Na Universidade Federal de Pernambuco, um cartaz com acusa��es e foto de um professor considerado "fascista" foi estampado nas paredes do c�mpus. Em outra institui��o p�blica no Norte do Pa�s, ao entregar as provas, a professora ouviu de um aluno que ele lhe daria um tiro se Jair Bolsonaro j� fosse o presidente. Numa aula de hist�ria, no Sudeste, um docente teve medo que o estudante o tivesse filmando quando pediu para carregar o celular em uma tomada na frente na classe.
Essas s�o algumas das hist�rias que o jornal O Estado de S. Paulo ouviu na �ltima semana. Universidades p�blicas e privadas do Pa�s vivem um clima de denuncismo e medo. A reportagem conversou com dezenas de alunos e professores de institui��es de v�rios Estados e constatou o receio da perda da liberdade nos ambientes acad�micos.
Interfer�ncias autorizadas por ju�zes em universidades na semana anterior � do segundo turno das elei��es tornou maior a tens�o. Trata-se do reflexo a um dos momentos pol�ticos mais polarizados da hist�ria do Pa�s. Outro motivo de apreens�o para docentes e estudantes � a imin�ncia da aprova��o do projeto conhecido como Escola sem Partido, defendido pelo presidente eleito.
"A afronta � autonomia universit�ria e � liberdade de c�tedra n�o acontece s� pela interven��o do Estado ou poder pol�tico, como na ditadura militar", diz o diretor da Faculdade de Direito da Universidade de S�o Paulo, Floriano de Azevedo Marques Neto. "Isso pode acontecer por meio de grupos que queiram impedir aulas, por exemplo, seja de direita ou esquerda".
Na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) uma lista com cerca de 15 nomes circulou na semana passada, intitulada "Doutrinadores e alunos que ser�o banidos do Centro de Filosofia e Ci�ncias Humanas". Cada professor ou estudante era identificado com insultos espec�ficos, como "comunista antidemocr�tico", "socialista que faz apologia do uso de drogas", "viado" e "feminazi".
Na mesma institui��o, o professor de Filosofia Rodrigo Jungmann, de 52 anos, teve cartazes no estilo "procura-se" pendurado pelo c�mpus. "Eles me chamam de fascista e t�m a fantasia de que eu quero ser reitor e privatizar a universidade", disse. "Declarei meu voto ao Bolsonaro, mas nunca fiz campanha nas minhas aulas". Jungmann chegou a ser impedido de sair da cantina e dar aulas porque alunos o cercaram com ofensas e amea�as de agress�o.
A guarda universit�ria teve de escolt�-lo at� em casa. A institui��o divulgou nota repudiando o comportamento de ambos os lados e disse que vai comunicar os fatos ao Minist�rios P�blico e � Pol�cia Federal.
"Est� muito dif�cil dar aulas, h� press�o para que a gente n�o fale as coisas que pensa e passamos a ter medo dos alunos", afirma um professor da Belas Artes, centro universit�rio particular com cursos de comunica��o, artes e arquitetura. Ele n�o quer ter o nome divulgado por medo de repres�lia. Segundo docentes, a reitoria da institui��o declarou apoio ao projeto Escola sem Partido e pediu que n�o sejam feitos coment�rios sobre pol�tica.
Em texto no site da institui��o, o reitor e propriet�rio da Belas Artes, Paulo Cardim, diz que "� p�blico e not�rio" e "com crescimento consider�vel durante o governo petista", que professores "usam a sala de aula como palanque para as suas prega��es ideol�gicas". O pr�-reitor acad�mico Sydnei Leite diz que a posi��o do reitor � pessoal e n�o reflete o que ocorre na faculdade. "Muito pelo contr�rio, a recomenda��o � puxar a corda, levar os autores, os pensadores, queremos que os alunos tenham d�vidas."
O pol�mico projeto Escola sem Partido est� em discuss�o em uma comiss�o especial da C�mara e sua vota��o vem sendo adiada. Em resumo, ele pro�be que atividades usem os termos g�nero ou orienta��o sexual e que professores digam suas opini�es, prefer�ncias ideol�gicas, religiosas, morais e pol�ticas. O texto afirma ainda que "o poder p�blico n�o se imiscuir� (intrometer�) no processo de amadurecimento sexual dos alunos". Se virar lei, as salas de aula do ensino b�sico ao superior ter�o cartazes com os deveres do docente.
"Me preocupa dizer que universidade n�o � lugar de discutir pol�tica, se n�o vamos discutir onde?", diz o diretor do Direito da USP. Para ele, � muito dif�cil definir o que seria um conte�do aceit�vel, segundo a lei. "A ideia do conhecimento neutro j� foi demonstrada como falsa. O melhor ant�doto para o conhecimento direcionado � a pluralidade."
O reitor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Marcelo Knobel, tamb�m se diz "completamente contr�rio" ao projeto. "N�o � poss�vel consolidar as bases de um ambiente acad�mico eficiente sem a garantia do livre debate de ideias, que garantem a todos o direito de assumir e externar livremente suas convic��es."
Redes sociais
Em uma universidade federal do Sudeste, professores que pediram para n�o serem identificados contam que os conflitos se intensificaram nas redes sociais. Estudantes fotografam a lousa em aulas das quais discordam do conte�do e divulgam em grupos de Whats App, com acusa��es. Deixam tamb�m mensagens no Facebook de professores avisando que far�o den�ncias caso a "doutrina��o" e a "idolatria a anticrist�os" continuem. "Nosso temor � que alunos se sintam bem mais � vontade para expressar opini�es preconceituosas", diz uma docente.
"Meu medo � que n�o fique s� na amea�a", diz a professora de Biologia do Norte do Pa�s cujo aluno afirmou que lhe daria um tiro. Dias antes, houve um debate na turma sobre biodiversidade na Amaz�nia e a docente chamou a aten��o para os planos de governo dos candidatos sobre o assunto. "Mas ele n�o se manifestou nesse dia. Depois, quando recebeu a prova, me amea�ou e falou de Bolsonaro."
"Algumas manifesta��es (como listas e persegui��es) correspondem um pouco ao que se fazia antes", diz o soci�logo e professor da USP Brasilio Sallum, referindo-se ao per�odo da Ditadura Militar. Sallum era aluno da institui��o quando colegas foram presos e 24 professores foram compulsoriamente aposentados, em 1969. A decis�o partiu do comando militar ap�s o Ato Institucional N� 5, que suspendeu garantias constitucionais e foi assinado por um ex-professor da USP, o ent�o ministro da Justi�a, Luiz Ant�nio da Gama e Silva.
Entre os colegas cassados, estavam o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o arquiteto Paulo Mendes da Rocha, o soci�logo Florestan Fernandes e o pr�prio ent�o reitor da USP Helio Louren�o, que havia reclamado da medida. "H� temores, um clima de suspeita de que coisas arbitrarias vir�o, mas acho dif�cil. As estruturas est�o muito consolidadas na universidade." As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.
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