a divulga��o do di�logo (entre Lula e Dilma). Mas o di�logo � bastante constrangedor.
Na parte que fala do encaminhamento do comprovante de que Lula era ministro?
Isso. Ali sugere pr�ticas extremamente negativas, talvez at� um crime de falsidade. Em suma, isso precisa ser elucidado. Tudo indica que se deu ali um tipo de habeas corpus administrativo. Se a pol�cia bater a sua porta, apresente esse salvo-conduto, que voc� j� � ministro de Estado. Acho que as pessoas com mediana intelig�ncia leram assim aquele contexto.
Muita gente avalia que seria bom se a presidente renunciasse no momento atual. Qual a sua avalia��o?
Eu n�o posso dar conselho para a presidente, obviamente. Mas o fato � que os ocupantes de cargos n�o o fazem por direito subjetivo ou interesse pr�prio. � preciso que se tenha essa dimens�o. N�o � nenhuma censura renunciar a um cargo. Pelo contr�rio, isso at� pode ser revelador de uma dignidade pessoal elevada e de uma dignidade institucional, perceber que n�o consegue exercer uma atividade, muitas vezes por deficit no relacionamento, por incompreens�es m�tuas, por causas das mais diversas. N�o me parece que se possa pensar em direito subjetivo ao cargo quando n�o se tem condi��es m�nimas de governabilidade e governan�a. Parece que estamos diante desse quadro.
