S�o Paulo, 09 - A ex-chefe de um gerente de comunica��o da Petrobras ligado ao PT da Bahia afirmou em depoimento � Pol�cia Federal que sustou pagamentos de diversos servi�os fechados por ele porque n�o conseguiu identificar a realiza��o efetiva dos contratos. Geovane de Morais, ex-gerente de Comunica��o da Diretoria de Abastecimento da estatal, � figura central da apura��o da Opera��o Lava Jato que investiga suposto pagamento de pelo menos R$ 6 milh�es para a ag�ncia de publicidade Muranno Brasil Marketing, com dinheiro de propina. Parte desse valor foi repassado via doleiro Alberto Youssef.
Os pagamentos, segundo apura a Lava Jato, teriam sido feitos por ordem direta do ex-presidente da Petrobras Jos� S�rgio Gabrielli, seu ex-chefe de gabinete Armando Tripodi, com suposto conhecimento do ex-presidente Luiz In�cio Lula da Silva.
"Inquirida se tem conhecimento que Geovane de Morais recebia press�o interna para aprovar e pagar v�rios servi�os na Ger�ncia de Comunica��o, mormente no ano de 2008, respondeu que desconfiava que sim, por este motivo sustou o pagamento de diversos servi�os que n�o conseguiu identificar sua realiza��o efetiva, ou que tivessem valores elevados sem devida justifica��o", registra termo de depoimento de Carmem Silvia de Noronha Swire.
Funcion�ria aposentada da Petrobras, ela foi ouvida em 13 de outubro em inqu�rito da Lava Jato, de Curitiba, que tem os pagamentos a Muranno Brasil como alvo. Carmem era chefe imediata de Geovane de Morais. Ela foi gerente de contratos da �rea de Abastecimento da estatal de outubro de 2004 a novembro de 2005 e gerente-geral de Gest�o Corporativa da �rea de Abastecimento de novembro de 2005 setembro de 2008 - quando se aposentou. Sua chefe imediata era Venina Velosa da Fonseca.
"Ao assumir a Ger�ncia Geral de Gest�o Corporativa, Giovane de Morais j� estava na Ger�ncia de Comunica��o desde 2004, que segundo o pr�prio, seria vinculada ao Partido dos Trabalhadores da Bahia", afirmou a testemunha.
"Se recorda, entretanto, que no ano de 2008 devolveu para a Ger�ncia de Comunica��o v�rios processos de pagamento para melhor instru��o, visto que, n�o conseguiu identificar as contrapartidas E maior parte desses processos n�o retornou declarante para libera��o de pagamento."
A ex-gerente aposentada afirmou que ficou sabendo, depois de sair da estatal, que Geovane de Morais "teria se aproveitado de uma falha no SAP (Sistema de Libera��o de Pagamento) que permitiria qualquer gerente com devida senha liberar qualquer valor, dessa forma, podendo inclusive ultrapassar limite de compet�ncia que ele estaria adstrito". Ela disse isso ao ser questionada se tinha conhecimento se ele pagava por servi�os "sem comprova��o que os servi�os foram realizados e sem que os limites estabelecidos para o cargo fossem obedecidos".
Investiga��o
Os pagamentos a Muranno s�o investigados em inqu�rito aberto pela Pol�cia Federal em 2014, no in�cio da Lava Jato, ap�s ela aparecer nos desembolsos feitos por Youssef com recursos desviados da Petrobras via contratos da Camargo Corr�a - construtora acusada de cartel. Foram feitos pagamentos que totalizaram R$ 1,7 milh�o entre dezembro de 2010 e janeiro de 2011 para a ag�ncia.
Na vers�o do doleiro que � pe�a central na Lava Jato, houve uma suposta chantagem do dono da Muranno, Ricardo Villani, que queria receber valores n�o oficiais atrasados, em 2010 - �ltimo ano do governo Lula. Morais era o gerente da �rea que contratou a ag�ncia, supostamente por servi�os de marketing em eventos sem contrata��o formal.
Na dela��o de Youssef, ele afirmou que Lula soube da amea�a, na �poca, e teria determinado a Gabrielli que usasse o dinheiro "das empreiteiras" para resolver a pend�ncia. O ex-presidente da Petrobras teria procurado o ex-diretor de Abastecimento da estatal Paulo Roberto Costa, que mandou o doleiro - esp�cie de contador e financeiro das propinas na Diretoria de Abastecimento - fazer o pagamento.
O ex-diretor de Abastecimento confirmou em depoimento � PF que partiu do ex-presidente da Petrobras a ordem para o pagamento da Muranno. "Em determinada oportunidade, o ent�o presidente da empresa S�rgio Gabrielli mencionou ao declarante a exist�ncia de uma 'pend�ncia' da Petrobras junto a empresa (Muranno) e solicitou ao declarante que fosse resolvida", afirmou Paulo Roberto Costa, no dia 14 de julho de 2015.
O ex-diretor Paulo Roberto Costa declarou que n�o sabia dizer por "qual motivo Gabrielli tenha intercedido pela empresa Muranno". Youssef contou em um de seus termos de dela��o hist�ria parecida e detalhou como providenciou o pagamento. "Houve a suspens�o de contratos pela Petrobras, prejudicando recebimentos da parte acordada com as empresas, que deveriam ser quitados independentemente de suspens�o", afirmou o doleiro.
Youssef diz em sua dela��o ter sido "chamado por Paulo Roberto Costa, o qual pediu que a quest�o fosse resolvida, pois teria recebido um pedido de S�rgio Gabrielli, presidente da estatal, para que isso fosse solucionado".
Na vers�o do doleiro, Costa recomendou que os valores para a Muranno fossem rateados entre PT, PMDB e PP. "Deveria providenciar a quita��o dos cr�ditos da empresas, para tanto buscando a contribui��o junto a colaboradores do PT, PMDB e PP", afirmou Youssef.
Os pagamentos teriam come�ado no final de 2010, ano da primeira elei��o da presidente Dilma Rousseff. "Destinou no total aproximadamente R$ 6 milh�es �s duas empresas de publicidade", explicou Youssef. "Pagou parte em dinheiro e parte em TEDs, feitas pela MO Consultoria ou Empreiteira Rigidez, e tamb�m pagou parte com dep�sitos da Sanko Sider." As duas primeiras eram firmas de fachada de sua lavanderia e a Sanko atuava em parceria com seus esquemas de lavagem na Petrobras.
O doleiro disse ter ficado "receoso" com o pedido de Costa "pois para pagar a d�vida toda, teria que retirar da parte que era destinada ao PP. "A sugest�o de Paulo (Roberto Costa) foi que ent�o o PP cobrisse uma parte, o PMDB cobrisse outra e que o pr�prio PT tamb�m contribu�sse para quitar os valores que estavam sendo cobrado pelas empresas."
Costa afirmou que iria conversar com o operador de propinas do PMDB Fernando Antonio Falc�o Soares, o Fernando Baiano "para poder conseguir pagamento da parte que caberia ao PMDB".
O doleiro revelou que cuidou dos pagamentos. "Soube que o PMDB acabou n�o contribuindo com nada", disse Youssef. "Quanto � parte de deveria ser paga pelo PT, o depoente foi procurado por J�lio Camargo que informou que cuidaria da parte que o PT deveria arcar e ent�o repassou valores ao depoente mediante pagamentos de ordens no exterior em contas indicadas pelo depoente", registrou a PF.
Youssef informou que Julio Camargo - lobista ligado ao ex-ministro Jos� Dirceu - tamb�m teria citado o nome do ent�o chefe de gabinete de Gabrielli, Armando Tripodi.
Os contratos da Muranno integram um pacote de pagamentos considerados irregulares pela pr�pria companhia, que resultaram na demiss�o de um apadrinhado de Gabrielli.
"Diante de rumores na imprensa que agremia��es pol�ticas poderiam utilizar Petrobras para viabilizar recursos na campanha eleitoral de 2008, tamb�m, em face de n�o ter as respostas solicitadas, resolveu solicitar seu desligamento da empresa, que ocorreu efetivamente em 1 de setembro de 2008", afirmou Carmem, a ex-chefe aposentada.
O dono da ag�ncia de propaganda apontou em depoimento � Pol�cia Federal, em 2015, que foi Morais que pagou por servi�os que chegaram a R$ 7 milh�es, sem contrata��o, para a divulga��o da estatal em provas de F�rmula Indy, entre 2006 e 2009, nos Estados Unidos. Os pagamentos teria envolvido ainda o lobista e delator Julio Gerin Camargo, ligado ao ex-ministro Jos� Dirceu (Casa Civil, governo Lula).
No depoimento do dia 9 de setembro, Villani afirmou � PF que depois de se reunir pessoalmente com Paulo Roberto Costa foi procurado por Youssef, que se identificou como "Primo" e providenciou os pagamentos de parte da d�vida. O dono da Muranno afirmou ter recebido s� uma parte do montante e que n�o procurou a Justi�a para cobrar a Petrobras porque nunca fez um contrato formal.
Villani entregou para a Lava Jato o material produzido pela ag�ncia nos eventos de F�rmula Indy, bem como as trocas de e-mails, entre 2006 e 2009, que comprovariam a contrata��o e suas rela��es internas na estatal, em especial com o ex-gerente de Marketing.
Demiss�o
O ex-gerente de Marketing � da Bahia e ligado ao grupo pol�tico petista do ex-presidente da Petrobras. Gabrielli nega e diz que o ex-funcion�rio foi punido com a demiss�o, assim que se comprovou internamente sua responsabilidade e irregularidades em contratos da �rea, no ano de 2008.
Geovane de Moraes foi ouvido pela Pol�cia Federal e afirmou que foi demitido em 2009, pela ex-gerente da Petrobras Venina Velosa - subordinada a Paulo Roberto Costa - mas foi mantido no cargo at� 2013 por interfer�ncia de Gabrielli.
Anota��es analisadas da agenda de Paulo Roberto Costa vinculam o nome de "Ricardo Villani" a "In�cio". Investigadores da Lava Jato apuram qual assunto seria tratado pelo ex-diretor com o dono da Muranno, em 2012.
Lula n�o � alvo desse inqu�rito, mas as apura��es podem chegar ao suposto envolvimento dele nesse epis�dio. O caso Muranno n�o � o primeiro envolvendo suposto pagamento de propinas para evitar divulga��o de esc�ndalos de corrup��o no governo. O ex-presidente sempre negou ter cometido qualquer tipo de irregularidade.
Press�o
Em depoimento prestado em janeiro de 2015, o ex-gerente jur�dico da Diretoria de Abastecimento Fernando de Castro S� afirmou que soube de seu superior - o ent�o gerente executivo do Jur�dico Nilton Maia - que em 2009, Gabrielli e o ex-diretor de Servi�os Renato Duque, ligado ao PT, ligaram "muito irritados por causa desse parecer (que demitia Geovane de Moraes).
"Ficou estabelecido que a �rea do (Jur�dico) compartilhado ia questionar a demiss�o e o Jur�dico ia dar um parecer revisando os pareceres anteriores". Dois pareceres citados por ele foram emitidos pelo pr�prio Jur�dico da estatal comunicando que Geovane de Moraes, supostamente flagrado cometendo desvios, poderia ser demitido, mesmo durante per�odo de licen�a m�dica.
Ap�s a liga��o de Duque e Gabrielli, o setor de compartilhado questionou esse parecer. "Geovane fica no aux�lio doen�a durante quatro anos, tempo que a Petros (fundo de pens�o dos trabalhadores da Petrobras) complementa o sal�rio. A� � demitido. Foi demitido quatro anos depois da sindic�ncia comandada pela Venina. Exatamente o prazo que a Petros cobre", relatou Castro S�.
A efetiva demiss�o do Geovane foi concretizada apenas quatro anos depois por Francisco Paes, substituto de Venina na ger�ncia executiva de Abastecimento. "Quando (Paes) tentou demitir o Geovane, foi informado pelo compartilhado da exist�ncia desse parecer."
S� afirma que Venina foi amea�ada por causa das den�ncias. "Venina sofreu amea�a nesse per�odo. Amea�a com arma. Havia uma press�o muito forte interna de liga��es. Na primeira conversa dela com o Paulo (Paulo Roberto Costa, ent�o diretor de Abastecimento da estatal), ele disse que ela teria de colocar isso debaixo do tapete. Ela disse que n�o faria isso."
Segundo ele, o levantamento feito por Venina revelou um problema de "descumprimento or�ament�rio da �rea de Comunica��o num valor astron�mico". "Constatou-se que havia uma discrep�ncia muito grande entre o or�amento para Comunica��o e os gastos efetivados. Havia solicita��o de pagamento, mas n�o tinha contrato."
Depois dessa reuni�o com Venina, em 2007, ficou decidido que ela iria levar esses fatos ao conhecimento do diretor Paulo Roberto Costa para ver qual procedimento deveria ser adotado. Castro S� disse que a ex-gerente executiva foi orientada a levar a quest�o a Gabrielli.
A l�gica, segundo o ex-gerente jur�dico, era que fosse criada uma sindic�ncia na Diretoria de Abastecimento, onde trabalhava Geovane de Moraes. No entanto, foi "formada uma comiss�o de sindic�ncia na presid�ncia".
Questionado pelos procuradores quem seria o presidente dessa comiss�o, Castro S� apontou o nome de "Rosemberg Pinto". "Ele seria um sindicalista da Bahia, que trabalhava como assessor do Gabrielli."
A comiss�o de apura��o da presid�ncia concluiu que deveria ser instalada uma outra sindic�ncia na Diretoria de Abastecimento. Castro S� afirma que Venina constituiu a sindic�ncia e que, com base em dois documentos internos, determinou a demiss�o de Moraes.
Os documentos confirmavam que o ex-gerente de Comunica��o poderia ser demitido por justa causa mesmo afastado por doen�a.
(Ricardo Brandt, Julia Affonso, Fausto Macedo e Luiz Vassallo)