Nos �ltimos 24 anos, homens e mulheres nunca votaram de forma t�o diferente. Nem quando o Brasil elegeu uma mulher para a Presid�ncia da Rep�blica, ou quando duas delas lideravam a corrida presidencial, a disparidade de g�nero no voto foi t�o acentuada quanto em 2018.
O Estado analisou pesquisas eleitorais das duas �ltimas semanas de campanha em todas as elei��es presidenciais desde 1994. O que ocorre em rela��o a Jair Bolsonaro (PSL) atualmente � de fato um ponto fora da curva. Segundo a �ltima pesquisa Ibope, o deputado e militar da reserva tinha 36% das inten��es de voto entre os homens e 18% entre as mulheres. Ou seja, o dobro de apoio no eleitorado masculino. Em cada tr�s de seus eleitores, apenas uma � mulher (66% contra 33%).
Nos 24 anos anteriores, as maiores discrep�ncias na vota��o por g�nero haviam ocorrido em 1994 e 2002, quando a composi��o do eleitorado de Luiz In�cio Lula da Silva chegou a ser 55% masculina e 45% feminina. Na reta final da campanha de 2014, quando Dilma Rousseff (PT) e Marina Silva (ent�o no PSB) chegaram a ficar brevemente em primeiro e segundo lugar, ambas tinham a mesma composi��o em seus eleitorados: 53% de mulheres e 47% de homens.
Para a cientista pol�tica da Universidade de Bras�lia (UnB) Fl�via Biroli, n�o s�o apenas as frases consideradas machistas que afastam as mulheres de Bolsonaro. O presidenci�vel j� afirmou que "fraquejou" quando teve uma filha, depois de quatro homens, e que a deputada federal Maria do Ros�rio (PT-RS) n�o merecia ser estuprada "por ser muito feia".
A cientista pol�tica diz que h� aspectos na candidatura de Bolsonaro que s�o interpretados de maneiras diferentes por mulheres e homens por causa da posi��o diferente que cada g�nero tem na sociedade. "As mulheres no Brasil s�o mais escolarizadas, mas menos valorizadas, com mais dificuldade de encontrar emprego. Quando ele fala que o Estado n�o tem nada a ver com isso, que � quest�o de m�rito, isso atinge muito elas."
Fl�via tamb�m v� um contraste entre o momento de maior protagonismo assumido pelas mulheres nos �ltimos anos, no Brasil e no mundo, e as ideias do candidato. O movimento MeToo, por exemplo, que surgiu nos Estados Unidos, levou a uma onda de den�ncias de abuso sexual. "A maneira do Bolsonaro de falar as ignora como sujeito pol�tico e o papel que elas t�m assumido na sociedade."
Para a pesquisadora, at� o antipetismo pode ser menos forte para elas. "S�o as mulheres as mais afetadas pelas pol�ticas sociais, s�o elas que cuidam das crian�as, dos idosos, ficam sem emprego primeiro."
O fiscal de tr�nsito Paulo (nome fict�cio), de 34 anos, n�o votou nas duas �ltimas elei��es, mas nesta faz quest�o. "Hoje, para enfrentar a esquerda no Pa�s, s� o Bolsonaro, se n�o vamos virar a Venezuela." As p�ginas dele nas redes sociais s�o alimentadas s� com informa��es positivas do candidato. "Se pudesse, minha mulher me exclu�a do Facebook dela", brinca.
A mulher em quest�o � psic�loga e n�o vota no mesmo candidato. "O que ele falou para a deputada sobre estupro n�o se fala para ningu�m. � uma quest�o de valores, discordo totalmente", diz Ana (nome fict�cio), de 33 anos, que diz se preocupar com o marido, que parece obcecado pela vit�ria de Bolsonaro. "Mas ao mesmo tempo ele n�o � machista", afirma. O casal pediu para n�o ter o nome verdadeiro publicado.
A administradora Roberta, de 30 anos, que tamb�m preferiu usar um nome fict�cio, acha que Bolsonaro � machista e quer que todas as mulheres sejam donas de casa. "A gente j� luta tanto para tentar uma igualdade no mercado e ele fala essas coisas." Seu marido, no entanto, vai votar no candidato do PSL e passa o dia mandando v�deos e reportagens para tentar convenc�-la. Roberta vai votar em Jo�o Amo�do (Novo). "A gente sempre pegava uma colinha um do outro antes de votar, mas dessa vez eu n�o vou pegar a colinha dele, n�o."
O marido Fabio (nome fict�cio), de 30 anos, admite que o presidenci�vel � "um ogro, xinga, � agressivo", mas o considera "o menos ruim". Sobre a frase dita � deputada Maria do Ros�rio, pondera: "Quem nunca errou e falou coisas no calor da emo��o?" Roberta n�o concorda. "No segundo turno, voto em qualquer um, menos nele."
Diferen�a
Para a cientista pol�tica e pesquisadora do Grupo de Estudos de G�nero e Pol�tica da Universidade de S�o Paulo (USP) Beatriz Rodrigues Sanchez, uma das quest�es centrais para a diferen�a de g�nero no voto � a seguran�a. "A viol�ncia faz parte da vida deles desde a inf�ncia, eles brincam com armas." J� para mulheres, especialmente negras e pobres, afirma, essa pol�tica tem outro significado. "Essa hist�ria de colocar ordem no Brasil as assusta porque a viol�ncia policial tem matado os filhos delas na periferia."
A rejei��o ao candidato do PSL levou � cria��o de um grupo no Facebook, o Mulheres Unidas Contra Bolsonaro, que tem hoje 3,8 milh�es de integrantes. Como mostrou o Estado ontem, quem iniciou a p�gina foi a funcion�ria p�blica baiana Ludimilla Teixeira, que se considera anarquista e nem sequer sabe se vai votar nessas elei��es.
Foi no grupo que acabou sendo criada a #Elen�o, usada at� por personalidades mundiais como Madonna e Cher. Nele, h� relatos de mulheres que reclamam de maridos que v�o votar no candidato do PSL - homens n�o s�o aceitos no grupo. O crescente n�mero de integrantes fez os outros candidatos passarem a usar a hashtag em suas campanhas. A p�gina foi hackeada este m�s e o nome, trocado para Mulheres com Bolsonaro. O Facebook restabeleceu a p�gina, mas a criadora tem sido amea�ada.
Diverg�ncia no casamento
Essas s�o as primeiras elei��es em que Jos� Luiz e Nilza Costa, depois de 40 anos de casamento, v�o votar em candidatos diferentes. "Quero renovar, mexer nessa coisa suja, tem que ser algu�m forte", diz ele, que vota em Jair Bolsonaro (PSL). "Ele � grosso e hostil com as mulheres", rebate ela, que aposta em Jo�o Amoedo (Novo).
Apesar da diverg�ncia pol�tica, eles dizem que na casa da Vila Guarani, na zona sul de S�o Paulo, n�o tem briga. "S� faltava ele me obrigar a votar em quem ele quer", afirma Nilza, de 61 anos, analista de sistema.
Filho de militar, o t�cnico de som de 68 anos diz que lembra bem do per�odo da ditadura. Para ele, "o povo era mais unido", "se podia sair na rua e ningu�m mexia com a mulher dos outros". J� Nilza n�o gosta "como Bolsonaro se apresenta" e acha que ele "n�o vai conseguir mudar as coisas porque � fraco".
Jos� Luiz - que j� foi eleitor de Geraldo Alckmin (PSDB) - afirma que n�o d� bola para as coisas que falam do seu candidato. Para ele, mesmo que n�o der certo um eventual governo de Bolsonaro, a solu��o � mais f�cil do que seria com qualquer outro presidenci�vel eleito. "Se Alckmin, (Fernando) Haddad ou Ciro (Gomes) fizerem algo ruim, ningu�m tira eles porque t�m um grupo pol�tico. Mas se o Bolsonaro, daqui tr�s meses, aprontar, a gente tira ele rapidinho."
A mulher insiste que prefere um candidato "mais inteligente". "Ele (Amo�do) � administrador e j� tem uma fortuna, por isso n�o vai roubar." As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.
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POL�TICA
Divis�o de g�nero nunca foi t�o acentuada
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